Sigo com um certo interesse as notícias do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos quando condena o Estado Português. A comunicação social também só faz referência aos casos em que somos condenados, desconhecendo as outras decisões que confirmam os acórdãos dos tribunais. Confesso que fico surpreendido com as condenações que, ao serem proferidas pela mais elevada instância europeia, revelam, penso eu, “má prática” da justiça nacional. Como é possível que aconteçam casos como o que acabei de ler hoje e que diz respeito a um acontecimento ocorrido num concelho vizinho e julgado na comarca da minha terra natal? Por acaso acompanhei o incidente na altura, em que um cidadão, durante o Carnaval, andou a gozar com o presidente da Câmara Municipal de Mortágua, ao parodiar e jogar o seu nome com “empreendimentos menos corretos”, usando, inclusive a sua figura e o anagrama do nome, tudo isto à mistura com um saco azul enfiado num pau e música sugestiva lançada pelo altifalante da viatura em que se fazia transportar. Nessa campanha carnavalesca, o autor fazia referências ao modo como se arranjavam empregos, nada abonatórias para o senhor presidente. Apesar de o juiz de instrução ter entendido que não havia crime - o mesmo não aconteceu com o Tribunal de Relação -, o parodiante acabou por ser condenado. Não se conformou e queixou-se ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que lhe deu razão. Agora, o Estado foi condenado a pagar a multa de então, 4.000 euros, mais 4.400 euros por danos morais e 1.500 euros de custas, ou seja cerca de 10.000 euros. Nesta quantia há uma pequeníssima fração minha, mas adiante.
O autor da campanha considerou que a sua condenação violava “a liberdade de expressão”. A perspetiva do Tribunal Europeu confirmou-a, considerando não ter havido difamação.
É muito comum coisas desta natureza, sobretudo durante as campanhas eleitorais em que muitas pessoas denunciam alto e em bom som, ou passam mesmo a escrito, críticas sobre os comportamentos dos autarcas, quanto à forma como arranjam empregos para algumas pessoas, sendo rotulados de agentes ou comissários de empregos, em troca dos quais exigem o voto. Em termos práticos como é que poderemos analisar este fenómeno? Podemos aceitar que as críticas são mesmo reais, ou seja, há mesmo um tráfico de influências do género: “tu e a tua família votam em mim e eu arranjo-te emprego”, desrespeitando as regras de competência e de concurso em igualdade de circunstâncias. Mas podem, também, não ter razão, e as contratações serem transparentes e corretas.
Quanto aos denunciantes, alguns são mesmo corajosos. Podem e devem utilizar os meios que acharem mais adequados, desde a denúncia formal ou a sátira, como foi este caso. Se são justas ou injustas isso são contas de outro rosário, se têm interesses ou não, se se sentem preteridos, ou se sofrem de inveja, isso só eles é que sabem. Quanto aos políticos, e personalidades públicas, alvos destas apreciações, têm que as encaixar, embora, muitas vezes, sejam bastante incomodativas. Eu compreendo-os. Muitos são homens de bem e lá diz o ditado que “quem não se sente não é filho de boa gente”. Mas há outras formas de sentir. Através da atitude, da transparência e de decisões acertadas, acabarão por dar as devidas respostas à população, a qual, acabará, caso os atingidos tenham razão, por sancionar social e civicamente os promotores das perfídias e infâmias, moeda corrente no nosso povo. E, em termos sociais, este tipo de censuras perduram muito mais tempo do que qualquer multa ou condenação proferida pelo tribunal. Mas também é certo que existe uma apetência inusitada na corrida à justiça para intimidar os cidadãos. No fundo, traduz uma forma de controlo social que, cada vez mais, grassa entre nós. Sendo assim, independentemente da razão, ou ausência dela, por parte do queixoso em causa, aplaudo a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, o qual vem reforçar e legitimar as críticas e iniciativas dos cidadãos imunizando-nos contra o crescente medo da sociedade portuguesa, para a qual, incompreensivelmente, os tribunais portugueses estão a colaborar.
O autor da campanha considerou que a sua condenação violava “a liberdade de expressão”. A perspetiva do Tribunal Europeu confirmou-a, considerando não ter havido difamação.
É muito comum coisas desta natureza, sobretudo durante as campanhas eleitorais em que muitas pessoas denunciam alto e em bom som, ou passam mesmo a escrito, críticas sobre os comportamentos dos autarcas, quanto à forma como arranjam empregos para algumas pessoas, sendo rotulados de agentes ou comissários de empregos, em troca dos quais exigem o voto. Em termos práticos como é que poderemos analisar este fenómeno? Podemos aceitar que as críticas são mesmo reais, ou seja, há mesmo um tráfico de influências do género: “tu e a tua família votam em mim e eu arranjo-te emprego”, desrespeitando as regras de competência e de concurso em igualdade de circunstâncias. Mas podem, também, não ter razão, e as contratações serem transparentes e corretas.
Quanto aos denunciantes, alguns são mesmo corajosos. Podem e devem utilizar os meios que acharem mais adequados, desde a denúncia formal ou a sátira, como foi este caso. Se são justas ou injustas isso são contas de outro rosário, se têm interesses ou não, se se sentem preteridos, ou se sofrem de inveja, isso só eles é que sabem. Quanto aos políticos, e personalidades públicas, alvos destas apreciações, têm que as encaixar, embora, muitas vezes, sejam bastante incomodativas. Eu compreendo-os. Muitos são homens de bem e lá diz o ditado que “quem não se sente não é filho de boa gente”. Mas há outras formas de sentir. Através da atitude, da transparência e de decisões acertadas, acabarão por dar as devidas respostas à população, a qual, acabará, caso os atingidos tenham razão, por sancionar social e civicamente os promotores das perfídias e infâmias, moeda corrente no nosso povo. E, em termos sociais, este tipo de censuras perduram muito mais tempo do que qualquer multa ou condenação proferida pelo tribunal. Mas também é certo que existe uma apetência inusitada na corrida à justiça para intimidar os cidadãos. No fundo, traduz uma forma de controlo social que, cada vez mais, grassa entre nós. Sendo assim, independentemente da razão, ou ausência dela, por parte do queixoso em causa, aplaudo a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, o qual vem reforçar e legitimar as críticas e iniciativas dos cidadãos imunizando-nos contra o crescente medo da sociedade portuguesa, para a qual, incompreensivelmente, os tribunais portugueses estão a colaborar.
2 comentários:
Caro Professor:
"Mas há outras formas de sentir. Através da atitude, da transparência e de decisões acertadas, acabarão por dar as devidas respostas à população, a qual, acabará, caso os atingidos tenham razão, por sancionar social e civicamente os promotores das perfídias e infâmias, moeda corrente no nosso povo".
Aplaudo e, se me der licença, subscrevo
Doutor Massano Cardoso
Por regra, quando o cão morde o homem não é notícia. Mas quando o homem morde o cão a notícia aparece.
Assim, é notícia quando o Estado é condenado no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH). Já a sua absolvição nas instâncias europeias não é, em regra,objecto de notícia.
Dito de outro modo: a excepção, ao contrário da regra, é que é objecto de notícia. Por isso, a comunicação social geralmente não noticia os casos em que o nosso Estado é absolvido pelo Tribunal Europeu.
Concluir que as condenações proferidas contra o Estado pela mais elevada instância europeia são reveladoras da "má prática" da justiça portuguesa não deixa, salvo o devido respeito, de relevar de um juizo apriorístico, que as premissas, de todo, não autorizam.
Como seria apriorístico concluir que as absolvições do Estado pelo TEDH são demonstradoras da "boa prática" da justiça nacional.
E se se acrescentar que o número de aboslvições supera o das condenações, quanto não haverá de "ligeireza" ao concluir-se pela "má prática" da justiça portuguesa!
No caso que o Doutor Massano Cardoso refere, dois tribunais portugueses pronunciaram-se em sentido contrário. Pegando no seu raciocínio, o Tribunal de 1ª instância agiu de acordo com a "má prática", enquanto que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação...com a "boa prática"!
Far-me-á a justiça de reconhecer que não estou a discutir a qualidade da nossa Justiça.
O que me permito apenas é demonstrar que, a partir de casos concretos como aquele que ilustrou no seu Editorial, não se podem fazer inferências sobre a "boa" ou "má" prática da Justiça portuguesa.
De resto, não conheço país da UE que não haja sido condenado no TEDH.
Diz Também o Doutor Massano Cardoso que "também é certo que existe uma apetência inusitada na corrida à justiça para intimidar os cidadãos ". Poderia limitar-se a dizer: "quod era demonstrandum".
Mas o que me cumpre sublinhar é que, pela natureza do órgão de soberania que são os Tribunais, o recurso a estes jamais pode ser encarado com forma de intimidação dos cidadãos! Os Tribunais existem para administrar a justiça, derimindo os conflitos de interesses entre os cidadãos e, pelo toca à justiça penal, para salvaguarda dos bens jurídicos que a assemleia legiferante contemplou , entre eles, o da a honra e o do bom nome das pessoas. Jamais o exercício de um direito, como é o do recurso aos tribunais, poderá ser entendido como uma intimidação ou ameaça! Vivemos em democracia e não temos tribunais totalitários, como foram os do Plenário Criminal do antigo regime.
Há instâncias de controlo, nacionais e supra nacionais, como é o TEDH.
Quereria ficar por aqui. Mas na parte final do seu Editorial refere-se "o crescente medo da sociedade portuguesa, para a qual, incompreensivelmente,os tribunais portugueses estão a colaborar"!
Espero que o alegado "crescente medo da sociedade portuguesa(...)" não seja mais que um desenvolvimento do estafado slogan da "asfixia democrática". E pergunto-lhe à puridade: O Doutor Massano Cardoso sente medo por viver nesta 3R?
Está cerceado no exercício das suas liberdades?
Doutor Massano Cardoso: o clima de medo crescente é tal que pode escrever, sem que nada de desagradável daí lhe advenha "que os Tribunias portugueses colaboram neste clima de crescente medo da sociedade portuguesa! Ai se houvesse medo, Doutor Massano Cardoso...!
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