Em entrevista de hoje com a Ministra da Saúde, Ana Jorge, o DN recordou que a Ministra tem contra si um processo, que vai ser julgado no Tribunal de Contas, devido a pagamentos “indevidos” ao Hospital Amadora-Sintra, quando era Presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa.
A pendência entre o Estado e o Grupo Melo, que vem assegurando contratualmente a gestão do Hospital, já foi há muito resolvida pelo Tribunal Arbitral aceite pelas partes. Parece-me ilógico que o assunto não tenha ficado definitivamente resolvido em todas as instâncias, incluindo o Tribunal de Contas.
Mas, para além de ilógica, a situação raia o absurdo.
Segundo é explicado pela Ministra, o processo do Tribunal de Contas deve-se a que foram feitos pagamentos por tratamentos efectivamente feitos a doentes oncológicos, renais e com Sida, tratamentos esses que “não estavam contidos no contrato”.
Na contingência, e provada que foi a efectivação dos tratamentos, Ana Jorge mandou pagar. e mandou bem. Vistas as coisas, Ana Jorge é “condenada”, não pelo facto de o Hospital não cumprir a sua missão, mas sim por cumpri-la. Se os doentes fossem enviados para outro hospital e ficassem em fila de espera, como seria óbvio, Ana Jorge provavelmente seria louvada.
Assim, corre o risco de ter que pagar ao Estado, do seu bolso, 3,5 milhões de euros!...
Com factos destes, de uma burocracia cada vez mais arrogante e impante, que inquisitorialmente vê a forma, mas ignora a substância, nada de admirar, pois, que a escolha de dirigentes do sector público tenha que recair, cada vez mais, sobre um universo de terceira e quarta ordem!...
A pendência entre o Estado e o Grupo Melo, que vem assegurando contratualmente a gestão do Hospital, já foi há muito resolvida pelo Tribunal Arbitral aceite pelas partes. Parece-me ilógico que o assunto não tenha ficado definitivamente resolvido em todas as instâncias, incluindo o Tribunal de Contas.
Mas, para além de ilógica, a situação raia o absurdo.
Segundo é explicado pela Ministra, o processo do Tribunal de Contas deve-se a que foram feitos pagamentos por tratamentos efectivamente feitos a doentes oncológicos, renais e com Sida, tratamentos esses que “não estavam contidos no contrato”.
Na contingência, e provada que foi a efectivação dos tratamentos, Ana Jorge mandou pagar. e mandou bem. Vistas as coisas, Ana Jorge é “condenada”, não pelo facto de o Hospital não cumprir a sua missão, mas sim por cumpri-la. Se os doentes fossem enviados para outro hospital e ficassem em fila de espera, como seria óbvio, Ana Jorge provavelmente seria louvada.
Assim, corre o risco de ter que pagar ao Estado, do seu bolso, 3,5 milhões de euros!...
Com factos destes, de uma burocracia cada vez mais arrogante e impante, que inquisitorialmente vê a forma, mas ignora a substância, nada de admirar, pois, que a escolha de dirigentes do sector público tenha que recair, cada vez mais, sobre um universo de terceira e quarta ordem!...
8 comentários:
Sim e sendo a ministra o caso mais mediático, acho que existem mais funcionários com processos semelhantes. Mas, claro, dinheiro mal gasto é com doentes de SIDA não é com estes amanuenses...
Caro Pinho Cardão,
Percebo bem o teu raciocínio (politicamente correcto)e também eu sou sensível aos argumentos que sustentaram o pagamento.
Não me parece, contudo, que se possa condenar o TC por levantar o problema:
1º. Porque tem um campo de jurisdição próprio; se assim não fosse, não teria razão para existir,porque poderiam colidir as suas decisões com as dos tribunais comuns chamados a julgar os mesmos processos.Não sei mesmo se os tribunais que julgaram não o fizeram exorbitando das suas esferas de competências.Andam geralmente os tribunais atrasados nos julgamentos mas desta vez anteciparam-se ao TC; Vá lá saber-se porquê.
2 - Ou porque se trata de julgar aspectos diferentes do mesmo processo, mantendo-se pertinente o julgamento do TC, independentemente das sentenças já lavradas em outras instâncias.
3 - Quanto à questão da forma e da substância, não penso que o assunto seja assim tão pacífico do ponto de vista estritamente contratual. Se aqueles cuidados médicos não estavam contratualizados, das duas uma: ou o Hospital solicitava o acordo prévio pontual do Ministério, ou remetia os doentes para um Hospital que estivesse autorizado a fazê-los.
Independentemente de razões humanitárias há razões contratuais que não devem ser eliminadas gratuitamente.
Salvo melhor opinião.
Caro Rui.
A ser como é referido na entrevista, e até em função da Resolução do Tribunal Arbitral, não parece que o Tribunal de Contas tenha razão. Claro que o Tribunal tem que verificar o cumprimento dos contratos. Claro que haverá desconformidade entre a gama dos serviços a prestar e os serviços prestados. Claro que a então Directora da Administração Regional de Saúde justificou os seus actos, como decorre da entrevista. Claro que os tratamentos foram feitos. Claro que, se o não fossem, seriam feitos noutro hospital, com insanável dano para os doentes que entretanto morreriam e com graves danos para os que entretanto não morressem. Claro que o custo dos tratamentos seria incorrido em qualquer hospital e seria tendencialmente o mesmo.
Claro que, sendo assim, só burocracia sem alma nem compaixão levará o TC a exigir responsabilidades monetárias a Ana Jorge.
Claro que, se todos os doentes tivessem morrido com a espera o Estado não gastava um tostão e tudo estaria legal!...
Oh Rui!...
Oportuno este apontamento, Pinho Cardão. Muito oportuno.
Não conheço os contornos do caso que envolve a ministra, mas conheço outros em que se colocam exactamente as mesmas questões. E posso garantir que existem casos de dirigentes que foram consensualmente tidos como competentes e exemplares no exercício das suas funções, dedicados ao serviço público muito para além daquilo que é exigível, agraciados pelas mais altas entidades, e no entanto encontram-se a responder em processos de consequências patrimoniais potencialmente graves.
Não duvido da importância do Tribunal de Contas e do papel que desempenha, do ponto de vista preventivo e sancionatório.
Mas não tenho qualquer dúvida em afirmar que muitas dos resultados das auditorias em que se baseiam os seus julgamentos, resultam de interpretações descontextualizadas, feitas por quem nunca teve a experiência de gerir no terreno os problemas que não dependem de consulta prévia nem a auditores nem a juizes.
Aliás, a jurisdição do Tribunal de Contas levanta questões que curiosamente ninguém aborda, como por exemplo o manifesto deficite de garantias processuais e uma clara ausência de pluralidade de formações de julgamento, hieraquizada, que assegure a indispensável revista por instância de recurso.
Mas, como acontece com praticamente todas as instituições, elas são somente interessantes para os media quando são fonte ou veiculo de escandalo. Quando em questão está o próprio tribunal que, mesmo antes do julgamento baseado num due process, isso já nenjum interesse tem.
É verdade, caro Ferreira de Almeida.
Quando estive no Parlamento, tive que ver, por dever de ofício, muitos Relatórios do Tribunal de Contas.
Claro que há muitas considerações e análises oportunas e judiciosas. Mas, por vezes, arrepiavam-me algumas conclusões, tiradas por quem das dificuldades da gestão de organismos simples, quanto mais complexos,não tem qualquer ideia.
Mas que tinham consequências sobre o bom nome pessoal e profissional das pessoas envolvidas.
Muitas vezes, estas pessoas diziam nem sequer terem sido ouvidas, em sede de contraditório.
Mas o problema ainda é mais grave, na medida em que os Partidos políticos da Oposição tomam sistematicamente como boas as conclusões em que se ataca o Governo e os Organismos do Governo e os Partidos políticos que suportam o Governo tomam também sempre como boas as conclusões que "condenam" actos de gestão da responsabilidade de antigos governos.
Assim sendo, desresponsabiliza-se o próprio Tribunal de Contas, que vê os seus Relatórios serem analisados não em função do mérito, mas em função dos interesses políticos.
Caro Pinho Cardão,
A ser assim como dizes acabe-se com o Tribunal de Contas e, já agora, com os contratos.
Caro Rui:
Há um ditado latino, com mais de 2.000 anos, que dizia: "est modus in rebus", e quer dizer que há um modo certo, proporcional, de fazer as coisas.
É esta sabedoria que as Instituições deveriam ter.
Mas como podem ter essa sabedoria se alguns dos seus dirigentes e quadros são analfabetos, nunca leram os clássicos, nem têm qualquer experiência da vida e das coisas?
Estou a falar das Instituições em geral, não de nenhuma em particular.
E tenho muito respeito pelo Tribunal de Contas; respeito esse, aliás, que me leva a criticar os erros de análise e de perspectiva em que também incorre.
Caro Pinho Cardão,
O meu latim não é lá grande coisa, é verdade, e dos clássicos também não me gabo de ter bebido o que devia, mas o que sei é que é no abuso dos contratos com o Estado que os fornecedores engrossam as margens.
Imagina que tu és o presidente de uma empresa que contrata com duas entidades para prestarem cuidados médicos aos seus empregados. E que à entidade A são entregues os cuidados x, e à entidade B os cuidados Y. Um dia constatas que a entidade A, sem autorização prévia, prestou cuidados y. Que fazes? Pagas e não reclamas?
Est modus in rebus?
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