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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Diego

Na passada semana uma menina espanhola de três anos morreu devido a uma queda ocorrida dias antes num parque. Na altura foi vista pelos médicos que não detetaram razões para suspeitar tão trágico desfecho. Acontece, infelizmente. Dois dias depois, quando o namorado da mãe lhe dava banho, a menina desmaiou. Diego levou-a de imediato às urgências. Foi reanimada várias vezes. O médico interpretou as lesões da pele como sendo queimaduras e “encontrou” lesões nas partes íntimas, tendo ativado de imediato o protocolo de agressão sexual que levou à detenção do namorado da mãe. A partir daqui gerou-se uma sucessão ininterrupta de acontecimentos, envolvendo médicos, juízes, polícias, comunicação social, altas individualidades sociais, cívicas e políticas que não fizeram outra coisa do que atacar o “monstro” que matou a miúda. A comunicação social empenhou-se como é costume nestes casos dando prioridade a mais um caso de violência infantil sem rodeios. Será escusado comentar o que terá pensado a população face ao “criminoso”.
Afinal, Diego está inocente. Os exames médico-legais concluíram que a criança não foi vítima de qualquer tipo de agressão nem tão pouco foi violada e que as tais lesões cutâneas eram meras manifestações de alergia a um creme.
Face à revelação do relatório médico-legal, as entidades que malharam forte e feio em Diego não foram capazes de quaisquer pedidos de desculpa pública ou de retratação. Vieram justificar as suas afirmações de uma forma que considero fria e pouco séria. Os responsáveis da comunicação social são os únicos, até ao momento, a reconhecerem, de forma humilde, o erro, mas, na tentativa de se desculparem, reportam que sempre se tem pautado pelo rigoroso cumprimento das normas, “rebeubéu, pardais ao ninho”.
Este caso é mais do que paradigmático da violação da presunção de inocência. Um ser humano é brutal e impiedosamente condenado na praça pública. Sofre violentamente. Estou convicto que jamais conseguirá recuperar completamente do sofrimento.
Dizem os entendidos que há matéria mais do que suficiente para condenar médicos, jornalistas e quejandos. Mas haverá algum dinheiro que possa compensar uma acusação desta natureza? Não haverá pressa a mais nestes tipos de juízos? Não será preciso mais cuidado por parte de quem transmite as notícias? Claro que poderão invocar que as deram baseadas nas informações prestadas. Mas é suficiente? E quando acontece uma coisa destas, não deveriam pedir publicamente perdão pelo mal que cometeram e que ajudaram a propagar? Não basta apurar as responsabilidades penais dos agentes envolvidos, o que está em causa é muito mais do que isso. É uma questão de dignidade que ao ser violentada nunca mais será totalmente recuperada e que é muito pior do que a própria morte.
Não podemos esquecer que qualquer um pode ser vítima de falsas acusações. Quanto à dita presunção de inocência, tão propalada em inúmeras circunstâncias, não será uma mera figura de retórica atrás da qual se “esconde” abertamente a condenação?
Diego merece que todos os agentes envolvidos, juízes, polícias, médicos, comunicação social, presidentes de várias associações e até a vice-presidente das Canárias peçam publicamente perdão por terem contribuído para a sua condenação. Será que só nos casos em que há muitas vítimas é que se pede perdão publicamente, como temos vindo a testemunhar ultimamente?

5 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro Professor, a presunção de inocência já nem figura de retórica é. Foi declarada nula e substituida pelo seu contrário, a presunção de culpabilidade com base na qual se condena de preceito e sem possibilidade de defesa.
Mais: não se lhe conhece advogado de defesa.

Tonibler disse...

Caro JMFA,

Isto não tem nada a ver com a presunção da inocência. O meu caro sabe que falar em presunção da inocência a 99% das pessoas é a mesma coisa que falar em fusão nuclear fria. A defesa da presunção da inocência deve ter responsáveis e os responsáveis são aqueles a quem o meu caro paga para a defender. Isto tem a ver com responsabilidade. Há dois polícias envolvidos, dois juízes, três advogados, prendem-se todos até saber de onde veio a fuga de informação. Estes têm a obrigação de defender a presunção da inocência, todos eles. Se esta não é defendida, e eram eles que sabiam, então a culpa é indubitavelmente deles. Os jornalistas são pagos para dar notícias, os médicos para reportar as vítimas. Agora os agentes da justiça, esses é que já deveriam estar a responder pelos danos.

Catarina disse...

Não conhecia a estória do Diego.
Mas já tenho lido sobre outros casos semelhantes.
Estou errada, assumindo que não é rico nem famoso?
O pedido de desculpas é muito selectivo. O ser considerado inocente antes de se provar o contrário não vende jornais nem revistas. E compensação por difamação? Provavelmente, não vai acontecer porque Diego não terá os meios financeiros para que isso aconteça. E quer receba ou não qualquer indemnização (que não acredito se concretize), enquanto viver nunca mais esquecerá....O laço de relacionamento - “padrasto” - ou “namorado” da mãe - tem ainda, algumas vezes e em certas mentes, uma conotação negativa...

Entretanto... e num caso muito diferente... (e isto a propósito de “pedir desculpas”... temos o “golden boy” do golf a pedir desculpas a toda a gente pelo seu comportamento moralmente inaceitável e que pode significar a perda de milhões e milhões de dólares em patrocínios! Aqui.... tal como no caso do Diego... temos a comunicação social a fazer “pipas de dinheiro” – usando um termo de um dos comentadores, ao qual achei muito engraçado. Espero não ser processada pela violação de direitos de autor.

Anónimo disse...

Peço desculpa, Tonibler, mas desta vez não percebi nada do que escreveu. O problema não estará certamente no que diz mas na minha limitada capacidade de entendimento.

Suzana Toscano disse...

Sem querer interpretar pelo caro Tonibler, o que me parece é que a precipitação estará, neste caso, na acusação em si, fruto de uma espécie de loucurta colectiva que agora tem temas da moda que, pelos vistos, tiram a lucidez a quem a devia ter especialmente apurada. Não li a notícia mas pelo post parece uma história kafkiana em que tudo começou por...não haver sequer crime!