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segunda-feira, 1 de outubro de 2007

“Dia Internacional do Idoso”

Um casal de idosos, que conheço há mais de cinquenta anos, procurou-me há quinze dias em Santa Comba. Os motivos prendiam-se com as suas condições de saúde sobretudo da esposa que apresentava um quadro evidente de demência.
O marido contou que viviam em Lisboa num quarto andar de um prédio sem mais nenhuma alma. Não conversavam com ninguém. Limitavam-se a ficar na cama até à hora do almoço, deslocando-se em seguida a um restaurante da zona. Ao regressarem a casa enfiavam-se novamente na cama. Os últimos quatro meses foram particularmente penosos. Tiveram que ir para a sua aldeia para casa de uma irmã, também, idosa e doente, tristes e deprimidos.
Face ao quadro tive que explicar que havia necessidade de se socorrerem de ajuda de instituição adequada afastando-se de Lisboa. Foi dramático ter que explicar a solução ao casal e sobretudo levá-los a aceitá-la. Disse-lhes que na primeira fase ficariam em casa com apoio domiciliário e da comunidade que tão bem os conheciam. No final, o senhor, que com os seus 87 anos conduz e possui bom tino, agradeceu todos os conselhos comovidamente. Um alívio perpassou-lhe pelos seus olhos.
As medidas foram tomadas, mas devido à gravidade da senhora tiveram mesmo que ir para o lar.
Este fim de semana comunicaram-me como estavam. A senhora anda muito agitada e tremendamente desorientada e o marido queixoso, porque no lar “só há velhos e não consegue falar com ninguém"! Quer dar umas voltas no seu carro e ir até ao café cavaquear com os velhos amigos mas a mulher grita que nem uma desalmada quando se apercebe da sua ausência.
Ao confrontar a situação com as minhas recordações de infância, em que brincava livremente sob a sua protecção, sinto algo difícil de exprimir. Resta-me o consolo de ter dado um contributo para que a dignidade do casal fosse preservada, enquadrando-os o mais próximo possível das suas origens, dos familiares e dos seus amigos.
No “Dia Internacional do Idoso” uma pequena reflexão em homenagem a todos os gerontes aos quais temos de garantir dignidade e manifestar o nosso respeito. Bem o merecem.

5 comentários:

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Professor Massano Cardoso
Ser idoso poderá não ser fácil, mas com toda a certeza que é muito triste ser idoso no desamparo, no abandono, na solidão e na insegurança. Esquecemo-nos muitas vezes que os velhos também foram novos e que os mais novos também um dia serão velhos e que uns e outros precisam uns dos outros. Infelizmente os velhos são muitas vezes tratados como objectos "descartáveis", a começar pelas suas próprias famílias. Trata-se de uma grande ingratidão, mas as coisas são assim.
Mas há pessoas boas e interessadas que se preocupam e que querem ajudar. O Professor Massano Cardoso deitou a "mão" ao casal de idosos que aqui nos trouxe, num gesto de generosidade e amizade.

Suzana Toscano disse...

As cidades são especialmente desumanas, sobretudo em zonas que foram invadidas por escritórios, onde ninguém se conhece e à noite os prédios ficam vazios. Mas não é só. Eu moro no mesmo prédio há quase 30 anos e não sei o nome da maior parte dos vizinhos, excepto dos 3 ou 4 mais "antigos". Outro dia cheguei a casa e tinha um bilhetinho colado na porta, um pedido de ajuda de uma vizinha que perguntava se seu sabia de alguém que pudesse vir cá dormir todos os dias, a ajudasse a levantar e a arranjar-se, a levasse à rua de vez em quando. A senhora,a quem digo Bom dia, boa tarde, há décadas, sem ter trocado mais palavras do que isso, está praticamente cega, deve ter cerca de 70 anos. Disse-me que tem terror de ir para um lar mas que os filhos não podem estar cá todo o tempo. Ninguém quer ficar a viver com uma pessoa assim,se for já com alguma idade não tem forças, se for nova vai-se embora ao fim de pouco tempo. E os preços são altos... Os meus esforços não têm resultado, e os pedidos passaram a ser aflitivos. Nas costas dos outros vemos as nossas...

Carlos Monteiro disse...

Um excelente texto e um comentário da Margarida muito oportuno. É curioso como é que numa sociedade que está toda ela a envelhecer, se cultiva esta atitude de desprezo com os mais velhos.

Parece masoquismo, porque todos nós iremos colher o fruto do que, como sociedade, andamos a semear...

Carlos Monteiro disse...

Nota também para o excelente comentário da minha cara Suzana Toscano, com a sensibilidade que a caracteriza. Não fiz menção porque não li. Devemos ter escrito ao mesmo tempo.

Suzana Toscano disse...

Olá caro cmonteiro, pelos vistos coincidimos na blogosfera! Muito prazer em revê-lo e obrigada pelo seu comentário tão amável!:)