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quinta-feira, 14 de julho de 2005

Use a fita métrica...


Venus de Willendorf
A obesidade constitui um grave problema nos nossos dias. Apesar de sabermos muito sobre a associação com diversas patologias, mesmo assim, somos confrontados com situações não perfeitamente esclarecidas. Provavelmente há obesos e obesos. Ou seja, se a probabilidade de ocorrer diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e certas formas de cancro é muito mais elevada na população de obesos, tal não significa que todo o obeso corra o risco de vir a sofrer daquelas maleitas. Para já aponta-se o sexo. Os obesos têm pior saúde do que as obesas. Os homens obesos apresentam menor vigor físico e têm menos capacidade de metabolizar os açúcares. A distribuição da gordura corporal apresenta diferenças consoante o sexo. No homem deposita-se mais a nível abdominal e na mulher mais a nível da cintura e do rabiosque. Elas queixam-se da tendência para acumular gorduras naqueles sítios, facto que tem a ver com a necessidade de armazenar gordura devido à sua função reprodutora.
A crescente obesidade, sobretudo feminina, começa a originar problemas de auto-estima. No Reino Unido só um por cento das mulheres está satisfeita com a sua silhueta. Nove em cada dez dizem-se deprimidas e 80% chegam a desesperar quando pensam no seu peso. Apontam várias razões, tais como atitudes discriminatórias por parte da sociedade, a pressão do governo para que percam peso e a postura de celebridades. A própria campanha contra a obesidade origina uma carga constante de críticas, além de que os obesos nunca foram tão atacados como agora. A época não é nada boa para quem tenha problemas de peso. Claro que a indústria do tratamento da obesidade está em crescendo. É um bom negócio e neste momento deverá ser difícil quantificar os inúmeros profissionais que ganham a vida à custa da gordura dos outros. A gordura vale mesmo ouro. É só uma questão de saber explorá-la.
Entre nós estão a decorrer alguns estudos sobre a obesidade e o excesso de peso. Uma das formas de os avaliar é medindo o perímetro abdominal. Pois é! No futuro, em vez de andarmos a martirizar as balanças com os nossos pesos, vamos rapar de uma fita métrica e medimos a barriga. Deste modo, podemos avaliar se estamos dentro ou fora dos valores já definidos. No caso das mulheres o limite aceitável é de 80 cm, ao passo que nos homens pode chegar aos 94 cm.
Os resultados preliminares dos estudos não são nada abonatórios para os portugueses, ou melhor para as portuguesas! Aliás seria de esperar que tal acontecesse, basta para isso, utilizar a fita métrica dos nossos olhos no espaço abdominal deixado a descoberto, na sequência da moda em vigor, pela grande maioria das jovens e adultas…

Em tempo de férias e em qualquer tempo

Mar sonoro

Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim,
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho,
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.

Sophia de Mello Breyner Andresen (Dia do Mar, 1947)

Ainda a Matemática

Confesso ter imaginado uma experiência que nunca consegui concretizar: gostaria de escolher aleatoriamente 100 alunos de 14-15 anos de idade e outros tantos pais, desses mesmos alunos, e a cada uma das 200 criaturas distribuir o teste de exame de matemática do 9.º ano. Era bom saber qual seria o desempenho comparado dos dois grupos etários, mesmo sabendo que se trata de uma disputa desigual.
Talvez após o apuramento dos resultados alguns saudosistas e defensores da ideia da ignorância dos nossos alunos mudassem o tom do discurso.
Enquanto não há uma instituição que concretize a experiência, sugiro que o leitor se dirija aqui e tente responder às perguntas do dito teste. Se a experiência lhe disser alguma coisa regresse ao 4R e deixe o seu comentário.

Equações ou mistérios?

É realmente triste esta constatação, ano após ano, dos resultados lamentáveis a matemática, sem que pareça haver capacidade para se modificar o que quer que seja que está mal. Há a teoria da genética, de que fala, ironicamente, aqui no blog o David Justino e, se calhar, é a que mais se adequa ao espírito lusitano. Mas ser fatalista ou conformista é muito grave quando se trata de condenar gerações sucessivas a não poderem, simplesmente, escolher a profissão em que se poderiam realizar e a reduzir o mercado de trabalho a um leque monocromático de ofertas... Quantos jovens deixam de ser engenheiros ou economistas só porque não puderam ter explicações de matemática até recuperarem o que deviam ter aprendido? E quantos se convencem de que são pouco inteligentes ou uma desilusão para os pais porque têm sempre más notas à disciplina "difícil"?
É por isso de inteira justiça referir aqui que a Ministra da Educação falou sobre o assunto com frontalidade e muita clareza, dizendo que, no meio de tantas dúvidas, devíamos pelo menos ter uma certeza firme: a de que o defeito não está nos nossos alunos, que as crianças portuguesas não são seguramente menos capazes ou menos dotadas do que as outras. Essa desculpa não serve.
O que é absurdo é que esta verdade cristalina tenha que ser afirmada e seja notícia, exactamente porque é de uma sensatez pouco comum...
Resta-nos agora a esperança de uma actuação consequente, sem promessas de milagres instantâneos ou ameaças demolidoras que já ninguém se dispõe a levar a sério. Para variar, poderíamos ter um plano de actuação sensato, realizável, persistente, que recupere a confiança dos pais e dê alento aos educadores. Não haverá milagres, mas será que não há remédios?

quarta-feira, 13 de julho de 2005

Afinal, é genético...um pouco mais

Permitam-me que retome o tema do "post" anterior por duas razões principais:
1. A origem da "Tese" pode ser melhor identificada através de algumas entrevistas que circulam por alguns órgãos ditos especializados. Por especial carinho e atenção escolhi uma entrevista concedida a uma publicação do Sindicato dos Professores da Região Centro, presidido pelo Prof. Mário Nogueira. Para além das ideias originais sobre educação, ficamos também a saber que o Dr. Nelson Lima é doutorado em "Investigação Psicológica" pela "Bircham University", uma universidade de ensino à distância que tem a sua origem na Nova Zelândia.
2. A "Tese" em si merece alguma atenção, mas dado que o domínio é o das neurociências não me sinto à vontade para fazer qualquer comentário. Mas há algo que eu consigo pensar relativamente à tese e que gostaria de partilhar convosco. Nos vários estudos PISA o desempenho dos alunos portugueses a matemática, a nível regional, é bastante diferenciado: enquanto que os alunos da Região de Lisboa e Vale do Tejo tem classificações médias idênticas às da média dos países da OCDE, os alunos da Região do Alentejo tem resultados muito mais fracos e os das Regiões Autónomas dos Açores ou da Madeira, ainda mais fracos. Conclusão: a tese do condicionamento genético não se aplica aos alunos da RLVT, mas já se aplica aos do Alentejo ou da Madeira. Será sssim?
Não quero tirar conclusões precipitadas, mas a "tese" não me "cheira bem". Há para aí umas ciências...

Afinal é genético...

Mais tarde ou mais cedo a tese teria que surgir: a maior ou menor atracção pela matemática é determinada pela genética. Ficam assim explicados os maus resultados dos alunos portugueses na disiciplina. A tese vem daqui e bem gostaria de saber qual a metodologia científica que a sustenta. Não haverá entre os leitores do 4R quem esteja capacitado para esclarecer a valia científica da explicação?

terça-feira, 12 de julho de 2005

Exames do 9.º ano

Os resultados dos exames do 9.º ano foram maus, especialmente a Matemática. Nada surpreendente, diga-se. Há dois tipos de atitudes possíveis que são de rejeitar: invocarmos "desculpas de mau pagador" ou ligarmos a "carpideira nacional". Ambas dificilmente resolverão o problema. A única atitude a tomar é a de tentar e trabalhar para que os resultados no próximo ano sejam melhores. Para que tal aconteça há que reconhecer que é preciso trabalhar mais e melhor e modificar a atitude perante os alunos: se exigirmos pouco, eles dão pouco; se exigirmos muito eles dão muito. Não vale a pena continuarmos a tratar as novas gerações como se fossem criaturas frágeis e carentes de protecção. Esse tem sido o mal do nosso sistema de ensino de há muitos anos.
Da parte do Ministério da Educação há que reflectir sobre o que é o actual 3.º ciclo do ensino básico. Quando em cada ano se dispersa o esforço por dezena e meia de disiciplinas, leccionadas por outros tantos docentes, há que reconhecer que se trata de uma dispersão pouco benéfica ao sucesso dos alunos. Mais vale centrar o esforço num conjunto de saberes estruturantes do que o dispersar por um leque vasto de disiciplinas. A Matemática é das disiciplinas que mais é afectada por esta dispersão e os resultados estão à vista.

Tremendismo Semântico

O Prof. Adriano Moreira, no programa Prós e Contras desta noite, usou a expressão que agora uso como título deste post para ilustrar o abuso das palavras para qualificar acontecimentos que deviam merecer a nossa atenção mas que são desvirtuados, na sua dimensão ou no seu significado, pela força excessiva do vocabulário utilizado.
No caso concreto, referia-se ao "arrastão" da praia de Carcavelos, depois envolvido em dúvidas sobre a sua dimensão e, por fim, tenuemente apresentado como um episódio que afinal não teria merecido tão grande alarido. Mas o mal estava feito. A palavra distorceu o acontecimento e, o que é mais grave, ocultou com o seu falso dramatismo o fenómeno que devia ter merecido reflexão cuidada e serena - a inquietação nascente entre os imigrantes, a desconfiança crescente sobre os seus perigos, enfim, a necessidade de se encontrarem as medidas mais adequadas ao acolhimento e inserção social dos que procuram trabalho em Portugal e as regras que têm que ser estabelecidas para que esse movimento se faça com o devido controle.
A palavra tem um papel a desempenhar e não pode ser usada como quem atira pedras ou consegue efeitos bombásticos. Tem que estar suportada em informação, em estudo, em reflexão. E depois pode então ser proferida.
O tremendismo semântico invadiu os nossos jornais, sustenta discursos políticos, colonizou o nosso pensamento. Impede o juízo claro e mina a confiança, pois tudo aparece carregado de cores escuras para logo desaparecer dos écrans da novidade, deixando apenas um rasto de temor, de dúvida, sem que se consiga avaliar de facto o que é que afinal nos queriam dizer. Talvez não nos queiram dizer, talvez nos queiram fazer crer, as palavras que não são usadas com seriedade não querem comunicar mas manipular.
Ouvir o Prof. Adriano Moreira em debate com o Prof. António Barreto devolve-nos o gosto pelas palavras claras, sabedoras e preocupadas em comunicar, em transmitir, dando espaço a quem ouve para escolher o seu campo e formular o seu juízo.
Um lição rara mas que ainda é, felizmente, possível.

segunda-feira, 11 de julho de 2005

Acusação grave

A declaração do Grupo Espírito Santo em que anuncia o corte de relações comerciais com o Grupo Impresa (Balsemão, SIC, Expresso, etc.) devido a uma invocada "campanha de perseguição" dos media deste grupo é de extrema gravidade. «Enquanto os órgãos de comunicação social da Impresa persistirem na violação da Lei de Impresa e dos princípios e valores éticos do jornalismo, o GES corta todas as operações e relações comerciais com aquele grupo editorial à medida que se cumprirem os prazo contratuais acordados para as operações», declarou o grupo financeiro.
A defesa pronta não esclarece muito. Ambas deixam no ar a suspeição quanto a critérios editoriais sujeitos a critérios comerciais. Aguardemos mais desenvolvimentos.

Castração

A notícia de que a Liga do Norte, partido de extrema-direita da Itália, apresentou um projecto de lei com o objectivo de castrar os condenados por violação arrepiou-me e fez recordar três momentos da minha vida. A primeira reporta-se à castração de um porco. Era pequeno e costumava brincar junto da oficina do Zé Ferrador. O homem assustava. Com toda a sua imponência tonitruante arranca uma crina de cavalo laça os testículos do animal, os quais, num ápice, desapareceram. Os gritos do animal ecoavam pelas redondezas. Arrepiei-me todo! A outra foi um colega da escola que na brincadeira com uma cana, ao cortá-la, fez voar um testículo. Vá lá que ainda ficou com o outro! A terceira foi um filme sobre Pedro o Cru que castigou um adúltero, mandando-o castrar. A cena também é de arrepiar quando se ouviram os ditos cujos a cairem num vaso de metal.
É do conhecimento geral que este órgão produz hormonas capazes de condicionar várias funções assim como o comportamento. Mas, ir ao ponto de tentar modificar o comportamento, “normalizando-o”, através da sua extirpação cirúrgica parece-me excessiva e, até, atentatória dos direitos humanos, sobretudo, atendendo às enormes capacidades de intervir hoje em dia. Esta proposta é fundamentada com o argumento de que “é necessária para remover uma doença social que é uma ameaça à vida e à segurança pública”. Se utilizássemos este argumento para muitas outras doenças sociais que são também ameaças à vida e à segurança pública, ainda acabaríamos por encontrar os respectivos equivalentes à castração. Verdadeira esquizofrenia política! E, a propósito de esquizofrenia, veja-se o que ocorreu na Roménia quando uma freira, muito provavelmente esquizofrénica, acabou por ser crucificada numa sessão de exorcismo por um padre que não está arrependido. Foi pena o padre não ter frequentado o curso de exorcismo, no prestigioso Athenaeum Pontificium Regina Apostolorum, da Universidade do Vaticano, assim evitaria um mau diagnóstico e uma escabrosa terapêutica.
Espero que a Liga do Norte não proponha legislação sobre os “possuídos” pelo demónio. Senão, ainda podem advogar alguma forma de crucificação.

sábado, 9 de julho de 2005

Lugares onde há (mesmo) magia pelo ar



India. Agra, Taj Mahal ao por-do-sol.
Para além da lenda, sente-se a magia do lugar. E uma luz fantástica!

Áreas Protegidas - VIII - Reserva Natural do Paul de Arzila



Acordei sem vontade de ler ou ouvir sobre terrorismo, crise, guerra, cimeiras. Morte e dor. Eleições e referendos, governo, oposição. Impostos, reivindicações, greves.
Boa disposição para me defender da agressão quotidiana da notícia deprimente e regressar à memória de que há coisas que nos fazem sentir bem, coisas belas. Coisas que convocam palavras que ainda constam do vocabulário: paz, cor, equilíbrio, tranquilidade, harmonia. Vida.
Regresso assim à lembrança das áreas protegidas, esquecidas deste blog desde Maio passado.
Esta fica para os lados de Coimbra, na bacia do Mondego. Mais concretamente, nos concelhos de Condeixa, Montemor e Coimbra. Constitui um dos biótopos que restam do imenso corredor biológico do vale do Mondego e integra a rede nacional de áreas protegidas com o estatuto de reserva natural desde em 27 de Junho de 1988.
Pequena mas significativa área do ponto de vista conservacionista, quase toda ela, senão mesmo toda, propriedade privada, foi salva na década de setenta - ao que me dizem - das acções de drenagem que condenariam o valiosíssimo acervo biológico ali existente.
Integra a rede de sítios da Convenção de Ramsar, tratado internacional marcante de uma nova fase do direito e da política internacionais de ambiente e de conservação da natureza que visa garantir protecção às zonas húmidas de importância ecológica. Recorde-se que estas zonas, que representam menos do que 6% da superfície do planeta, são responsáveis por 50% dos stocks biológicos.
A Reserva Natural do Paúl de Arzila serve de habitat a exemplares de fauna raros, com destaque para a lontra. São avistáveis qualquer coisa como 120 espécies de aves que aqui se alimentam, se abrigam e se reproduzem.

sexta-feira, 8 de julho de 2005

Branquear o terrorismo

Não pode ter outra leitura o comentário de Joana Amaral Dias. A tese resume-se na frase: “O terrorismo islâmico não foi criado pela guerra no Iraque mas foi, indubitavelmente, alimentado por ela”. Não se sabe o que se entende por “alimentado”, mas Joana Amaral Dias socorre-se de estatísticas da BTCNews para constatar o facto de os atentados terroristas terem triplicado entre 2000 e 2004. A tese está confirmada, o “erro de Bush” comprovado. Esquece-se entretanto que os níveis de 2004 são pouco superiores aos de 1995 - sem Bush -, que pelo meio houve uma coisa chamada “11 de Setembro de 2001” e que o número de atentados já estava a aumentar antes da ocupação do Iraque.

A pergunta que se deve colocar é outra: se não houvesse intervenção aliada no Afeganistão e no Iraque, nem o reforço das medidas de segurança nos países ocidentais, o número de atentados terroristas teria sido maior ou menor? E que locais eles escolheriam enquanto nós esperávamos pela morte à esquina da rua?

O que Joana Amaral Dias não perdoa a Bush é a pacificação do Afeganistão e o derrube do regime Talibam. Não lhe perdoa o derrube de Saddam nem os pequenos avanços no Médio Oriente. O que Joana Amaral Dias está a sugerir implicitamente é que sem Bush e sem intervenção aliada estaríamos muito mais seguros.

Só tenho uma certeza: viveríamos com mais medo e seríamos menos livres sem que com isso pudéssemos evitar mais ataques terroristas.

Os assassinos de Londres já definiram os seus próximos alvos: “Continuamos a avisar os governos da Dinamarca e da Itália e todos os cruzados de que vão ser punidos do mesmo modo, se não retirarem as suas tropas do Iraque e do Afeganistão. Quem avisa está perdoado” (excerto final da suposta mensagem da Al-Qaeda). Quem quer continuar a branquear o terrorismo?

Antidepressivos e ataques cardíacos


Heart attack
Scientific American Magazine (May 2002)



Foi verificado, num estudo recente, que os doentes que tinham tido um ataque cardíaco e que foram sujeitos a medicação antidepressiva viviam mais tempo. Apesar do estudo não ter sido desenhado com este propósito, os dados revelam aspectos positivos, já que há uma diminuição do risco de um segundo enfarte. Aliás é perfeitamente compreensível que a depressão ocorra após um acidente deste tipo.
Já anteriormente se tinha verificado que a depressão constituía um factor de risco para os ataques cardíacos e que a prescrição de certos antidepressivos poderiam ter um efeito protector.
Segundo a OMS a depressão vai ser a segunda causa de morbilidade a nível mundial no ano 2020. Em Portugal os valores apontam para uma prevalência de 5 a 8% de acordo com a região.
A problemática do consumo dos antidepressivos, entre nós, está a atingir valores preocupantes. Os dados do Infarmed e de outros autores apontam para um crescendo assustador nos últimos anos, de tal modo que, segundo o próprio Director-Geral de Saúde, estamos perante um problema de saúde pública, que, urge resolver.
Resta saber até que ponto os factores sociais e ambientais constituem ou não factores de risco para o seu aparecimento. O aumento da prescrição tem de ter explicações. Não são só os factores de facilidade e de maior acessibilidade a estes produtos as únicas explicações. Haverá igualmente outras que poderão contribuir para esta “epidemia”.
Claro que, com tanta gente a tomar antidepressivos, ainda nos arriscamos a poluir o meio ambiente, já que podem alcançar os rios e o sistema de água através do tratamento dos esgotos. A este propósito, no ano passado um estudo britânico permitiu encontrar Prozac na água de bebida. Imediatamente, os responsáveis pela saúde desvalorizaram os dados, afirmando que a substância estava fortemente diluída, embora os ambientalistas tivessem solicitado uma investigação urgente sobre o assunto.
Lá como cá também tem ocorrido um aumento do número de receitas médicas de antidepressivos. Só entre 1991 e 2001 o número passou de 9 milhões para 24 milhões! Entre nós, de 1995 a 2001, o consumo total de antidepressivos teve um incremento notável, com um aumento de 102,8% no número de embalagens dispensadas.
A situação económica e social em Portugal pode constituir um factor de risco em termos de depressão. A expressão de que os portugueses andam “deprimidos” não abona nada de bom. Provavelmente iremos continuar a assistir a um aumento do consumo destes fármacos.
Em termos ambientais, a contaminação da água poderá não ter um grande efeito na nossa saúde, devido ao efeito diluidor, mas, quem sabe se não irá afectar o comportamento dos peixinhos, dos anfíbios e de muitos outros animais, tornando-os mais “desinibidos” ou com tendências “suicidas”…





quinta-feira, 7 de julho de 2005

Previsível

Quando em post anterior reagia aos atentados de Londres fiquei curioso quanto aos comentários e reacções dos partidos políticos, especialmente os de esquerda.
Se há a saudar a dignidade da intervenção de Luís Fazenda (BE), já o PCP não resistiu a espetar o ferrão anti-imperialista e, na prática, a reverter para os EUA a responsabilidade do terrorismo. Para que conste:

"O PCP manifesta a mais viva condenação pelo brutal atentado que teve lugar hoje, ao início da manhã em Londres, em hora e locais de grande circulação e de deslocação para locais de trabalho.
Recordando a sua inequívoca posição, de sempre, de condenação de todas as formas de terrorismo e dos objectivos que serve, o PCP manifesta aos trabalhadores, ao povo inglês e às famílias das vítimas uma palavra de solidariedade.
Perante estes trágicos acontecimentos, ocorridos num momento em que decorre na Escócia a «cimeira do G-8», o PCP alerta para as tentativas do seu aproveitamento para justificar a violação de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, a política de agressão imperialista e as suas guerras de ocupação, em si mesmo factores de alimento do fundamentalismo e do terrorismo."

Quanto às declarações de Mário Soares à TSF (não há link, mas ouvi-as bem) são igualmente lamentáveis: o terrorismo é resultado da pobreza e da miséria que existe no mundo.

Estranha sensação

Enquanto cotejo na “net” as imagens de Londres ainda atónita e chocada pelos atentados terroristas, continuo a ouvir pela rádio as acusações banais e mesquinhas do debate entre o Governo e a Oposição.

Eles estão a falar para quem?

Os nossos deputados conseguem associar o silêncio resignado perante o horror ao vazio banalizado do debate político inconsequente.
Que estranha sensação.

Londres, o regresso do terror



Londres despertou pela morte e pelo terror. Depois de Nova York e Madrid, concretizou-se o que de há muito se temia. Não pode haver "mas" nem "talvez", a opção não deixa margem para dúvidas: tirania ou liberdade.

quarta-feira, 6 de julho de 2005

A parábola do fariseu

"Propôs Jesus esta parábola a uns que confiavam em si mesmos, como se fossem justos, e desprezavam os outros. Subiram dois homens ao templo para orar: - um fariseu, e outro publicano. O fariseu orava de pé, e dizia assim: Graças te dou, ó meu Deus, por não ser como os outros homens, que são ladrões, injustos e adúlteros. E não ser também como é aquele publicano. Eu, por mim, jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de tudo quanto possuo. Apartado a um canto, o publicano nem sequer ousava erguer os olhos para o céu; batia no peito, e exclamava: Meus Deus apiedai-vos de mim, pecador. Digo-vos, acrescentou Jesus, que este voltou justificado para sua casa, e o outro não, porque todo aquele que se exalta será humilhado, e todo aquele que se humilha será exaltado." (Lucas, 18:9-14).

A parábola do fariseu e do publicano tem inúmeros ensinamentos, mas se a trago a este "ponto de encontro" é porque não me ocorre nada mais ilustrativo do que me parece que tem vindo a acontecer, insensivelmente, na vida política nacional.
Não está em causa a necessidade absoluta de se imporem critérios de credibilidade ou de respeitabilidade na vida pública, como o combate à corrupção ou a exigência de condutas íntegras, nem isto se confunde com o que agora refiro.
Se repararmos com atenção no sentido de muitos discursos, mais e menos recentes, e na atitude de quem se apresenta ao eleitorado, foi-se substituindo a apresentação de ideias e a crítica leal aos opositores pelo recurso à avaliação moral.
A atitude farisaica, a soberba dos que ousam apresentar-se como detentores de uma superioridade moral que, julgam , deverá merecer só por si a admiração e o favor daqueles a quem se apresentam, tem ganho um relevo crescente no dia a dia e distorce de forma intolerável o que deveria ser um debate franco e aberto, duro ou moderado, mas sempre num plano de igualdade moral.
Os "bons" e os "maus" ocuparam o lugar dos que governam bem ou governam mal (conforme a perspectiva), o debate resvala subtilmente para o confronto entre atitudes. Não se fazem propostas de acção porque trazem mais progresso e justiça social do que outras também possíveis, mas porque se fundamentam na "consciência" e são ditadas por "imperativos morais". É um caminho perigoso e profundamente desanimador para quem ouve, porque as pessoas querem confiar em quem saiba fazer e e explicar porque decidiu e não optar entre o "justo" e o "pecador".

Só o Presente é Verdadeiro e Real


"Um ponto importante da sabedoria de vida consiste na proporção correcta com a qual dedicamos a nossa atenção em parte ao presente, em parte ao futuro, para que um não estrague o outro. Muitos vivem em demasia no presente: são os levianos; outros vivem em demasia no futuro: são os medrosos e os preocupados. É raro alguém manter com exactidão a justa medida. Aqueles que, por intermédio de esforços e esperanças, vivem apenas no futuro e olham sempre para a frente, indo impacientes ao encontro das coisas que hão-de vir, como se estas fossem portadoras da felicidade verdadeira, deixando entrementes de observar e desfrutar o presente, são, apesar dos seus ares petualentes, comparáveis àqueles asnos da Itália, cujos passos são apressados por um feixe de feno que, preso por um bastão, pende diante da sua cabeça. Desse modo, os asnos vêem sempre o feixe de feno bem próximo, diante de si, e esperam sempre alcançá-lo.

Tais indivíduos enganam-se a si mesmos em relação a toda a sua existência, na medida em que vivem ad interim, até morrer. Portanto, em vez de estarmos sempre e exclusivamente ocupados com planos e cuidados para o futuro, ou de nos entregarmos à nostalgia do passado, nunca nos deveríamos esquecer de que só o presente é real e certo; o futuro, ao contrário, apresenta-se quase sempre diverso daquilo que pensávamos.
O passado também era diferente, de modo que, no todo, ambos têm menor importância do que parecem. Pois a distância, que diminui os objectos para o olho, engrandece-os para o pensamento. Só o presente é verdadeiro e real; ele é o tempo realmente preenchido e é nele que repousa exclusivamente a nossa existência. Dessa forma, deveríamos sempre dedicar-lhe uma acolhida jovial e fruir com consciência cada hora suportável e livre de contrariedades ou dores, ou seja, não a turvar com feições carrancudas acerca de esperanças malogradas no passado ou com ansiedades pelo futuro. Pois é inteiramente insensato repelir uma boa hora presente, ou estragá-la de propósito, por conta de desgostos do passado ou ansiedades em relação ao porvir".

Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'