Um artigo de opinião, intitulado “O medo do medo”, provocou-me uma certa apreensão e fez-me reviver algumas lembranças.
O cronista afirmou que “ter medo do medo é pior que ter medo”. Certo! Em seguida opina que se está a produzir um sentimento de medo imaginário com propósitos menos claros, com interesses para certos grupos, presumo que sejam partidários. Ou seja, segundo o autor, não há motivo para ter medo dos medos, “porque os portugueses não são medrosos”. Portugal é um país de “aventureiros”, de “desenrascados” e com “uma imensa mole de subservientes”.
O que está a acontecer neste glorioso pedaço do planeta Terra é a propagação intencional do “medo imaginário”.
Todos, já sentimos, ao longo das nossas vidas, medos, reais e imaginários. Aliás faz parte do desenvolvimento da nossa personalidade. Eu recordo de em criança sentir medo, como qualquer outra, sobretudo durante a noite, ao ouvir as velhas madeiras do sótão a rangerem, ou os passeios nocturnos dos ratos. O que eu não imaginava! Cobria a cabeça com os lençóis e ficava imobilizado, na esperança de que o monstro não me atacasse. Medo imaginário! Mas também sentia medos reais. Bastava perder os botões da blusa e dos calções, quando jogava ao vintém, jogo em que não era grande especialista. Claro que sabia o que me esperava quando chegasse a casa. Além da cantilena do costume, a que já estava habituado, o que me metia medo – medo real - eram as mãos da minha mãe que produziam um som especial quando “acarinhavam” o traseiro! Outro medo real, ocorria ao fim da tarde dos domingos, quando o Benfica perdia ou empatava. No dia seguinte de manhã, tinha que arranjar uma doença qualquer, habitualmente cólicas abdominais e falsa diarreia, com o objectivo de não ir à escola. Medo imaginário? Não! Medo real. A "pancada" do professor pelo Benfica era tal que, se não ganhasse, passava a “pente fino”, logo à entrada, a rapaziada, em fila indiana, com a menina dos cinco olhos, fossem benfiquistas, a maioria, sportinguistas, o Tonecas do Belenenses e dois portitas, um dos quais era eu! À tarde, já estava mais calmo, passando parte do tempo a ler “A Bola”.
Ao longo do tempo os medos foram variando, alguns reais, mas a maioria eram de facto imaginários, caso dos insucessos escolares que nunca se verificaram, felizmente. O medo imaginário está bem patenteado num pensamento magnífico de Mark Twain, que dizia qualquer coisa do género, “passamos a maior parte da vida a ter medo de coisas que nunca irão acontecer”.
Os portugueses sofrem de medos? Claro que sim. Medo de serem vítimas de assaltos ou pagarem mais impostos, medo de caírem na lenta e penosa justiça, medo de “canibalismo” jornalístico pouco escrupuloso, medo de despedimentos, medo da diligente bufaria, medo de serem substituídos por homens e mulheres da nova “confiança politica”, mesmo que demonstrem competência excepcional, medo de discriminação em termos de acesso aos cuidados de saúde, medo de não conseguirem trabalho, medo do não cumprimento das seguradoras... Medos reais? Não! Apenas medos “imaginários”!
Paquete de Oliveira afirma que “Num país em que escrevem, e como escrevem, Vasco Pulido Valente, Baptista-Bastos, Manuel António Pina, não está ferido de medo”! Além do mais, nem há qualquer “medo da palavra”, basta ver o que se diz no “Chão da Lagoa”.
Em síntese, não há medo em Portugal! O que há é apenas “medo imaginário”.
Pelos vistos, o único medo real é o Benfica não ganhar o próximo campeonato. Como não ando na escola primária, já não corro grandes riscos...
Terapêutica para o medo imaginário? À semelhança do “Doente imaginário” de Moliére, em que a terapêutica se fazia com clisteres, usando velhas seringas de estanho, agora, aparecem candidatos a tentar purgar as mentes dos portugueses... “Médicos imaginários”!
O cronista afirmou que “ter medo do medo é pior que ter medo”. Certo! Em seguida opina que se está a produzir um sentimento de medo imaginário com propósitos menos claros, com interesses para certos grupos, presumo que sejam partidários. Ou seja, segundo o autor, não há motivo para ter medo dos medos, “porque os portugueses não são medrosos”. Portugal é um país de “aventureiros”, de “desenrascados” e com “uma imensa mole de subservientes”.
O que está a acontecer neste glorioso pedaço do planeta Terra é a propagação intencional do “medo imaginário”.
Todos, já sentimos, ao longo das nossas vidas, medos, reais e imaginários. Aliás faz parte do desenvolvimento da nossa personalidade. Eu recordo de em criança sentir medo, como qualquer outra, sobretudo durante a noite, ao ouvir as velhas madeiras do sótão a rangerem, ou os passeios nocturnos dos ratos. O que eu não imaginava! Cobria a cabeça com os lençóis e ficava imobilizado, na esperança de que o monstro não me atacasse. Medo imaginário! Mas também sentia medos reais. Bastava perder os botões da blusa e dos calções, quando jogava ao vintém, jogo em que não era grande especialista. Claro que sabia o que me esperava quando chegasse a casa. Além da cantilena do costume, a que já estava habituado, o que me metia medo – medo real - eram as mãos da minha mãe que produziam um som especial quando “acarinhavam” o traseiro! Outro medo real, ocorria ao fim da tarde dos domingos, quando o Benfica perdia ou empatava. No dia seguinte de manhã, tinha que arranjar uma doença qualquer, habitualmente cólicas abdominais e falsa diarreia, com o objectivo de não ir à escola. Medo imaginário? Não! Medo real. A "pancada" do professor pelo Benfica era tal que, se não ganhasse, passava a “pente fino”, logo à entrada, a rapaziada, em fila indiana, com a menina dos cinco olhos, fossem benfiquistas, a maioria, sportinguistas, o Tonecas do Belenenses e dois portitas, um dos quais era eu! À tarde, já estava mais calmo, passando parte do tempo a ler “A Bola”.
Ao longo do tempo os medos foram variando, alguns reais, mas a maioria eram de facto imaginários, caso dos insucessos escolares que nunca se verificaram, felizmente. O medo imaginário está bem patenteado num pensamento magnífico de Mark Twain, que dizia qualquer coisa do género, “passamos a maior parte da vida a ter medo de coisas que nunca irão acontecer”.
Os portugueses sofrem de medos? Claro que sim. Medo de serem vítimas de assaltos ou pagarem mais impostos, medo de caírem na lenta e penosa justiça, medo de “canibalismo” jornalístico pouco escrupuloso, medo de despedimentos, medo da diligente bufaria, medo de serem substituídos por homens e mulheres da nova “confiança politica”, mesmo que demonstrem competência excepcional, medo de discriminação em termos de acesso aos cuidados de saúde, medo de não conseguirem trabalho, medo do não cumprimento das seguradoras... Medos reais? Não! Apenas medos “imaginários”!
Paquete de Oliveira afirma que “Num país em que escrevem, e como escrevem, Vasco Pulido Valente, Baptista-Bastos, Manuel António Pina, não está ferido de medo”! Além do mais, nem há qualquer “medo da palavra”, basta ver o que se diz no “Chão da Lagoa”.
Em síntese, não há medo em Portugal! O que há é apenas “medo imaginário”.
Pelos vistos, o único medo real é o Benfica não ganhar o próximo campeonato. Como não ando na escola primária, já não corro grandes riscos...
Terapêutica para o medo imaginário? À semelhança do “Doente imaginário” de Moliére, em que a terapêutica se fazia com clisteres, usando velhas seringas de estanho, agora, aparecem candidatos a tentar purgar as mentes dos portugueses... “Médicos imaginários”!
8 comentários:
Um texto absolutamente extraordinário. Cristalino e desassombrado. O Prof. Salvador Massano no seu melhor! Vale mais um bom “blog” que muita palha mediática (sem desprimor para as alimárias que gostam de tal “pitéu”).
Sem dúvida, subscrevo o comentário do félix esménio (nota: também gostei muito da parte das alimárias).
Quem disse "quem se mete com o PS leva"?
O pior é que parece ser cada vez mais verdade.
É preciso não ter medo dos trauliteiros.
Caro Professor Massano Cardos
Parabéns pelo seu texto! Ao ler e reler a sua maravilhosa reflexão sobre o medo, procurei arrumar algumas ideias sobre o assunto.
É curioso observar que o medo imaginário e o medo real evoluem em sentidos contrários com o avanço da idade e a experiência da vida. Quero eu dizer, pelo menos é a sensação que tenho, que à medida que vamos tendo mais idade e ganhando mais experiência o "medo imaginário" decresce enquanto o "medo real" aumenta!
Mas o "medo real" em Portugal cresce não apenas pelo efeito do avanço da idade mas porque estamos em Portugal. Há cada vez mais medos e cada vez mais reais, isto é, em que a probabilidade de o receio virar realidade é cada vez maior. O despedimento e o desemprego, a assistência na saúde de acesso difícil, a justiça que não funciona, a carga fiscal que aumenta, a incompetência e a inveja que espreitam e por aí fora...são medos que metem medo!
Meu caro Sr. Professor
devo lhe confessar que fiquei agradavelmente surpreendida pela qualidade deste seu post. É um tema que me toca a mim de sobremaneira.
Só posso concluir que tão profundo conhecimento sobre o tema seja resultado de muitos relatos sr. professor, muitos relatos...
Caro Professor:
Desde pequenino, e embora em grande minoria, pelo que li, não teve medo de ficar do lado certo!...A maioria, infelizmente, só bacoreja se tem um exército ao lado; se não tem, mete a viola no saco e trata de bajular os chefes!...
Caro Félix Esménio:
A palavra exacta, palha mediática. Com a mesma origem, desde há muito. Velha e relha,cheirando a mofo.
De facto, alguns blogs são mesmo um oásis.
Em grande forma, Caro Massano Cardoso, excelente texto. Um oásis, sem dúvida.
Meus caros amigos.
Agradeço as vossas gentilezas e fico satisfeito por poder partilhar assuntos que nos tocam a todos.
Uma breve nota para a “Chevalier de Pas” que demonstrou uma simpatia que registo com agrado…
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