O insucesso e o abandono escolar tornaram-se, invariavelmente, um tema recorrente. Um verdadeiro pesadelo para o Ministério da Educação e para o País. Os dados recentes publicados pelo Eurostat mostram que em Portugal a evolução do abandono escolar nos últimos dez anos (1996-2006) se manteve praticamente inalterada – de 40,1% para 40%. Em 1996 o abandono escolar em Portugal era de 1,9 vezes superior à média da EU 15 e em 2006 subiu para 2,3 vezes. Mas ainda mais grave é o aumento do abandono escolar verificado entre 2005 e 2006, que passou de 38,6% para 40%, enquanto a média europeia continuou a diminuir.
É muito importante, obviamente, investirmos na formação universitária. Parece que – segundo rezam as estatísticas – não é ainda suficiente o número de profissionais com formação superior. É, portanto, necessário reforçar este número e é isso que temos andado a fazer, porém preocupados bem mais com a quantidade do que com a qualidade! É que, tal como as outras instituições de ensino, também a universidade está viciada e desacreditada, prevalecendo o objectivo da obtenção de um “canudo” que, diga-se em abono da verdade, com ou sem valor, não serve muitas vezes para nada.
Mas comecemos pelo início. Porque é que apenas 60% dos nossos jovens ultrapassam a barreira do 9º ano de escolaridade (obrigatória)? Têm sido apontadas várias causas, mas destacaria uma que me parece ter raízes mais profundas. Criou-se um complexo, post 25 de Abril, que afirma que somos todos iguais. Esta concepção igualitária veio perturbar profundamente as mentalidades. Esta igualdade tão apregoada deveria ter apenas e tão só que ver com as oportunidades de acesso que devem ser asseguradas a todos, independentemente da sua condição económica e social, já que ainda não está comprovado que todos tenhamos as mesmas aptidões, apetências e capacidades intelectuais.
Foi à luz deste princípio que se estabeleceu a primeira etapa que constitui o ensino obrigatório, “igual para todos”, sem liberdade de opções, o que nos dias de hoje e no nosso contexto actual, sociólogo e cultural, não faz qualquer sentido e é uma verdadeira aberração. Os alunos não querem e viram costas à escola. E porquê? Porque não gostam da escola. Não creio que a culpa seja dos professores, mas antes dos programas e porque o tipo de ensino que é ministrado não só não lhes diz rigorosamente nada como não lhes serve rigorosamente para nada. E é assim que, obrigados pelo sistema, uma grande parte dos alunos do insucesso e do abandono escolar, optam por não estudar, almejando livrarem-se do 9º ano de escolaridade, cuja única virtude será fazê-los esquecer e odiar a escola para sempre.
A segunda etapa do ensino, já mais selectiva, visa o 12º ano de escolaridade, repetindo-se aqui os mesmos erros, já que muitos dos alunos que o frequentam não o fariam caso pudessem escolher “outra coisa”. E a injustiça é tanto mais flagrante, quanto estigmatiza aqueles que não podem ou não querem o tipo de ensino “imposto” e impede outros de progredirem normalmente no seu estudo, já que as aulas são colectivas. Culpam-se, por fim, os professores que se limitam, afinal, a maior parte das vezes, a cumprir as políticas do Ministério da Educação.
Devemos proporcionar a todos os jovens, de forma arrojada, sem medos nem complexos, o conhecimento de que necessitam para crescerem e se realizarem, através de um ensino diversificado e de qualidade que os alunos poderão frequentar a partir do 5º ano de escolaridade. É neste nível que – antes de atingirem o 9º ano de escolaridade – os alunos devem ser ajudados e orientados no sentido de lhes ser fornecido um projecto escolar e profissional, de acordo com as suas aptidões, apetências e capacidades intelectuais. É nesta fase que é útil explorar entre dois caminhos distintos: a via universitária e a via técnico-profissional. Esta é uma prática do sistema educativo de alguns países europeus, que por sinal apresentam taxas baixas de insucesso escolar.
Os alunos não ficarão traumatizados, antes pelo contrário, ficarão felizes e realizados e muito gratos – e o País também – por lhes ser dada a possibilidade de uma escolha efectiva e séria de oportunidades. É aqui que a igualdade de oportunidades encontra a sua melhor forma de concretização. A ideia que se instalou de que só há igualdade num País de “doutores” deu um péssimo resultado! Um erro que origina as piores das desigualdades!
4 comentários:
Chegou a vez de discordar quase completamente!
Primeiro porque a sociedade do curso profissional já não existe. A profissão é hoje um conceito com um horizonte temporal reduzido que só se aplica a umas quantas actividades protegidas, como advogado ou médico. O que existe hoje são ocupações que vão mudando todos os dias conforme parte das competências vão sendo substituídas por maquinaria ou vão perdendo valor porque...deixam de ter valor. E a isto, não há volta a dar-lhe.
Os programas são realmente muito maus porque são os mesmos de há décadas, ensinados por pessoas que os decoraram há décadas e feitos para que a pessoa sobreviva quando largar o liceu no 5º ano. Só que o liceu já não existe, o 5º ano é outro e esse conhecimento já não é nada. Os programas sâo lixo. E a alternativa a um programa mau é um programa bom, feito para dar conhecimento e não na esperança que o trolha leve umas noções de trigonometria.
A experiência que este país fez, devido a uma carrada de ideias feitas de ensino profissionalizante, com os institutos politécnicos só pode ter uma classificação - péssima. Foram uma perda de tempo e dinheiro lançado à rua. Uma insistência na "via técnico-profissional" seria...a mesma coisa.
Eu nunca percebi onde é que, na história, se decidiu que o objectivo do sistema de ensino não era dar o máximo de conhecimento a cada um, ao máximo de pessoas. Mas é importante que volte a ser. Concordo que as pessoas não são todas iguais não têm a mesma capacidade, mas se o objectivo fôr dar o máximo de conhecimento a cada um, certamente que a solução não passa por fazer trolhas daqueles que não seguem a linha "média" ou não estão dentro dos "3 desvios-padrão".
Agora, alguém pegou nalguns desses milhares de arménios, moldavos, ucranianos, russos e lhes perguntou que sugestões têm para resolver este nosso (e, agora, deles) problema?
Caro Tonibler
Concordo plenamente que discorde quase completamente. O que eu não entendi é porque é que discorda e com o que é que concorda.
Concorda que os jovens frequentem o ensino para serem "doutores", ou pior ainda, para chegarem à porta da universidade?
Discorda que há mais vida para além de uma formação universitária?
Discorda que há outras competências e actividades profissionais igualmente importantes que não passam pela licenciatura universitária?
Quando refere que "O que existe hoje são ocupações que vão mudando todos os dias conforme parte das competências vão sendo substituídas por maquinaria ou vão perdendo valor porque...deixam de ter valor" tem muita razão. Mas é uma realidade que se aplica de um modo geral a todas as actividades profissionais, em especial aquelas que exigem mais qualificações e não explica nem é a meu ver razão para que não sejam disponibilizadas aos nossos jovens outras vias profissionais que não passam pela formação universitária.
É justamente aqui que está o ponto. É aqui que entendo que deve ser introduzida uma mudança, no sentido de, respeitando as diferenças de apetências e capacidades de cada um, garantir a acessibilidade a vias de ensino e caminhos profissionais distintos.
Evidentemente que, independentemente dos caminhos, os programas curriculares devem ser de qualidade. Aqui estamos de acordo.
Cara Margarida
As considerações tecidas a propósito da dimensão atingida pela deserção de alunos, mesmo antes do final da escolaridade obrigatória, prende-se em parte e aí estou perfeitamente de acordo com o que afirma no seu texto,com a falta de horizonte profissional, melhor, com a profissionalização propriamente dita do aluno. Cada vez me apetece mais classificar de "escarros sociais", as relampejantes luminárias que a seguir ao 25 barra quatro, acabaram com o ensino técnico, cerceando catastroficamente a formação de profissionais,que pela sua aprendizagem académica, se viam preparados para exercerem funções pertinentes e extremamente importantes a nível,sobretudo, de quadros médios das empresas em geral.Quem foi professor do ensino técnico sabe bem a excelente formação com que saíam os alunos e a desejável rapidez com que achavam trabalho.Subjacente a toda essa formação, notava-se a sua articulação com o mercado de emprego, articulação esta que, verificamo-lo hoje, desempenhava o nó górdio de todo o sistema. O mesmo se constata a nível da formação profissional no contexto do então ministério das corporações, que com todos oa seus defeitos de actuação, neste aspecto funcionava bem e sistematicamente de acordo com as associações de trabalhadores e empresários, definindo carências e necessidade de mão-de-obra qualificada. Os "fornecimentos" de profissionais habilitados, os chamados recursos humanos, oriundos de qualquer destas duas instituições, cujos níveis de formação, prática e teórica, não eram iguais, fosse qual fosse o sector económico de destino, em termos da sua futura integração, eram respeitados e sempre benvindos. Havia um entendimento saudável entre os diferentes interessados. Impressionou-me um dia destes, ouvir o bastonário da ordem dos engenheiros, vir dizer que para que o desenvolvimento económico do país prossiga, naturalmente, teremos que importar engenheiros do exterior, tendo em vista a carência destes profissionais nas suas diferentes especialidades. E o engenheiro técnico, onde é que o inserimos na escala vertical de atribuições empresariais, no domínio das engenharias? Deixo o desafio. Quem me parece habilitado para perorar sobre esta matéria, é o sr. primeiro ministro que por alguma razão pretendeu subir. Entretanto, porque se convenceu o "zé pagode" que todos temos o direito de ser doutores, a legião de desempregados licenciados e bachareis, aumenta sem parança. Primeiro, porque uma grande parte deles devia provavelmente ter parado antes, desde que lhe oferecessem condições de profissionalização interessantes, segundo, porque se continua sem informar convenientemente, acerca dos cursos com boas hipóteses de viabilização de emprego, propiciando-se assim o obscurantismo, relativamente a cursos que não proporcionam na perspectiva da vida activa, a ambicionada colocação profissional.
A autêntica igualdade é aquela que se confina ao estabelecimento para todos das mesmas oportunidades e esta sim, há que defendê-la, sendo certo que incontroversamente,a outra igualdade, a política na acepção da revolução francesa, é sempre mais igual para uns do que para outros ; o contrário era o paraíso.
Caro antoniodasiscas
Levanta na sua reflexão uma questão igualmente importante, da articulação entre a formação e a empregabilidade. E a empregabilidade deve ser articulada não apenas com a formação universitária, mas também com a formação técnico-profissional. Na verdade assistimos hoje a uma desadequação entre a procura e a oferta. Simultaneamente há excesso de licenciados em determinadas áreas profissionais e défice de licenciados noutras. Há, com efeito, graves desequilíbrios que o mercado só por si não consegue resolver, uma vez que o Estado tem um papel interventivo nos resultados do ensino universitário. Ao nível do ensino técnico é, também, patente a falta de quadros médios em determinados sectores de actividade económica.
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