Número total de visualizações de páginas

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Estradas de Portugal, SA - dito por não dito e mosca tsé-tsé

O ministro das Obras Públicas fez ontem esta declaração muito interessante: que agora, com a Estradas de Portugal, SA (EP, SA) transformada em sociedade anónima, já seria possível fazer obras em estradas – construção de novas ou reparação das actuais – sem que isso tenha implicações no défice orçamental.
Hoje mesmo, um Secretário de Estado da mesma pasta, acrescentou que acaba de se verificar uma alteração fundamental na EP, SA: até agora vivia à custa de subsídios do Estado, agora passa a viver vive com receitas próprias...e até se mostra capaz de equilibrar as contas em 2007.
Confesso que já não é possível entender nada disto.
Então o Governo não fez questão de jurar a pés juntos há duas ou três semanas apenas, que com a criação da EP, SA não haveria quaisquer alterações em sede do saldo orçamental, que a EP,SA “consolidaria” com as contas da execução orçamental?
Como é possível que, 15 dias após a emissão de tão solene compromisso, o Ministro venha já afirmar exactamente o oposto?
É claro que pela parte que me respeita, esta declaração do Ministro só vem confirmar o que aqui disse e repeti na altura própria - que a instituição da EP, SA tinha como objectivo criar um veículo de desorçamentação para permitir, como principal desígnio, baixar os impostos em 2009...
Assim esta declaração de ontem nada me espanta em si mesma...o que é extraordinário é a facilidade com que responsáveis governamentais dão o dito por não dito em tão curto espaço de tempo, sem qualquer reacção visível da oposição, às voltas com a mosca tsé-tsé...
Será assim já tão grande a confiança dos governantes na persistência da tripanossomíase que se instalou em S. Bento nos últimos dois anos e meio?
Ainda mais extraordinária a declaração do Secretário de Estado, quando se sabe que a principal alteração, em matéria de receitas da EP, SA consiste na afectação de uma parte da receita fiscal do ISP, estimada em € 600 milhões/ano, que agora passa a constituir receita das EP, SA, com a designação pomposa de “contribuição de serviço rodoviário”.
Quer dizer que agora a EP, SA já vive de receitas e não é subsidiada, sabendo-se que é o Estado que a financia, abdicando de uma parte da receita fiscal?
Será que o Secretário de Estado tem noção da pura fantasia que a sua declaração traduz?
E será que a mosca tsé-tsé que atacou S. Bento vai permitir que se continue a produzir qualquer afirmação, por mais inverosímil que seja, sem qualquer reacção visível da oposição?

10 comentários:

Tonibler disse...

Um veículo de desorçamentação e não só. A partir de agora já se pode betumar o país inteiro inteiramente com "investimento privado", havendo apenas uns pequenos detalhes contratuais de garantia de proveitos...
Tempos houve em que se vendiam empresas públicas directamente aos amigos. Hoje, dão-se!

E, na prática, é a solução ideal. As contas dos estado ficam por resolver lá para 2050 quando já não fôr possível andar a rolar obrigações do tesouro, os amigos ficam felizes porque ganham uma renda para 20 anos, o PIB sobe, a despesa desaparece por debaixo do tapete, e tudo com a vantagem acrescida de não ser preciso trabalhar, estudar, desenvolver, conhecer ou investigar....É a Nova Economia Portuguesa, mais adequada à nossa cultura!

Tavares Moreira disse...

Nova Economia Portuguesa SGPS, SA - não se esqueça, Tonibler, neste caso com a sua participada EP, SA.

Suzana Toscano disse...

A mosca tsé-tsé existe em zonas pantanosas e provoca uma doença que é muito difícil de identificar a não ser em estado já quase irreversível. DIz a NET que tem sido uma doença negligenciada...

Fliscorno disse...

Oposição? Indo na moda, deixo aqui uma citação de Eça de Queirós, de 1867:

«Em Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição. Falta igualmente a aptidão, e o engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois factos que constituem o movimento político das nações.»

Pinho Cardão disse...

Caro Tavares Moreira:
O que se passa é que os “nossos” ministros atingiram um descaramento e um grau de inimputabilidade que a todos nos deviam envergonhar.
O MOP diz que já é possível fazer obras em estradas – construção de novas ou reparação das actuais – sem que isso tenha implicações no défice orçamental!...
Pois é!...durante um ano ou dois ou três, até que a EP tenha atingido o seu limite de endividamento. A partir daí, ou não há mais estradas ou o governo vai pagar em subsídios, e aí conta para o défice, só que já é outro governo!...
O Secretário de Estado acrescenta que a EP até agora vivia à custa de subsídios do Estado, agora passa a viver vive com receitas próprias...
Merecia um impropério bem à antiga portuguesa. Direi apenas que é uma afirmação insolente, porque confunde deliberadamente receitas próprias, que são apenas as que derivam da actividade da empresa, com as receitas de 600 milhões de euros de impostos que nós pagamos e são consignadas ao bolso da EP.
Mas como, tapando de um lado, se destapa do outro, o certo é que somos nós que vamos pagar outra vez, em reforçadas taxas ou impostos, os tais 600 milhões que que foram desviados para a EP e de que o estado também não pode prescindir.
Uma vergonha pública estas declarações enganosas e mistificadoras!...

Carlos Sério disse...

"OPOSIÇÃO, DE MANHÃ, À TARDE E À NOITE"

Tavares Moreira disse...

Cara Suzana,

Pena que sejam já poucos- e provavelmente muito alquebrados - os médicos portugueses que, com grande sucesso é justo assinalar, participaram na erradicação da tripanossomiase nos idos anos 50 e 60 em algumas das ex-colónias.
Quanto trabalho eles teriam pela frente, se ainda estivessem activos, nos pântanos de S. Bento e zonas circundantes.
São tantos os doentes e a doença está tão consolidada...

Caro Pinho Cardão,

A falta de vergonha nas declarações dos governantes é simétrica da falta de energia da oposição...a falta de combatividade da oposição encoraja estes comportamentos irresponsáveis, meu Caro.
Eu compreendo que a oposição tem que dispender grande parte das suas energias a combater-se a si própria...mas não poderiam poupar algum esforço para cumprir a primacial tarefa que por definição lhes compete...Será pedir muito?

Pinho Cardão disse...

Não; de facto o que se exigiria era o mínimo vital.
Em coisas vitais, claro!...

Luís Guerreiro disse...

No dar o dito por não dito, já este governo se mostrou expedito. Mas mais triste é ver que, apesar disso mesmo, esta oposição não consegue de maneira alguma aproveitar os erros para fazer a sua parte.

Volto a dizer: é pior os estado da oposição do que o estado da nação. E, tendo em conta a condição da segunda temo muito o caminho que tomamos.

Infelizmente este governo socialista (mas pouco) continua a fazer e desfazer, dizer e desdizer, receber e visitar, como quer e a seu bel-prazer. Seja na Estradas de Portugal, seja no aeroporto de Lisboa (ou seja lá onde ele for).

Tavares Moreira disse...

Caro Luís Guerreiro,

Tem alguma sugestão para a cura da tripanossomiase que afecta, tão gravemente, as pantanosas bancadas de S. Bento?