Número total de visualizações de páginas

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Contas da saúde e desemprego

Num último Post, de 29 de Novembro, tive aqui oportunidade de transcrever excertos do último relatório do Tribunal de Contas sobre as contas do SNS em 31.12.2006.
Nesse relatório o T.C. arrasa, como é hábito dizer-se hoje, a prestação dessas contas na versão apresentada pelo Governo, pondo em destaque a já muito extensa desorçamentação de despesas que encobre as “melhorias” na gestão financeira do sector da saúde tão propagandeadas pelo Ministro da pasta.
Esta situação é tanto mais preocupante quanto ocorre no ano imediatamente a seguir àquele (2005) em que foram trazidas para o Orçamento todas e mais algumas das despesas que os responsáveis conseguiram descortinar, o que permitiu “cozinhar” o famoso défice de 6,83% do PIB...
É de pasmar como foi possível, passado apenas um ano, voltar à situação anterior ou ainda pior, pois são muitas as centenas de milhões de Euros que, mediante a acumulação de prejuízos/ aumento do endividamento dos Hospitais EPE (ex-SA) e dos Hospitais SPA, escapam actualmente ao perímetro orçamental.
Essa acumulação de prejuízos/aumento de endividamento dos Hospitais permitiu que as transferências do Orçamento para o SNS não tivessem de ser acrescidas em igual montante...Que “sorte”!
Esta forma de tratar o financiamento das despesas públicas, procurando ocultar parte das necessidades, é no entanto reveladora de um grande autismo político-económico, que persiste há longos anos, com especial gravidade desde que aderimos ao Euro.
E não vejo, sinceramente, como ultrapassar esse equívoco básico na execução das políticas.
Como será possível convencer os Governantes de que é indiferente – na melhor das hipóteses – o financiamento ser reconhecido no perímetro orçamental ou escondido debaixo de qualquer tapete neste caso o “tapete” das contas dos Hospitais?
O que importa, para mal da economia, é que a despesa pública seja excessiva, não a forma como essa despesa é financiada, às claras ou às escondidas...e às escondidas tem o inconveniente adicional de criar a ilusão de que a situação orçamental está sob controlo, espevitando a vontade de gastar ainda mais.
Depois lá vem a desgraça do desemprego, de que ontem e hoje tanto se falou e ninguém percebe como é isso possível quando a versão oficial é de sucessos repetidos nas várias frentes da batalha contra o desperdício...
Concluímos assim que enquanto não for mudada, radicalmente, esta mentalidade que leva os próprios responsáveis a acreditar em miragens, não teremos tão cedo solução para os problemas do desemprego e outros desequilíbrios da economia porventura mais graves.
E não adianta prometer o que quer que seja...

8 comentários:

Rui Fonseca disse...

"Concluímos assim que enquanto não for mudada, radicalmente, esta mentalidade que leva os próprios responsáveis a acreditar em miragens, não teremos tão cedo solução para os problemas do desemprego e outros desequilíbrios da economia porventura mais graves."

Adiantaria haver um Código de normas a cumprir e penalidades pesadas para os incumpridores.

PA disse...

Ocorre-me perguntar, Caro Tavares Moreira, com o devido respeito, quantos Funcionários Públicos (Dirigentes e não dirigentes) incompetentes, alguns deles responsáveis, pelos sucessivos e elevados endividamentos e prejuízos na gestão pública, que aponta, de forma certeira, foram despedidos, responsabilizados e devidamente punidos, por este estado da siuação ?

(é que esses, sim, deviam fazer parte da estatística de desemprego)

Desculpe, mas eu hoje estou mesma "azeda".

Tavares Moreira disse...

Caro Rui Fonseca,

Admiro muito a sua persistência e a boa vontade para crer que com códigos de conduta ou normativos similares se consegue resolver este problema endémico da absoluta falta de cultura político-económica dos nossos governantes!
A Lei de Enquadramento Orçamental,para a qual ainda recentemente pedi sua atenção, tem disposições mais do que suficientes para que os autores destes graves erros sejam chamados à responsabilidade...mas nada acontece.
Bem sei que a tripanossmiase que atacou forte em S. Bento nos últimos anos, anulando ou quase a eficácia das oposições explicará muito do que se passa...mas tudo tem um limite!

Cara Pèzinhos n'Areia,

Seja bem-vinda a este debate quase sem esperança!
Muitos daqueles a que se refere foram condecorados e ocupam lugares muito bem remunerados, sobretudo non Estado mas tb em organismos públicos no exterior...
Os Portugueses, gente boa e crédula em geral, acabam até por lhes dedicar um especial carinho - graças à absoluta ignorância em que são mantidos quanto a esta trágica gestão dos recursos públicos que ameaça devolver-nos ao subdesenvolvimento...

Tonibler disse...

Sobre a forma como o dinheiro público é gasto e como as nossas dificuldades se adensam cada vez mais, sugiro a consulta do estudo PISA 2006 da OCDE sobre os sistemas educativos.
aqui:http://www.oecd.org/document/2/0,3343,en_32252351_32236191_39718850_1_1_1_1,00.html#tables_figures_dbase

De como o menor número de alunos por professor da OCDE forma um dos piores resultados...Dá vontade de bater em alguém!

Anthrax disse...

Sabem, meus queridos amigos, na minha opinião só há uma coisa pior do que a não existência de recursos e que é a má gestão e a gestão irresponsável daqueles que existem.

Como já devem estar carecas de saber, porque eu me farto de reclamar, nós aqui no burgo estamos a passar uma má fase há cerca de um ano e meio para cá (com tendência para o prolongamento, excepto se a criatura em causa morrer entretanto, o que seria uma boa notícia porque assim a dita não "avacalharia" mais sitio nenhum).

Esta fase que estamos a passar é tão má que chegámos ao ponto de Portugal constar, rotulado de "pending country", na lista da Comissão Europeia. A designação de "pending country" é aplicada a todos os países que não cumprem os pre-requisitos impostos pela CE no que respeita à implementação de determinados Programas Comunitários e que, em última análise, conduz à não atribuição de fundos comunitários a Portugal.

Nós estivemos nessa lista até ao passado mês de Outubro. Entretanto, no final desse mês essa situação conseguiu ser ultrapassada depois do ultimatum da Comissão avisando que ia suspender os fundos atribuídos a Portugal.

Em termos práticos isto resultou no quê? Resultou numa chuva de reclamações por parte dos beneficiários desses fundos, que avançaram com financiamento próprio depois de terem recebido uma confirmação, por escrito, de que não havia problema nenhum e que ía haver dinheiro. Mas a verdade é que nós estivemos à beira de não receber fundos nenhuns e eles [beneficiários] tinham um papel legalmente válido, dizendo que tinham recebido uma subvenção de X para fazerem Y e cumpriram a parte deles do acordo. Nós é que não só não cumprimos a nossa, como ainda os induzimos em erro por termos sido impedidos de revelar a gravidade da situação.

É claro que chegou a um ponto em que nos estivemos nas tintas para o "impedimento" e começámos a dizer às pessoas o que é que - efectivamente - se passava. Isto do "impedimento hierárquico" é tudo muito engraçado mas, depois quem passa por incompetente são os técnicos que não têm nada a ver com isso. Então, ao nível técnico, resolvemos reverter a situação contando o que é que se passava e explicando que a situação era bem mais grave do que podia parecer.

Conclusão, passámos a ter reclamações muito melhores. Reclamações que atacavam a gestão deste burgozito e que diziam "que tinham muita sorte em ter uma excelente equipa técnica" caso contrário já tinham afundado o "tasco". Isto é um facto. Têm mesmo uma excelente equipa técnica. Por isso é que até Maio de 2006 a CE dizia que Portugal era um dos países que reunia todas as condições para implementar a nova geração de programas sem qualquer problema. A partir de Maio de 2006, muda a gestão e nós acabamos na lista de "pending countries" sob a ameaça de nos cortarem os fundos e ainda colocam a criatura a dirigir o QREN (que acumula com a gestão aqui do tasco).

Se estas criaturas são incompetentes ao ponto de serem incapazes de gerir um tasquito com 20 pessoas (quando deviam ser 40, o que traz muitas consequências negativas em termos de capacidade de resposta), como é que serão capazes de gerir os recursos de um país? Esta gente não serve nem para gerir recursos virtuais num jogo de "SimCity" quanto mais recursos reais.

Tavares Moreira disse...

Caro Anthrax,

Acompanho-o na pungente descrição de sua experiência profissional - que frustração sentirá!
A essa frustração há que acrescentar a que todos os dias temos motivos para revalidar, com este avassalador cortejo de actos reveladores de incompetência primária.
E o pior é que tudo isto vai depois desaguar nos impostos que somos forçados a pagar - e que pagamos com a amarga noção de quem está, em última análise, a praticar uma liberalidade...

Anthrax disse...

Meu caro Dr. TM,

Pois não tenha a menor dúvida que é onde isto tudo vai desaguar e desenganem-se aqueles que acham que o governo está a praticar uma política de contenção orçamental.

Não existe política de contenção orçamental. O que existe é uma fantasia, acompanhada de malabarismos financeiros e muito bem vendida (num pacotinho cheio de laçarotes) aos cidadãos. Por detrás disso, quando temos bancos, EDP's e GALP's com lucros extraordinários, um governo que se vangloria de ter arrecadado não-sei-quantos milhões de euros, a riqueza do país não cresce e o dinheiro não nasce das árvores, é porque estão tirar mais de algum lado e a isto não se chama "política de contenção orçamental". Pode-se chamar "saque", ou "roubo", ou qualquer outra coisa do mesmo género mas, não é política de contenção orçamental.

Tavares Moreira disse...

Caro Anthrax,

Talvez política de "extorsão fiscal" ao serviço da "pornografia orçamental"...