Na edição desta data do diário OJE, Horácio Piriquito, atento aos sucessos dos últimos dias, opina o seguinte: "A grande maioria dos grupos empresariais e financeiros em Portugal, resistiu até agora numa verdadeira ditadura das equipas de gestão, sempre e com grande influência e dependência do poder político". Acrescenta: "No fundo, os gestores assalariados controlaram sempre os accionistas como autênticos reféns das suas estratégias e interesses"
Subscrevo. Os resultados de algumas "escolas" da gestão privada nacional estão à vista, em especial pelo inenarrável que vemos revelado em especial sobre o que se passou nalgumas instituições do sector financeiro.
São pertinentes, no actual cenário, algumas questões que merecem reflexão séria, na perspectiva de uma mudança necessária nas exigências de rigor, honestidade e probidade por parte de quem administra o que normalmente não é seu e goza da tácita confiança do mercado (e, como se tem visto, da complacência das autoridades de controlo):
- Quanto valor se perdeu, ao longo dos anos, com a administração de empresas subordinada aos interesses individuais dos seus gestores?
- E quanto potencial que no País existiu, por força deste fenómeno tem sido atirado borda fora?
- Face à questionável validade de alguns modelos, técnicas e metodologias de gestão, ainda faz sentido a dicotomia a que nos habituámos entre a crónica má gestão pública e a sempre boa gestão privada, a ponto de se ter tornado politicamente correcto defender que aquela deveria assimilar as boas práticas desta?
Uma nota mais. O que tem vindo a lume por estes dias não teria especial gravidade se o valor perdido e o potencial desperdiçado fossem unicamente penalizadores dos gestores das empresas. Porém, as fortunas pessoais destes e a ruína das empresas que administram têm-se construído sem que a maioria deles arrisque um cêntimo que seja do seu dinheiro. É o dinheiro dos accionistas, muitas vezes pequenas poupanças, que fica em risco. Estes, só se apercebem do descalabro nestes momentos em que as crises revelam uma das suas poucas virtudes: a de tornar tudo mais claro e transparente. Pena é que de pouco valha essa clareza...
2 comentários:
Caro Ferreira de Almeida:
Na minha opinião, não é a validade dos modelos, técnicas e metodologias de gestão que está em causa. O que está em causa é a ética de quem os aplica.
As questões éticas têm sido completamente deixadas de lado no ensino, formando-se empresários, gestores, quadros tecnocráticos e amorais, com os lindos resultados que dá. Com a dimensão que as empresas vêm tomando e os milhares de milhões de transacções que daí resultam, só por acaso as supervisões poderão detectar irregularidades ou fraudes. A não ser que os indícios sejam de tal forma brutais que elas se vejam a olho nu. E se aqui as supervisões não funcionam,então devem ser chamadas a resonsabilidade.
Mas perante tal magnitude dos movimentos, creio que só a ética dos gestores (e muito medo de meterem o pé na argola...) poderão tranquilizar todos os que se relacionam com a empresa, clientes, colaboradores, accionistas).
Não quero fazer futurologia, mas já há uns tempos que venho dizendo que está a acabar o tempo das empresas gigantes, incontroláveis, como agora se vem provando. E o tempo do "medium is beautiful" vem aí.
Os accionistas serão os primeiros interessados, e serão os primeiros a rejeitar o canto dos gestores para quem a dimensão é a única medida da qualidade da gestão.
Estou de acordo, Pinho Cardão. Mais do que modelos de gestão errados, é a ética que não abunda.
Já aqui discutimos a propósito de variados factos e episódios que estamos a pagar o preço de uma profunda crise do dever aos mais variados níveis. Quando a ausência do sentido do dever se faz sentir nas lideranças, como exigir que a sociedade, toda ela, se mova por princípios e não somente por estímulos materiais?
Enviar um comentário