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sábado, 31 de outubro de 2009

As "metades" do País...

No Dia Mundial Poupança surgem duas notícias aparentemente contraditórias. Mas não são. Apesar das boas notícias sobre a melhoria da taxa de poupança nacional registada desde 2008, invertendo o movimento contrário que se verificou entre 2003 e 2007, a má notícia é que, segundo li no jornal i, 48% dos portugueses não têm se quer 1.000 euros de rendimento para fazer a uma despesa súbita. Sim, 48%. Sim 1.000 euros.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística a taxa de poupança dos portugueses subiu em 2008 para 6,4% e no primeiro trimestre de 2009 para 8,6%.
Com efeito, a crise financeira e económica trouxe a estagnação dos preços e uma acentuada descida das taxas de juro com impactos positivos no rendimento disponível de uma parte da população.
Em tempo de crise é normal que as famílias mudem os seus comportamentos, sendo mais precavidas e cautelosas, resfriando hábitos consumistas e colocando de parte algum dinheiro para fazer face a uma eventualidade como, por exemplo, o desemprego.
Os portugueses desde há muito que tinham abandonado hábitos de poupança - Portugal registou durante muitos anos uma das melhores taxas de poupança da Europa - preferindo consumir e recorrer ao crédito sem fazerem contas à capacidade de endividamento e sem pensarem no dia de amanhã. Agora vai sendo tempo de percebermos que o endividamento não cresce até ao céu e que é preciso poupar e ajustar os padrões de vida ao rendimento disponível e à situação económica do País.
Mas se há portugueses que ainda conseguem poupar, parece que cerca de metade do país não tem uma pequeníssima reserva de dinheiro – 1.000 euros - para fazer face a uma despesa extraordinária. É uma realidade triste que atesta bem os nossos precários níveis de bem estar e elevados níveis de pobreza.
E é, também, esta metade do País que, pelas piores razões, continua a recorrer ao crédito ao consumo, ainda que para tal tenha que pagar, apesar da descida das taxas de juro, mais de 20% de juros anuais. Um círculo vicioso e perigoso que vai ser muito difícil de resolver...

8 comentários:

Bartolomeu disse...

Poupar, cara Drª Margarida, é um "conceito" que exige espírito de sacrifício, sobretudo para aqueles a quem o vencimento só é suficiente para fazer face às despesas fixas do agregado famíliar.
Para esses, poupar, exige que consigam dizer não aos pedidos dos filhos que desejam um brinquedo, ou uma peça de vestuário de marca. Exige dizer não a um desejo adiado de compra de um electrodoméstico para substituir um outro já quase a "dar o berro". Exige que o fim de semana fora, já ha tanto tempo desejado, fique para mais adiante. Em muitas situações exige que o jantar romântico, com a esposa que todos os dias chega exausta por mais um dia aziago de trabalho e ainda vai ter de dar a volta a uma quantidade tarefas domésticas, seja remetido para a gaveta do "um dia será".
Em resumo, a vida actual, mesmo dos menos abonados, exige um gasto, uma despesa que pouca ou nenhuma margem deixa livre para que se possa pensar num aforro. E, conseguir colocar "de lado" todos os meses, algum dinheiro do vencimento, para além de exigir um forte espírito de sacrificio, exige ainda que o "poupador" possua fortes dotes de magia.
Longe vão os tempos, em que as famílias, mesmo as mais modestas conseguiam aforrar, mesmo que fosse muito pouco, esse muito pouco sujeitáva-se inteiramente à máxima:grão-a-grão, enche a galinha o papo. E assim era, em boa verdade!

jotaC disse...

Cara Dra. Margarida Aguiar:

Por acaso fiquei surpreso com a notícia...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Bartolomeu
O espírito de sacrifício perdeu-se com o espírito consumista que se instalou. O facilitismo de tudo alcançar e obter, a satisfação do desejo imediato, o viver hoje tudo como se o amanhã acabasse já hoje deixaram para trás a noção da necessidade de também fazer poupança, de acautelar o amanhã e de planear o futuro.
Num contexto de crise económica, o medo das dificuldades, o receio do desemprego ou de uma doença grave estão a levar as pessoas a colocar de parte algum dinheiro. É uma mudança muito importante de comportamento que a crise pode ajudar a sedimentar.
O que me admirou foi, apesar do rendimento baixo dos portugueses e do elevado nível de endividamento, o aumento apreciável da taxa de poupança. Por cada 100 euros de rendimento, as famílias portuguesas estão a poupar 8,60 euros.
Poupar é fundamental em qualquer economia doméstica. Mas não só, é também fundamental na economia nacional. O Estado também deveria poupar e dar o exemplo.

Caro jotaC
Qual das duas notícias o surpreendeu mais? A primeira "metade" ou a segunda "metade"?

jotaC disse...

...esta cara Dra. Margarida Aguiar:

"Segundo o Instituto Nacional de Estatística a taxa de poupança dos portugueses subiu em 2008 para 6,4% e no primeiro trimestre de 2009 para 8,6%."

jotaC disse...

...Mas talvez a explicação dada ao Bartolomeu (li agora), seja a razão pela qual aqueles portugueses fizeram subir o indicador de poupança, embora isto não signifique rigorosamente que sejam aqueles que ainda recebem o salário mensalmente a influir nesta situação. Seria interessante conhecermos o nível médio dos salários destes aforristas, para aferirmos melhor da miséria da outra parte.

Só para terminar quero espelhar aqui o meu espanto sobre as notícias que nos chegam sobre corrupção, dizendo o seguinte:
-Num País em que - altos quadros de E.P “precisam” de receber uns trocos por fora para se aguentarem, como é possível ao cidadão dos € 600/mês poder amealhar!
;)

Pedro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Suzana Toscano disse...

É capaz de não ser só enquanto não há crédito para as casas, caro paulo, admito eu, que também não sou economista, mas deve resultar da enorme incerteza sobre se é ou não o momento de comprar porque ameaçam dia sim dia não com a subida dos juros. O que, associado ao risco de desemprego, é de desanimar qualquer um de gastar o pouco que tem. Também vi essa notícia, Margarida,de que a maior parte nem mil euros tem de parte, isso condiz com o que já se dizia sobre o nível de endividamento das famílias ser perto dos 100%, apesar de há pelo menos 10 anos que ouço alertas para isso. Mas esta é uma sociedade de consumo frenético, quem não tem não existe ou é retrógrado, e quem não se endividou se calahr o que tem no banco não daria hoje para quase nada. Era assim em todo o mundo ocidental, acho eu, como se viu com a crise. Será que vai mudar? Duvido muito.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro jotaC
Não disponho de elementos. Ainda fiz alguma pesquisa mas não encontrei resposta.

Caro Paulo
Confesso-lhe que não sei responder com rigor à sua questão.
Seria interessante saber quem são os aforradores e qual a relação entre a evolução do nível do endividamento das famílias e da redução do serviço da dívida e a evolução do nível de poupança.

Suzana
Tendo a concordar consigo. Perante a crise a reacção é de cautela e as pessoas põem algum dinheiro de lado por precaução. Há uma espécie de adormecimento do consumo frenético. Mas logo tardará a acordar. As memórias são curtas...