Número total de visualizações de páginas

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Estado, sempre o Estado

Acontecimento muito noticiado este fim-de-semana foi a “Festa do Avante”.
Nesse evento, agora mais social que político, a intervenção final do Sec. Geral do PCP foi – dificilmente se poderia esperar outra coisa – marcada por críticas duras à política do Governo e à pretensa cumplicidade do Presidente da República.
Respiguei dessa intervenção a passagem em que J. Sousa afirma “É tempo de avançar com medidas para travar o desemprego e o endividamento das famílias...”.
Esta passagem é paradigmática da resistência do mito do Estado nas mentes do pessoal da esquerda tradicional e conservadora como é a maioria do “rank and file” do PCP.
Para estas simpáticas criaturas (quando não estão no poder...), o Estado ainda tem poderes mágicos para resolver as crises: só assim se explica este apelo às medidas para travar o desemprego e o endividamento das famílias.
Note-se por exemplo no caso do endividamento, que não há uma palavra pedagógica para o comportamento das próprias famílias, no sentido de prestarem a maior atenção ao endividamento, de não consumirem para além daquilo que os seus rendimentos consentem, etc.
Não, é o Estado que tem de descobrir a varinha mágica para reduzir o esforço financeiro das famílias – como? Baixando as taxas de juro (sugestão curiosamente avançada por J. Sousa) – mas o Estado português tem hoje algum poder sobre o nível das taxas de juro?
Diga-se de passagem que o Governo, ao meter-se no trabalho de administrar os arredondamentos das taxas nos créditos a particulares pretendeu e acabou por transmitir a ideia de que o Estado podia controlar excessos das taxas de juro.
O que, na minha perspectiva na altura aqui bem assinalada, constituiu um erro crasso.
Esse erro está agora à vista, perante a total impotência para controlar a escalada dos custos do crédito...já ninguém repara nos arredondamentos, que se tornam irrelevantes neste contexto.
E como travar o desemprego?
No subconsciente destas mesmas pessoas, a resposta é óbvia: criando empregos, mais professores, mais enfermeiros, mais trabalhadores nas empresas públicas (e porque não mais empresas públicas?), mais médicos, mais polícias nas ruas, mais funcionários nos tribunais, etc,etc.
Todos sabemos o que estamos a pagar pelos excessos de despesa pública e nem sabemos o que mais nos espera.
Mas isso não interessa nesta abordagem mítica ou mesmo mística: no Estado, na Constituição da República e suas promessas e garantias é forçoso que se encontre resposta para todos os nossos problemas...
Algum dia se perceberá que a crença neste mito nos traz muito mais problemas que soluções?
É possível, “but not in my lifetime”...

12 comentários:

Tonibler disse...

Caro Tavares Moreira,

Tirando as asneiras do PCP, que já ultrapassaram de tal forma o absurdo que já nem demagógicas são,
como é que a questão dos arredondamentos transmitiu a ideia que o Estado poderia controlar as taxas?
Recordo que as práticas, não escritas, do mercado financeiro em todo mundo definem bem que há vários graus de intervenção no mercado, começando nos bancos e acabando nos particulares. A um particular não se estabelecem cláusulas que, sendo transparentes para outros intervenientes do mercado, não são para os particulares. Deveriam ter sido os bancos, de acordo com estas práticas de comportamento ético que têm décadas, os primeiros a separar os intervenientes no mercado pelo seu conhecimento e não necessitarem da acção administrativa. Infelizmente, os bancos portugueses necessitaram que essa intervenção fosse feita. Não me parece que isto transmita o que quer que seja sobre o Estado. Sobre a qualidade dos bancos, sim. Sobre o estado, não.
Quanto a ideia que as pessoas têm do poder económico do estado, acho que estão a aprender muito rapidamente....

CCz disse...

Caro Tavares Moreira,

A doença está muito mais disseminada do que parece, trata-se de um verdadeiro cancro. Aqui ao lado os nossos vizinhos estão na mesma onda:

http://wonkapistas.blogspot.com/2007/08/el-estatismo-de-los-espaoles.html

CCz disse...

"En términos generales, ¿considera Ud. que debería, o no debería ser responsabilidad del Gobierno...?

Crear un puesto de trabajo para todo aquel que lo demanda?

41.7% responde:"Sí, sin ninguna duda"

38.3% responde "Probablemente debería"

Daí todo o sentido para as palavras de Angel Angel Belloso no Diário Económico de hoje:

"Em Espanha sucede algo semelhante, porque Solbes limitou-se a gerir discretamente a herança económica recebida de Aznar e Rato, e porque todas as medidas – passadas e presentes –, de Zapatero implicam uma despesa cada vez maior – justamente o contrário do oportuno tendo em conta a situação que se vive. "

Rui Fonseca disse...

Cato Tavares Moreira,

Pois é uma pena que o vosso almoço não se realize por falta de quorum. Só pelo prazer de voltar a ver os meus amigos Tavares Moreira e Pinho Cardão alinharia com todo o gosto na bancada dos suplentes.

Quanto ao seu "post" de hoje nada a acrescentar: A Festa do Avante é
assim, mal comparado, com um arraial popular com algums devotos beatos e muitos bebedores de copos.

De referir, contudo, que se o PCP propõe o subsídio para os juros o CDS propõe o aumento das deduções fiscais com o mesmo objectivo. Há diferença?

Tavares Moreira disse...

Tonibler,

Já sabemos que o meu Amigo tem um encanto especial pelos arredondamentos das taxas que o Governo resolveu administrar.
Estamos em desacordo, mas daí não decorre qualquer problema - a não ser para os que acreditaram que os arredondamentos iriam aliviar as suas trestações mensais, não percebendo que o custo do arredondamento é uma % irrisória do preço total que pagam.
Assegurou-se o irrisório, o mais importante continuou na dependência do credor mas paciência.

CCz,
Magnífica observação.

Rui Fonseca,

Bem vindo, tb eu tive pena que o almoço de amanhã acabasse por não ter quorum...fiz o meu melhor, não quiseram responder ao meu apelo.
Quanto ao CDS, tem razão a proposta não se distingue no essencial da do PCP.
O que não surpreende, para herdeiros legítimos do corporativismo e do Estado-providência, apesar de mais humanista e personalista.

Pinho Cardão disse...

Caro Rui Fonseca:
Há mais marés que marinheiros...e haverá mais decisões sobre as taxas de juro!...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Dr. Tavares Moreira
É a cassete do PCP a funcionar. Gasta e riscada lá vai "tocando": abaixo o "capitalismo privado", acima o "capitalismo do Estado", abaixo as privatizações, acima as nacionalizações,...
Prefiro um PCP igual a ele próprio; assim não há novidades!

André Tavares Moreira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
André Tavares Moreira disse...

O comunismo é um falhanço na verdadiera acepção da palavra. As coisas boas que trouxe não são minimamente comparáveis às desgraças que desse sistema jucoso advém.
De Cuba ao Vietname, todos os paises comunistas estão em miserável situação. Os unicos países que vêm luz ao fundo do túnel são os que a pouco e pouco se afastam desta doutrina bolorenta. Doutrina essa que como o bolor, estraga onde toca.
No entanto algo me inquienta seriamente. Como é que professores de história apoiam o partido comunista??? Algo que procuro resposta desde o meu 9º ano.

Mais funcionarios do estado implica mais impostos e assim sucessivamente. Qual seria a solução para os comunistas? Pedir um empréstimo à Rússia e rumar ao socialismo perfeito?

Termino como uma frase do fantastico escritor Milan Kundera
"Os Soviéticos acreditavam que o capitalismo empobrecia o operariado. Quando viram que na Europa os operarios iam de carro para o trabalho apetecera-lhes gritar que a realidade fizera batota.".

Sudações Republicanas

O MARQUÊS DA PRAIA E MONFORTE disse...

1º O mais importante de tudo – O Almoço – haverá outras oportunidades. Registo com apreço a clemência anunciada para os derrotados, de tal modo que já contava reconhece-la na hora dos digestivos.

2º O post e apreço – Avante e o resto – Tendo em conta a cordialidade de trato que tenho recebido aqui no 4ª República, a qual se acresce o prazer que retiro ao ler, por norma, opiniões, ainda que quase sempre divergentes das minhas, inteligentemente fundamentadas. Sinto-me obrigado a fazer a despesa do seguinte comentário: Independentemente da apreciação política que se possa fazer sobre o ideário do PCP, das suas propostas políticas e da sua prática, existe algo difícil de desvalorizar, que é a Festa do Avante. Pelas suas características, políticas, de mobilização e de regularidade, é um dos mais significativos eventos políticos nacionais. Pode dizer-se que serve para difundir uma ideologia caduca e ultrapassada, é uma apreciação política, mas não se pode dizer que não seja uma realização assinalável, sobretudo se se acrescentar que é erguida por um Partido político, que já influiu mais do actualmente e a quem se vaticina recorrente a extinção. È um esforço militante extraordinário, que qualquer um de nós que tenha envolvimento numa organização política, sabe exactamente o que isso representa. Actualmente a maioria do Partidos não consegue mobilizar nem para que lhe colem um cartaz. Além da sua dimensão política, tem uma dimensão cultural também assinalável. Não é um arraial popular, como lhe chama o Rui Fonseca, bem estaríamos nós se os arraiais populares apresentassem os Chicago Blues Harp All Stars ou a a Cantata para os 20 anos da Revolução de Outubro de Serguei Prokofief, pela Sinfonietta de Lisboa,dirigida pelo maestro Vasco Pierce de Azevedo,e com o Coro Sinfónico Lisboa Cantat, aberta com a «Abertura-fantasia "Romeu e Julieta", op.49» de Tchaikovski e encerrada com a «Dança Matinal "Romeu e Julieta"» de S. Prokofief.

O resto, ou seja, o discurso de Jerónimo de Sousa foi igual ao de sempre, uma cassete, seja uma cassete como diz Margarida Corrêa de Aguiar, mas no espectro político português, só o CDS altera o discurso de 2 em 2 anos. Os restantes Partidos também conservam gravações bastantes vetustas. Claro que no caso do PCP a música é impossível de ser dançada neste palco, tem razão o Tavares Moreira, quando pergunta como conter o desemprego ou alterar as taxas de juro, não depende do Estado fixar com passe de mágica. É verdade, e essa o cerne da crítica política do PCP ao sistema. Denunciar, pela exigência de medidas necessárias, a cada vez maior impossibilidade dos sistemas democráticos em influir num sector fundamental da vida social que é a economia. Mas essa é a visão ideológica do PCP, as propostas só seriam demagógicas se feitas por alguém que não defendesse a alteração das regras, como por exemplo o CDS, cujo o líder, mais dia menos dia, voltará à samarra, às feiras e à lavoura .
O erro estratégico do PCP actualmente, mesmo tendo em conta o seu programa político, é no seu posicionamento face a algumas das medidas do Governo. Muitas são aquelas que deveriam merecer à esquerda do PS um esforço de influência política no sentido até de reforçar o seu caracter reformista.

Bruno Simão

O MARQUÊS DA PRAIA E MONFORTE disse...

Permita-me Tavares Moreira uma alfinetada ao André.

Caríssimo André,

Pela proximidade como fala do 9º ano, não deveremos ter grande diferença etária. Eu tive professores de várias orientação ideológicas e curiosamente reconheci em muitos, apesar dessas diferenças, inteligência, sensibilidade, valores democráticos e cívicos, informação e formação cultural. Beneficiei muito da diversidade de experiências e perspectivas que todos me deram. Se o mundo das ideias se enformasse com a simplicidade que propõe, era uma tristeza. Não defenda você, o monolitismo ideológico de que acusa os outros.

Bruno Simão

Tavares Moreira disse...

Caros Comentadores,

Vai este debate bem animado, com uma ala jovem - André All-garvio e Marquês da Praia e Monforte - a dar-lhe um toque de mocidade de que este blogue também precisa (bastante).

Caro André All-garvio,

Conviria retirar o Vietnam da lista, pois neste País funciona hoje uma economia capitalista no mais puro sentido da expressão.
A bolsa de valores de Hanoi, curiosamente denominada "Ho Chi Min" é actualmente das que apresenta maiores valorizações e o investiemnto em acções cotadas é imensamente popular no Vietnam.
Também é um espectacular destino turístico, actividade muito florescente.

Caro Marquês,

Quanto ao almoço, tb eu lamento que não possa realizar-se, creio que concorda comigo que sem um quorum decente teria pouca graça.
Quanto às observações do André, e retirando o lapso do Vietnam, não me parece que sejam exageradas.
Também partilho a opinião de que tudo o que se tem dito até hoje do comunismo como regime opressor da pessoa humana, destruidor dos direitos individuais, fomentador de perseguições e de injustiças inenarráveis - em troca de quê? -
tem sido pouco.