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segunda-feira, 21 de abril de 2008

Idosos carenciados vítimas da perversão do sistema...

Foi hoje notícia que “há lares de idosos sem fins lucrativos que arranjam vagas em troca de donativos”.
Estes lares de idosos fazem parte da rede de instituições de solidariedade social, incluindo as misericórdias, através da qual o Estado concretiza as suas políticas de acção social. Estamos perante instituições sem fins lucrativos que o Estado contratualiza, mediante um preço, com vista a assegurar o acolhimento e a prestação de serviços aos beneficiários que a elas recorrem.
É importante recordar que estas instituições sendo financiadas pelo Estado, ou melhor com os impostos cobrados aos contribuintes, devem cumprir com a legislação e as regras contratuais estabelecidas. A razão da sua existência é a satisfação de necessidades das pessoas carenciadas que a elas recorrem porque não auferem rendimentos que lhes permitam pagar serviços de assitência privados.
Não sei se são muitas as situações de instituições que exigem entregas adicionais – “direitos de entrada” – aos idosos carenciados e às suas famílias e não sei se a grande maioria ou uma minoria destas instituições utiliza ou não utiliza essas práticas. Agora o que sabemos é que é assumido pelas entidades da segurança social e por altos representantes das instituições de solidariedade social que a realidade existe. A segurança social queixa-se que tem dificuldade em actuar, sabendo que tal prática pode constituir crime de burla. As instituições de solidariedade social salientam que “muitas instituições estão a lutar pela sua sobrevivência” porque a comparticipação do Estado por idoso – fixada, segundo a notícia, em 330 € mensais – não chega para financiar metade do custo que em média um lar tem por cada pessoa internada.
Estamos assim perante situações ilegais, irregulares, imorais, em suma inadmissíveis, em que as instituições de solidariedade social fazem condicionar a atribuição de uma vaga em troca da entrega de uma entrada em dinheiro (segundo a mesma notícia o direito de entrada do caso apresentado ascendia a 15.000 €) ou até de uma herança futura como também consta.
O mais grave de tudo isto é que, no meio desta “selva”, são os idosos carenciados as vítimas destas práticas. São justamente estas pessoas que não tendo rendimentos necessitam do apoio do Estado e que não podendo fazer “donativos” porque os seus rendimentos não permitem ficam fora do sistema. Isto é, não têm acesso ao apoio do Estado.
É a total perversão do sistema, com o consentimento, pelos vistos, de uns e de outros. Uns por umas razões, outros por outras. No meio estão idosos indefesos e vulneráveis. Uma grande injustiça! Será que alguém está interessado em apurar responsabilidades? Em pôr cobro a este estado de coisas? Se as regras de financiamento e de funcionamento estão erradas, pois então que se alterem!

9 comentários:

Bernardo Kolbl disse...

Crianças e idosos, em Portugal, como os outros aliás...um pesadelo.
Muito triste.

PA disse...

Cara Dra. Margarida,

quando se abrir esta Caixa de Pandora, não vamos gostar de ver o que está lá dentro.

Não quero diabolizar o Estado, mas o Estado tem sido conivente com esta prática do:

- Entra na Instituição, quem puder pagar !
Quem não puder pagar, não entra ! Tout Court!

Na lista de espera, ganham prioridade, quem tiver dinheiro ou imóveis, para entregar à Instituição.

Mas o Estado tem sido conivente, como ?

Não tem fiscalizado, a aplicação das verbas com que apoia, estas organizações cuja missão é a acção e a solidariedade social.

Acredito plenamente que, por parte do Estado, porque o Estado são pessoas, que quem defere os apoios financeiros, para os lares (e outros) o faça com boa-fé. Opto por pensar assim.

Para mim, o 3º Sector não tem o controlo e a fiscalização que deveria ter.

E por isso, existem muitos idosos, muito carenciados, que continuam sózinhos em casa, sem família, sem qualquer apoio, à espera da VAGA, no Lar, que nunca virá.

Entretanto, morrerão.

Triste, muito triste, Cara Amiga.

Anónimo disse...

Bom, bom, era voltarmos às raízes, recuperarmos algumas das práticas ancestrais - se não se souber como basta ir a África ou aos países árabes e ver como se faz - e mantermos os idosos como parte integrante da família. Não é por envelhecer que se deixa de ser uma pessoa e se passa à categoria de "coisa" armazenavel num lar.

Os lares são meros paliativos mas muito longe de serem a solução do problema. A solução para o problema envolve um regresso atrás nas mentalidades e, também, cada um de nós lembrar-se que, também nós um dia chegaremos a velhos e se calhar não iremos querer ser depositados num lar, longe da nossa casa, das nossas coisinhas familiares, um total desenraizamento triste e incompreensivel quando já se viveu muito e não se tem cabeça para mudanças, um abandono que é pior do que as doenças e maleitas próprias da idade. Uma mudança cultural que poderia ser resumida no adágio "Não faças aos outros aquilo que não queres que te façam a ti".

No que toca a este caso dos lares supostamente gratuitos mas na practica usando de artes e manhas diversas para angariar dinheiro nem sei que dizer. É triste, é baixo, é lastimavel. É muito certo que o estado não fiscaliza e devia faze-lo. Mas como se pode sustentar um idoso com apenas 330 Euros por mês? Não sei, juro que não sei.

PA disse...

Caro Zuricher, pedindo desculpa à Cara Margarida por lhe responder, mas quero dizer-lhe o seguinte:

1 - Subscrevo o seu ponto de vista quanto à prática corrente (e por vezes desnecessária) de colocar nos lares, os idosos. Conheço vários casos, em que há casa grande, há rendimento, há tudo. Mas não há disponibilidade e vontade de acolher o familiar idoso. Fico muito incomodada. Seria incapaz de fazer isso aos meus pais.
No entanto, tb se verifica que há casos em que é muito complicado de resolver o problema, por diversos motivos. E a única solução é a institucionalização do idoso. Desde que o idoso concorde e se sinta bem no Lar onde reside. Enfim !

Sou muito defensora da prática do apoio domiciliário, quando o idoso ainda reune condições para estar na sua casa. Penso que é a solução ideal. E conheço pessoas que recebem esse apoio, e vivem muito bem, assim. Têm quem venha fazer o trabalho doméstico, a higiene corporal e que fornece tb as refeições. Fundamentalmente, é do que precisam, porque o resto é estarem bem dentro da casa, em que sempre viveram.
Quem gosta de ir para o centro de dia, para conviver, vai.

Qto. aos 330 euros, é bom que se lembre Caro Zuricher, que para além desse apoio estatal, a Entidade também recebe a pensão de reforma do idoso, quase no total.

os meus cumprimentos.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Bernardo Kolbl
Seja muito bem vindo. O seu desabafo já é um lugar comum, mas o que é certo é que continua a ser um "tabu" não falar nestas coisas.

Cara Pézinhos n' Areia
A sua sensibilidade para estas questões sociais é sempre muito bem vinda e enriquecedora para a reflexão.
O apoio domiciliário, sempre que o idoso pode permanecer em casa, é a situação ideal, porque evita o sofrimento imposto por uma mudança forçada, para o desconhecido, tendo que deixar para trás pessoas, coisas, espaços e hábitos que são muito queridos e que não são "transportáveis".
Mas não tem sido esta a via privilegiada pelas políticas sociais. O apoio domiciliário não é uma via preferencial de apoio e não está acessível a quem dele precisa, assim como não é suficiente a resposta em lares para acolhimento residente de idosos.
Há situações verdadeiramente trágicas!
E quanto ao modelo de financiamento e de funcionamento há muitas coisas para mudar, mas sempre sem abdicar da fiscalização que o Estado deve fazer. Estamos a falar de uma actividade que mexe com o que de mais íntimo a vida tem, com a qualidade de vida, com dinheiros públicos e com a concretização de políticas sociais fundamentais. É portanto inadmissível que o Estado assobie para o ar!

Caro Zuricher
Partilho do seu pensamento. A educação faz muita falta. Infelizmente, instalou-se a ideia nas gerações mais novas de que a juventude é eterna. O egoísmo não tem limites, a começar pelas pessoas que não são boas para com elas próprias!

antoniodasiscas disse...

Cara Margarida
Estou completamente siderado com o estado de podridão total em que este país está mergulhado. Que mais nos estará para acontecer, como dizia o vélho coronel brasileiro.
O mais revoltante de tudo isto é a passividade, senão a conivência de certas autoridades que para nos virem dizer que a situação da segurança social melhorou financeiramente, não têm vergonha de existirem concidadãos nossos a passarem vexames e sofrimento. A dita situação melhora, mas à custa de atropelos sociais e à redução,por vezes inconcebível, do pouco que alguns, bem necessitados, recebem. E viva a solidariedade nacional. Ai os pelourinhos!...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro antoniodasiscas
É muito grande o fosso entre a realidade e o discurso político.
Se há coisa de que os nossos idosos carenciados precisam é de serviços de apoio para satisfazer aspectos básicos da vida relativamente aos quais não têm capacidade, só por si, de resolver. Neste mar de carências as suas famílias acabam também por ser vítimas da falta de assistência que compete ao Estado assegurar. Ainda ontem li a notícia de que se encontram em lista de espera para acolhimento em lares cerca de 15.000 idosos. Não querendo discutir se é a melhor solução, certo é que se estão em lista de espera é porque, à primeira vista, não há soluções alternativas exequíveis.
É politicamente correcto anunciar subsídios complementares de solidariedade, mas a resolução dos problemas de fundo dos idosos carenciados não passa seguramente por aí...

A Comunidade disse...

Não compreendo porque é que é necessário gastar 660 euros/idoso/mês.
Será que é necessário um trabalhador por cada idoso no lar?

Creio que há por aí umas 500 mil casas vazias/devolutas/à venda. Bem vistas as coisas faziam-se umas "comunidades" com apoio tipo domiciliário...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Osvaldo Lucas
Em muitos casos 660€/mês não são suficientes e também em muitas situações o acompanhamento do idoso é quase permanente, porque é significativa a sua incapacidade ou dependência e são graves os seus problemas de saúde.