Pediram-me para fazer uma conferência sobre a diabetes. Mais uma. Deram-me, novamente, liberdade para escolher o tema. Pois é! Quanto maior é a liberdade maior é a responsabilidade. Para não cair em lugares comuns, costumo enveredar por temas polémicos e especulativos. É excitante construir perguntas para podermos responder, nós ou os nossos descendentes. E foi o que fiz, uma abordagem entre “Poluição, infeção e diabetes”, tentando descortinar nos reversos das medalhas as belezas “escondidas”. Elas estão lá!
É preciso recordar que a diabetes não é apenas uma doença do metabolismo, é antes de mais o filme da nossa vida, do nosso passado, do nosso presente e que promete revelações impensáveis no futuro.
O texto é longo. Por esse motivo vou “enfiá-lo” no “O Quarto da República”.
Passo a transcrever apenas os primeiros parágrafos:
O conceito segundo o qual a maior facilidade em conservar a energia está na base da obesidade e, consequentemente, da diabetes está devidamente estabelecido a nível científico, começando agora, inclusive, a ser compreendido pela população ou pelo menos por parte dela, nomeadamente a mais culta.
Ultrapassar as inúmeros crises de fome à custa de processos genéticos, frutos da evolução, parece ser uma forma razoável, e com muitos bons resultados, expressos na nossa continuidade como espécie.
Se nos reportarmos à época industrial, verificamos que foi neste preciso momento que ocorreram transformações radicais no nosso modo de viver, não só a nível biológico, mas também cultural, técnico-científico e, sobretudo, político. Num ápice tudo se transformou. Acabou o ancien regime, as sementes da democracia começaram a ser lançadas à terra, a organização social modificou-se com base na tríade cantada pela marselhesa, a justiça autonomizou-se, as constituições começaram a proliferar, o poder absoluto entrou em declínio e os direitos do homem emergiram com toda a beleza criativa. Entretanto, as conquistas técnico-científicas revolucionaram ainda mais as sociedades. Inicialmente chegaram a ser fonte de riqueza para poucos e de morte para muitos. Polos de atração fomentaram as zonas urbanas, despovoaram os campos, geraram conflitos e acabaram por acelerar o progresso, embora com vertentes muito negativas das quais se destacam as doenças profissionais, a invalidez e a morte prematura. Em termos ambientais começou-se a assistir a um dos mais terríficos fenómenos antropológicos: a poluição a todos os níveis. Nunca a humanidade tinha sido sujeita a tamanhas agressões ambientais quer a nível da água, do ar, dos solos, dos alimentos e, até, da própria alma.
Fome aliada à poluição, más condições das habitações, resistências diminuídas e focos de infeções geraram doenças e mais doenças dentro das quais destaco a tuberculose. Apesar de ter sempre existido, mesmo antes do homem aparecer, esta doença começou a expandir-se de forma ímpar e pandémica neste período. A peste branca fez a sua entrada triunfante em meados do século XVIII, provocando mais devastação do que a peste negra ou a gripe espanhola. Calcula-se em mais de mil milhões o número de mortes devido à tuberculose. Mas afinal, por que é que estou a falar da tuberculose e da revolução industrial numa conferência sobre diabetes? Será que me enganei e estou a desviar o assunto para outras áreas? Não! Passo a explicar.
(Continua no Blog “O Quarto da República”)
É preciso recordar que a diabetes não é apenas uma doença do metabolismo, é antes de mais o filme da nossa vida, do nosso passado, do nosso presente e que promete revelações impensáveis no futuro.
O texto é longo. Por esse motivo vou “enfiá-lo” no “O Quarto da República”.
Passo a transcrever apenas os primeiros parágrafos:
O conceito segundo o qual a maior facilidade em conservar a energia está na base da obesidade e, consequentemente, da diabetes está devidamente estabelecido a nível científico, começando agora, inclusive, a ser compreendido pela população ou pelo menos por parte dela, nomeadamente a mais culta.
Ultrapassar as inúmeros crises de fome à custa de processos genéticos, frutos da evolução, parece ser uma forma razoável, e com muitos bons resultados, expressos na nossa continuidade como espécie.
Se nos reportarmos à época industrial, verificamos que foi neste preciso momento que ocorreram transformações radicais no nosso modo de viver, não só a nível biológico, mas também cultural, técnico-científico e, sobretudo, político. Num ápice tudo se transformou. Acabou o ancien regime, as sementes da democracia começaram a ser lançadas à terra, a organização social modificou-se com base na tríade cantada pela marselhesa, a justiça autonomizou-se, as constituições começaram a proliferar, o poder absoluto entrou em declínio e os direitos do homem emergiram com toda a beleza criativa. Entretanto, as conquistas técnico-científicas revolucionaram ainda mais as sociedades. Inicialmente chegaram a ser fonte de riqueza para poucos e de morte para muitos. Polos de atração fomentaram as zonas urbanas, despovoaram os campos, geraram conflitos e acabaram por acelerar o progresso, embora com vertentes muito negativas das quais se destacam as doenças profissionais, a invalidez e a morte prematura. Em termos ambientais começou-se a assistir a um dos mais terríficos fenómenos antropológicos: a poluição a todos os níveis. Nunca a humanidade tinha sido sujeita a tamanhas agressões ambientais quer a nível da água, do ar, dos solos, dos alimentos e, até, da própria alma.
Fome aliada à poluição, más condições das habitações, resistências diminuídas e focos de infeções geraram doenças e mais doenças dentro das quais destaco a tuberculose. Apesar de ter sempre existido, mesmo antes do homem aparecer, esta doença começou a expandir-se de forma ímpar e pandémica neste período. A peste branca fez a sua entrada triunfante em meados do século XVIII, provocando mais devastação do que a peste negra ou a gripe espanhola. Calcula-se em mais de mil milhões o número de mortes devido à tuberculose. Mas afinal, por que é que estou a falar da tuberculose e da revolução industrial numa conferência sobre diabetes? Será que me enganei e estou a desviar o assunto para outras áreas? Não! Passo a explicar.
(Continua no Blog “O Quarto da República”)
2 comentários:
O seu texto, caro Professor, suscita-me uma interrogação, que coloco frequentemente a mim mesmo: onde irão os nossos filhos brincar, no futuro?
À sua pergunta acrescento uma outra: E o que lhes estamos a oferecer a nível genético? Porque em termos ambientais já sabemos alguma coisa. Agora quanto à capacidade biológica de poderem lidar com o futuro é mais um problema e uma dor de cabeça. Tudo se complica cada vez mais...
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