A natalidade é um assunto de interesse nacional. É um assunto
importante. São décadas passadas em que os poderes políticos positivamente
ignoraram a crise da natalidade, pela ausência de políticas adequadas que
ajudassem a contrariar e inverter a tendência dramática do declínio de
nascimentos.
Mas não foi apenas o poder político que andou distraído, a sociedade
civil pouco ou nada se mobilizou para discutir o assunto, andou preocupada com
outras conquistas.
Uma espécie de "suicídio" colectivo, confortado pela
modernização económica e a sociedade de bem-estar que trouxe legítimas ambições
e esperanças e algumas conquistas que fazem parte do aquis civilizacional do desenvolvimento.
Há muitas vozes que entendem que não vale a pena a discussão,
alegando que a baixa fecundidade é o preço do desenvolvimento e que não há nada
a fazer porque as mentalidades mudaram. Já lá vai o tempo em que um filho era
um “investimento”, agora passou a ser uma “despesa”!
Mas a verdade, é que pese embora o desenvolvimento económico,
as mentalidades e a crise que vivemos, o inquérito do INE publicado no final do
ano passado revela que 70% das mulheres e dos homens têm menos filhos do que
aqueles que desejariam ter e que a maioria das pessoas entende que deve haver
incentivos à natalidade, designadamente aumentar o rendimento das famílias com
filhos (ex. redução de impostos), facilitar as condições de trabalho para quem
tem filhos sem comprometer a carreira profissional e perda de regalias (ex.
trabalho a tempo parcial, flexibilidade de horários) e alargar o acesso a
serviços para ocupação dos filhos durante o tempo de trabalho dos pais (ex.
acessibilidade a creches e jardins de infância).
Estes incentivos confirmam as dificuldades concretas com que
os pais se confrontam no acompanhamento e educação dos filhos e mostram que os
pais valorizam a sustentabilidade das condições económicas e dos apoios vários,
ou seja, a capacidade de manter condições que não se esgotam nos primeiros
meses de vida dos filhos, evidenciando que não são meras medidas
administrativas do tipo cheque-bebé, as promessas vãs envelopadas num marketing
político atraente ou uns slogans bem falantes que determinam a decisão de ter
um filho.
A crise da natalidade é muito anterior à crise das finanças
públicas e no, entanto, fomos fingindo ou ignorando a sua existência. Chegamos
a 2013 com um grave défice de nascimentos. A última vez que Portugal assegurou
a renovação de gerações foi em 1982 (com 2,08 filhos), de lá para cá a descida
tem sido vertiginosa com 2013 a bater um novo recorde de apenas 82.538
nascimentos. Em apenas três anos, o número de nascimentos caiu 14,8%.
Por tudo isto, a bandeira da natalidade agora estiada pelo primeiro-ministro
é bem-vinda. Vem com décadas de atraso, mas mais vale tarde do que nunca.
Que medidas serão essas capazes de pôr os portugueses a terem
filhos?
Não serão com certeza os cortes nos abonos de família, nos
subsídios de maternidade e nos benefícios fiscais da educação e saúde, os
aumentos dos impostos, o aumento do horário de trabalho na função pública, a
redução de dias de férias e feriados, e o desemprego jovem em níveis impróprios e a
imigração em grande escala de jovens, apenas para dar alguns exemplos bem
conhecidos. Certo também é que não se decretam filhos por lei e que sem aumento do rendimento mais filhos significaria para
muitos pais aumentar a pobreza.
Aguardemos com expectativa os trabalhos da comissão da
natalidade bem entregue ao Professor Joaquim Azevedo. Não tem tarefa fácil, faz-me
lembrar uma quadratura do círculo…