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sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Estado de Citius


O clima de intriguismo e de conspiração em que o País está mergulhado, está a atingir niveis de paroxismo.
Há dias fiquei pasmado ao deparar-me com cópia de um despacho de uma senhora magistrada, que recebi por email, no qual, com base em argumentos inacreditáveis, se condenava o CITIUS - o programa de gestão electrónica dos processos nos tribunais comuns - porque, entre outras coisas, permitiria a ingerência de terceiros e até a alteração das decisões dos senhores juizes ou as peças dos senhores advogados. Mais espantado fiquei quando ontem verifiquei que esse despacho foi o rastilho para mais um bombástico ´caso´, com os habituais alarmes sindicais, honras de escândalo na TV e imediata chamada ao parlamento do ministro da justiça.
É legítimo que nestas ocasiões se pense se estas coisas acontecem porque entre nós existe a tendência para se valorizar tudo quanto soe a insídia ou escândalo mesmo quando não há escândalo algum; ou se, diferentemente, existem interessados em desestabilizar e inquietar sectores fundamentais da vida do País, como é o caso da justiça.
Há quase 4 anos que eu entrego as minhas peças processuais, consulto os processos e me relaciono com colegas ou com o Tribunal através de meios electrónicos, utilizando o SITAF - o correlativo do CITIUS para a jurisdição administrativa. Se críticas tenho a dirigir ao sistema, é ao seu funcionamento, à elevada taxa de indisponibilidade, à deficiente utilização por alguns tribunais. Mas não tenho qualquer dúvida que com ele se aumentou extraordinariamente a minha produtividade como advogado (já não sou tão definitivo em relação à produtividade dos tribunais). Porém, jamais me passou pela cabeça que, com as seguranças que o envolvem (aliás, bem mais apertadas no CITIUS), alguém o pudesse entender mais vulnerável do que os processos de papel, livremente manipuláveis por advogados, funcionários, magistrados e sei lá mais quem, alguns deles especializados ao longo dos anos em coser e descoser as linhas que solidarizavam os documentos que os constituiam...
Se a este movimento que pretende semear um novo escândalo a propósito da falta de segurança do CITIUS for reconhecida credibilidade, então acho melhor pormos em causa a segurança dos sistemas que gerem as nossas contas bancárias, as nossas relações com o fisco, as nossas comunicações com um número crescente de entidades, todas feitas através através de sistemas que têm sempre alguém por detrás capaz de conhecer os fluxos de informação que passam pela fibra óptica.

E já agora, não se descuidem com os carteiros, esses intemporais espiões...

5 comentários:

... disse...

Um parágrafo importante sobre a Justiça no El País
Ler: http://aoutravarinhamagica.blogspot.com/2009/01/do-freeport-casa-pia-e-justica.html

Sérgio de Almeida Correia disse...

Assino por baixo e ainda aplaudo.
O que já me aconteceu foi ter ido ao Sitaf ver um processo, encontrar lá a sentença que ainda não me tinha sido notificada e depois receber na volta do correio uma outra, parecida com a que eu lera, com menos 2 ou 3 parágrafos. Vá lá que o sentido final da decisão não mudou e que as alterações foram apenas em sede de fundamentação.
Depois, quando voltei ao Sitaf para verificar as páginas que eu tinha visto antes, percebi que tinham sido removidas e que a sentença que eu imprimira já lá não estava. Mas o "buraco" na numeração das páginas ficou. Creio que terá sido precipitação do magistrado na sua colocação on-line. De qualquer modo, isso não é nada que não seja ultrapassável e o sistema está, em regra, a funcionar bem.
Inadmissível é que nos processos que foram passados para as conservatórias (para quê se depois, na falta de acordo, é tudo remetido ao tribunal?), como ainda recentemente me aconteceu num de alimentos a maiores, não exista Citius.

Carlos Monteiro disse...

Caro Ferreira de Almeida,

As dúvidas dos magistrados dizem bem da preparação do povo português para lidar com inovação e novas tecnologias. Daí que somos o povo que mais horas trabalha e menos produz, porque literalmente, ninguém sabe o que anda a fazer, como funciona, o que se passa. Deparo-me com isso todos os dias na minha actividade.

Ou então é só para chatear.

Anónimo disse...

Meu caro Sérgio,
Os sistemas de destão electrónica têm ainda muitas debilidades,algumas resultantes de inconsistências ou de análise funcional incorrecta porque não traduziu bem as necessidades ou não as adaptou aos novos veiculos de informação e gestão da informação processual; outras derivadas de deficiente utilização dos novos meios.
Estamos no entanto no inicio de uma mudança substancial e é por isso natural que sejam precisos ajustamentos e melhorias.

Meu caro cmonteiro,
Tem absoluta razão. Ao gosto pela escandaleira, junta-se uma profunda ignorância. É depois fácil aproveitar a falta de conhecimento e instrumentalizar quem tem a suprema lata de a exibir em público.
Não é caso único, como diz e bem. Todos os dias tropeçamos em resistências deste tipo, sobretudo quando a mudança, não permite mais esconder ou sequer disfarçar os constrangimentos ao funcionamento da máquina da justiça, designadamente baixas produtividades que deixam de poder ser explicadas pela tramitação do papel. O problema levanta-se, suspeito, também por isso.

Suzana Toscano disse...

Acho que a psicose também já chegou às tecnologias.O melhor é desconfiarmos da prórpia sombra...