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terça-feira, 2 de janeiro de 2007

A adesão de Portugal ao euro, ou um exemplo a evitar

Porque foi divulgado no período entre o Natal e o Ano Novo, terá passado despercebido à maior parte das pessoas o paper da Comissão Europeia (CE) sobre a adesão de Portugal ao euro. O artigo, muito curto (6 páginas) e fácil de ler intitula-se “Portugal’s boom and bust: lessons for euro newcomers” e foi escrito pelo português Orlando Abreu, da Direcção-Geral dos Assuntos Económicos e Financeiros da CE.

Já no início de 2004, outro paper da CE, este mais pormenorizado, intitulado “The Portuguese Economy after the boom” colocava bem a nu os problemas estruturais da nossa economia, tal como identificava os tremendos erros de política económica cometidos no período 1996-2000, quando o nosso país se preparava para entrar no restrito clube do euro.

Agora, é referido preto no branco que os futuros membros da Zona Euro devem olhar para Portugal para perceberem como não devem actuar. Nomeadamente,

(i) a inacção em termos de realização de reformas estruturais que compensassem a perda de instrumentos macroeconómicos tradicionais, como a política monetária e a política cambial, e que vão desde a qualificação dos recursos humanos, à desburocratização da administração pública e da justiça ou à flexibilização da legislação laboral, passando pela fiscalidade; e

(ii) a prossecução de uma política orçamental restritiva adequada, que compensasse o efeito expansionista sobre as famílias e as empresas da queda das (nossas) taxas de juro para o nível das taxas de juro alemãs.

Infelizmente, sabe-se o que aconteceu: depois de ter sido decidido, em 1996, que a Zona Euro teria o seu início em 1999, e que Portugal iria tentar estar no chamado “pelotão da frente”, a segunda metade dos anos 90 foi caracterizada, no nosso país, pela ausência de reformas estruturais (que infelizmente ainda hoje se encontram por fazer, quase na sua totalidade…) e por uma política orçamental totalmente desadequada (expansionista), que ainda hoje se está a tentar corrigir.

Ou seja: tudo ao contrário do que devia ter sido feito – e ainda por cima em tempo de “vacas gordas”, que deviam ter sido aproveitados e não foram.

Não creio que haja outro culpado que não seja o primeiro Governo Socialista de António Guterres. De que já faziam parte José Sócrates e Teixeira dos Santos. Que lá estiveram os 4 anos que esse Governo durou (depois, no segundo Governo Guterres, Teixeira dos Santos saiu; José Sócrates continuou). E que, portanto, tiveram parte activa no descalabro que ainda hoje (e durante quantos mais anos?...) nos afecta.

Por isso, quando ouço o actual Ministro das Finanças referir que teve muito orgulho em ter feito parte do governo que colocou Portugal no euro, penso que só podemos sorrir… perante as evidências! Nem vale a pena irritarmo-nos!

Creio, aliás que, constituindo Portugal um exemplo a não seguir pelos países que possam vir a juntar-se ao euro, podemos concluir que teríamos entrado sempre, fosse quem fosse que nos governasse naquele período fatídico. Logo, Portugal aderiu ao euro não com a ajuda daquele Governo, mas apesar daquele Governo… Mais palavras para quê?!...

3 comentários:

Anónimo disse...

Estive a ler, Miguel, o paper para que chamou a atenção.
É de facto impressionante como passámos rapidamente de "bom aluno" da CEE a "mau exemplo" da UE.
É caso para dizer que temos, como País, vocação educativa.Nem que seja para ilustrar o que não se deve fazer...

Tonibler disse...

Eu tb li o paper e consigo concordar com muito pouco do que lá está escrito. Na altura escrevi isto http://tonibler.blogspot.com/2006/12/do-portugals-boom-and-bust-lessons-for.html#links, reli, e acho que ainda fiquei com uma opinião mais negativa.
É verdade que o grosso da culpa esteve no governo do António Guterres, mas as parte dos governos do Cavaco não é pequena.

Aliás, nem percebo como pode(m) sustentar um diagnóstico na ausência de reformas estruturais e depois dizer que não foram feitas em 3 ou 6 anos, conforme a perspectiva.

Agora, "a prossecução de uma política orçamental restritiva adequada, que compensasse o efeito expansionista sobre as famílias e as empresas da queda das (nossas) taxas de juro para o nível das taxas de juro alemãs."????? É mau? Ter taxas de juro baixas agora é mau? Estão a sugerir que as empresas ou as famílias gastaram o dinheiro naquilo que não tem valor?

Desculpe lá, caro Miguel, mas isto não faz qualquer sentido. Falem-me em Expos, em Euros, em A456, e outras parvoeiras sem qualquer valor económico, que faz sentido. Agora, as culpa é das famílias e das empresas????? Essa não...

Miguel Frasquilho disse...

Caríssimos,

Creio que não deve haver matérias muito mais consensuais do que esta!... Os factos estão lá todos e os números também desmentem que os dez anos de Cavaco foram mal aproveitados. Quanto a isso, creio que não vale a pena, agora, mais desenvolvimentos, mas poderei voltar ao assunto oportunamente, Agora, que é verdade que nos três anos de 2002 a 2004 também não foi feito o que devia ter sido, lá isso é bem verdade (como também reconheci no post acima...).
De qualquer forma, muito obrigado pelos vossos comentários!...