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sábado, 29 de março de 2008

Às vezes faz bem desabafar...

Não há dúvida que o mundo está todos os dias a ficar diferente. Um mundo diferente porque os Homens estão diferentes, mas também um mundo diferente que transforma os Homens.
Muitas coisas que se passam no mundo estão longe dos nossos olhos e não tomamos contacto com elas. Às vezes sabemos delas vagamente, mas não perdemos muito tempo a pensar nelas, não nos preocupam, não nos tiram o sono, talvez porque não interferem directamente no nosso caminho e não nos afectam especialmente ou talvez porque não está, pensamos nós, nas nossas mãos resolvê-las ou modificá-las. Acontece também que certas situações nos repugnam, constituem até um absurdo tal, que a nossa educação, cultura, os nossos referenciais éticos e morais barram-nos um entendimento racional. Outras vezes, o egoísmo encarrega-se de rejeitar a descodificação desses acontecimentos. Ficamos então muito admirados e surpreendidos. Confrontados com notícias que nos chegam sobre essas situações, às vezes ficamos até chocados, exclamando “como é que é possível”, “onde é que isto vai parar”, “que mundo é este que estamos a construir”!
Vem tudo isto a propósito de uma notícia com o título “Mães de aluguer são negócio…da Índia”.
Pois é, reza a notícia que 16.000€ é quanto um casal do “Ocidente” paga por uma barriga de aluguer na Índia. Este preço cobre despesas com cuidados médicos e intervenções; bilhetes de avião para duas viagens à Índia – uma para a fertilização e a outra para ir buscar o bebé. E conta a história de um “casal homossexual israelita que comprou um óvulo de uma dona de casa em Bombaim através da internet e alugou uma barriga. O embrião foi formado numa clínica de fertilidade indiana, especializada nesta modalidade de aluguer de barrigas para casais de todo o mundo.
Esta actividade está a tornar-se um negócio médico e insere-se no chamado turismo médico promovido pelo governo indiano. As entidades oficias indianas reconhecem esta actividade, fixando directivas “éticas” e técnicas segundo as quais é prestado o serviço de aluguer de barrigas. Para as mulheres indianas o aluguer de barrigas é uma actividade comercial da qual retiram o sustento da família e da casa.
Se do lado da oferte é isto que se passa, do lado da procura temos casais europeus e norte americanos que encomendam filhos pelo “correio” recorrendo ao serviço de aluguer de barriga, mediante o pagamento de um preço.
Ao tentar reflectir sobre tudo isto, o meu pensamento vai para as crianças "órfãs", vítimas de abusos, sem meio familiar, que vivem institucionalizadas aqui mesmo ao lado, no nosso país, e que não conseguiram crescer e receber os afectos de uma família, porque em muitos casos o Estado não se ocupou delas devidamente ou porque em alguns casos a sociedade não se interessou por elas.
Quando vejo por esse mundo fora milhões de crianças órfãs da guerra e da pobreza, abandonadas e mal tratadas, traumatizadas pela guerra, pela brutalidade, pela fome, pela falta de um berço e de uma família, pela ausência de afectos, sem passado, presente e futuro, questiono-me sobre as encomendas de filhos a barrigas de aluguer!

8 comentários:

Pedro disse...
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Anónimo disse...

Margarida:
Questões que invadem o nosso tempo e que são incontornáveis. São daqueles assuntos onde o "achismo" a que se referia o David Justino há dias, não serve.
Sinto muito a falta de debate sobre estes assuntos na sociedade portuguesa. E era importante que se trocassem ideias, que se publicitassem e partilhassem experiências e exemplos de vida.
Confesso que sobre qualquer destes assuntos gosto de ser ouvinte para mais tarde, esclarecidamente, poder participar com opinião consciente.
Ainda bem que traz estes assuntos ao blogue. Estimulam a razão porque são contributos para a discussão.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Paulo
Muito obrigada pelo seu contributo. Põe o dedo na questão da evolução do pensamento sobre as novas "éticas", condicionado pelas mutações genéticas, culturais, sociais, etc.
As novas "éticas", fruto de uma certa evolução da moral, colocam-nos perante novas realidades de e da vida que nos conduzem a avanços e recuos na sua aceitação ou rejeição.
Certo é que a evolução é marcada por quem se chega à frente, ainda que chocando o status quo, para mais tarde fazer doutrina e nos conduzir mais ou menos lentamente a aceitar e a entender essas novas realidades. Tratando-se de questões éticas há sempre o perigo de esses avanços não serem devidamente regulados com consequências perigosas que nos incomodam e que temos dificuldade em prever.

Caro José Mário
Também eu gostava de ir ouvindo e falando sobre estes assuntos. O caminho do "achismo" num ambiente em que as coisas estão efectivamente a acontecer não serve mesmo.
Estes assuntos são difíceis de tratar, mas de vez em quando lembrar a sua existência já é alguma coisa...

Pedro disse...
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Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Paulo
Esta matéria é de facto muito melindrosa. A reflexão que nos trouxe enriquece o seu debate. Tenho mais dúvidas do que certezas. Deixo aqui uma pequena reflexão que me ocorre fazer a propósito das "tradições éticas".
As decisões e os juízos éticos assentam em valores morais que reflectem as nossas convicções mais profundas sobre o que é o Bem (ou sobre o que é o Mal). No fundo a ética é detentora de uma certa verdade. A ética tem uma função fundamental na orientação da sociedade influenciando a lei que tem, por sua vez, um papel regulador de comportamentos.
A evolução da humanidade, em particular nas descobertas da medicina, levanta novos riscos e problemas que as "tradições éticas" de que nos fala o Caro Paulo não sabem ou têm dificuldade em descodificar. Mas à medida que a ética vai evoluindo, aceitando determinados padrões comportamentais até então impensáveis, impõe-se que a lei cuide das novas "éticas".
Podemos discordar, criticar, não aceitar essa evolução legislativa. Agora que as novas "éticas", que se prendem com os superiores direitos da vida e da pessoa (ser humano), devem ser reguladas pela lei, no quadro de um determinado quadro moral e ético, parece-me necessário, sob pena do desrespeito desses direitos tão fundamentais.

Pedro disse...
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Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Paulo
Vejo que teve um "lunch break" muito proveitoso. Obrigada por partilhar connosco a "lição".
Com efeito, como eu referia no meu último comentário, e pegando no caso concreto da "barriga de aluguer", as questões éticas terão sempre um peso importante quando estão em causa os superiores direitos da vida e da pessoa (ser humano). Mas como também podemos verificar, a Índia e muitos outros países e pessoas não comungam da mesma opinião do seu amigo médico e de muitas pessoas. São as novas "éticas" a funcionar!

Pedro disse...
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