A fixação do critério da quantidade produzida como o mais determinante na avaliação do desempenho, a não ser em processos produtivos muito simples, é rematada asneira. E perfeitamente inaplicável em muitas situações. Não é concebível, por exemplo, que os Inspectores da Polícia Judiciária sejam avaliados predominantemente pelo número de acusações que formularem ou os Inspectores da ASAE, pelo número de estabelecimentos que fecharem, como é dito que o Governo quer estabelecer.
Tal só é possível, a meu ver, por duas razões: má assimilação, pelos dirigentes e tecnocratas socialistas, de conceitos básicos de gestão em cursos feitos à pressa, estilo bolonhês, avant la lettre; ou porque esses mesmos dirigentes e tecnocratas ainda interpretam os novos conceitos de gestão à luz e na base da cultura dos Planos Quinquenais da União Soviética que foi, para muitos, a grande matriz da sua formação.
De facto, a doutrina marxista exaltava o trabalho operário, o único que gerava valor, consubstanciado na criação de bens reais. Na nomenclatura soviética, o conjunto dos bens assim gerado formava o que designavam por val ( não o valor actual líquido, que heresia, mas, em russo, o valovoi produkt, faltando o trema no oi de valovoi…).
Este val, ou estes bens tinham o seu valor próprio, qualquer que fosse o seu destino final. Até 1965, o val esteve no primeiro lugar dos indicadores. A missão dos trabalhadores era, acima de tudo, fazer o val.
O que se passava posteriormente à produção já não interessava. Se deixava de haver procura, se os bens não eram escoados ou por serem defeituosos, ou por falta de transporte, ou por não obedecerem completamente às especificações, nada interessava. A empresa tinha produzido os milhares de toneladas previstos, mesmo que os parafusos não tivessem rosca e se assemelhassem a pregos, ou se os bens produzidos fossem completamente rejeitados.
Com o método de avaliação agora proposto pelo Governo, o mesmo se irá passar na Fábrica da Polícia Judiciária.
As acusações valerão por si próprias, qualquer que seja o seu destino ou a sua sorte final. A missão da Polícia é, acima de tudo, produzir acusação, isto é, fazer o seu val.
Acontece que, mesmo na União Soviética tal processo de medida acabou em 1965. Aqui, está a começar, por obra e graça destes tecnocratas com luzes modernaças, mas cultura dos planos quinquenais!...
Nota: Recomendo um excelente livro, se é que é possível encontrá-lo ainda, editado pelas Publicações Europa-América há uns trinta anos, A Empresa na União Soviética, de E. Egnell e M. Peissik. Algumas das expressões do texto foram daí retiradas.
Tal só é possível, a meu ver, por duas razões: má assimilação, pelos dirigentes e tecnocratas socialistas, de conceitos básicos de gestão em cursos feitos à pressa, estilo bolonhês, avant la lettre; ou porque esses mesmos dirigentes e tecnocratas ainda interpretam os novos conceitos de gestão à luz e na base da cultura dos Planos Quinquenais da União Soviética que foi, para muitos, a grande matriz da sua formação.
De facto, a doutrina marxista exaltava o trabalho operário, o único que gerava valor, consubstanciado na criação de bens reais. Na nomenclatura soviética, o conjunto dos bens assim gerado formava o que designavam por val ( não o valor actual líquido, que heresia, mas, em russo, o valovoi produkt, faltando o trema no oi de valovoi…).
Este val, ou estes bens tinham o seu valor próprio, qualquer que fosse o seu destino final. Até 1965, o val esteve no primeiro lugar dos indicadores. A missão dos trabalhadores era, acima de tudo, fazer o val.
O que se passava posteriormente à produção já não interessava. Se deixava de haver procura, se os bens não eram escoados ou por serem defeituosos, ou por falta de transporte, ou por não obedecerem completamente às especificações, nada interessava. A empresa tinha produzido os milhares de toneladas previstos, mesmo que os parafusos não tivessem rosca e se assemelhassem a pregos, ou se os bens produzidos fossem completamente rejeitados.
Com o método de avaliação agora proposto pelo Governo, o mesmo se irá passar na Fábrica da Polícia Judiciária.
As acusações valerão por si próprias, qualquer que seja o seu destino ou a sua sorte final. A missão da Polícia é, acima de tudo, produzir acusação, isto é, fazer o seu val.
Acontece que, mesmo na União Soviética tal processo de medida acabou em 1965. Aqui, está a começar, por obra e graça destes tecnocratas com luzes modernaças, mas cultura dos planos quinquenais!...
Nota: Recomendo um excelente livro, se é que é possível encontrá-lo ainda, editado pelas Publicações Europa-América há uns trinta anos, A Empresa na União Soviética, de E. Egnell e M. Peissik. Algumas das expressões do texto foram daí retiradas.
5 comentários:
Sou um pouco mais radical que isso, caro Pinho Cardão. Não sei em que fase da história, a gestão ganhou uma identidade própria como se fosse um saber independente e não um saber complementar. Como se existisse gestão por si só, como se algo pudesse ser gerido só pela prática de gestão e não por ser um produto ou um serviço com consumidores. Então começou a surgir a figura do gestor que tanto dá para um banco, como para uma empresa de telecomunicações, como para uma rede de supermercados, como....o verdadeiro faz-tudo que não faz nada.
Como estes faz-tudo não conseguem discernir entre um conjunto de indicadores e um negócio, o resultado é, habitualmente, catastrófico e começa-se a perceber quando as melhores pessoas começam a sair e vai por aí fora. E temos aí resultados recentes na banca, por exemplo, disto mesmo para o demonstrar. Quando os banqueiros foram substituídos pelos “gestores” (entre plicas para distinguir daqueles que gerem negócios e não indicadores), deu asneira. A que, aliás, o meu caro dedicou um conjunto de posts.
No fundo, isto não difere em muito dos planos quinquenais e tanto um como outro têm um grande atractivo – não é preciso saber de nada em profundidade para ser um “gestor” deste tipo.
Quando isto chega ao estado, como agora, a coisa é ainda pior. Pior porque não há “os melhores”. Pior porque deve ter entrado tipo vírus pelo INA e, aposto, já deve ter carácter de religião. Pior porque não há negócio. Isto vai ser uma catástrofe.
O comentário do Caro Tonibler só pode ser uma piada, para animar, mais uma segunda feira (chata, como todas as segundas feiras) das nossas vidas.
Mas como a paternidade (ou será maternidade ?) da avaliação de desempenho na fp, tb habita o 4R, e .... não menos, importante, gestores de topo, do nosso país, fazem igualmente parte deste espaço virtual, não me atrevo a comentar.
Prefiro reduzir-me à minha ignorância.
mas lá que está, com piada, lá isso está, ó tonibler.
Não sei é se os gestores, concordarão com o que Tonibler escreveu, principalmente, aqueles gestores, que acreditam que as organizações são feitas de e para as pessoas. E é justamente das pessoas que depende, em primeiro lugar, o sucesso de uma organização.
pézinhos dixit.
Apoiado, Tonibler, apoiado! Eu não diria melhor sobre os gestores de tudo que afinal não têm capacidade para gerir coisa alguma. Bravo!
Pezinhos, para as organizações serem feitas para as pessoas têm que ser geridas por pessoas que percebem do ramo da organização que gerem. ;-)
Cara Pézinhos,
Eu sou gestor. Pelo meio de todas as minha actividades laborais, também tenho que o ser. E acho admirável quem consiga passar de um banco para uma fábrica sendo igualmente bom gestor. Eu sei que seria incapaz, porque quem o consegue tem que reaprender uma vida, tem que redireccionar tudo o que sabe, mesmo que vá trabalhar exclusivamente com finanças, por exemplo.
Não duvide, cara Pézinhos, que a diferença entre um "gestor" e um gestor é essa. Vai um enorme esforço e sacrifício que, como lhe disse, eu seria incapaz. Porque para montar ferramentas de gestão e ler uns indicadores no abstracto só é preciso saber aritmética da 4ª classe, não é preciso mais.
Mas, cara Pézinhos, quer fazer parte de uma organização que não paga ordenados? Senão, se não se importa, eu continuo a achar que a primeira obrigação da organização perante as pessoas é pagar-lhe pelo trabalho. Por isso, qualquer gestor que sinta que viver para as pessoas não começa por isso, não é um gestor, é um sujeito com manias.
Para quê dizer alguma coisa quando o amigo Tóni já disse, praticamente, tudo?
Cara Pézinhos, creio que consigo perceber o que quer dizer sobre os gestores «que acreditam que as organizações são feitas de e para as pessoas» e posso dizer-lhe que, pelo meu breve contacto com o mundo dos "headhunters", há empresas em Portugal que não olham a meios para irem buscar as pessoas que querem. Não olham a meios - em vários sentidos - principalmente no que respeita àquilo que oferecem e acredite que oferecem muito (em alguns casos chega a ser obsceno o que oferecem). Obviamente que o nível de exigência é directamente proporcional à oferta (Nota: não me estou a referir em exclusivo a executivos de topo).
Não há organizações de e para as pessoas (excepto as não lucrativas e mesmo essas são controversas), há é organizações que tratam bem as pessoas porque precisam delas para chegarem a algum lado e serem os melhores.
No caso da Administração Pública a filosofia é a inversa. O estado, só porque é estado, não acha que tem de ser o melhor. O que o estado acha é que pode exigir sem dar nada em troca. E depois mais cedo, ou mais tarde, vai descobrir que a relação não funciona.
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