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terça-feira, 2 de setembro de 2008

Os insustentáveis caprichos da garotada!...

Em tempo de início de aulas, os media desdobram-se em reportagens sobre os dramas e angústias dos pais, os traumas dos filhos e o peso das despesas escolares no orçamento familiar. Psicólogos, sociólogos, pediatras são chamados a perorar sobre essa imensa tragédia humana que é deixar os filhos na escola!… Há dias, não deixei de ficar assarapantado com reportagens televisivas que relatavam os insustentáveis, mas sustentados gastos extraordinários das famílias com os preparativos para as aulas do ensino básico e a compra do material escolar.
Os garotos exigiam mochila de marca, cadernos de marca, canetas de marca e percorriam as prateleiras dos centros comerciais à procura do último grito da moda de material escolar. A televisão ouviu a opinião dos ilustres garotos. Um afirmou solenemente, que nunca levaria para a escola um caderno que não fosse de marca, pois não estava para sofrer vergonhas. E outro sentenciou, com elevada prosápia, que não era um pobretanas para levar um caderno vulgar!...
Os pais satisfaziam as exigências dos filhos e, simultaneamente, queixavam-se da carestia da vida.
Lembrei-me então que, no meu tempo, na minha aldeia da Beira e um pouco por todo o país, o enxoval da escola compunha-se de ardósia, pena, lápis, borracha, caneta, uma carteira de 6 ou 12 lápis de cor e uma sacola para acondicionar o material. Excepcionalmente, lá aparecia uma sebenta escolar, feita num papel cinzento de qualidade duvidosa. Chegado o dia das aulas, ala moço, toca a marchar!...Na primeira aula, o professor indicava os livros e o preço e encarregava-se de os comprar, mediante prévio pagamento. Alguns eram distribuídos a fiado, mas ninguém ficava sem livro. A caixa escolar providenciava o pagamento aos necessitados.
Não havia angústias nos pais, nem dramas nos filhos. E lembro-me bem das recomendações dos pais aos professores: se o miúdo não se portar bem, chegue-lhe, Sr. Professor!...
Nesse tempo, cada conquista era um estímulo; agora, a cada capricho satisfeito corresponde nova exigência gratuita, num círculo vicioso sem paragem.
Se o país ficou mais instruído, por certo está a ficar muito menos educado e preparado para as vicissitudes que a vida sempre traz.
Começa-se com a angústia da escola e finaliza-se com o stress da volta ao emprego. A vida moderna está difícil. E os portugueses, doentes!...

10 comentários:

Ruben Correia disse...

Lá se vai o politicamente correcto...
Não podia estar mais de acordo com a sua análise. O consumismo e o hedonismo, ao qual todos acham que têm direito (divino quiçá!), impregnam de tal modo as mentes dos indivíduos destas sociedades modernas que os valores que permitiram chegar aos patamares de conforto e riqueza de que hoje podemos usufruir (refiro-me ao esforço, ao trabalho, à exigência, à poupança, à moderação...) são hoje vistos como algo de negativo(!), ou então foram de tal modo deturpados que não fazem sentido (basta ver o que significa exigência e rigor na práxis do ME).

Esperemos apenas que os jovens de hoje, que se queixam de barriga cheia, não tenham de lutar e sofrer (e morrer...) como as gerações anteriores tiveram, e que nos permite ter este nível de vida. E digo isto imaginando superficialmente como terão sido outros tempos, dado que nasci em plena "democracia consumista", no ditoso ano de 1983...

Rui Fonseca disse...

Desta vez estou de acordo contigo.

Mas, pelos vistos, tu já eras um rapaz com direito a alguns luxos. Lápis de cor!

Agora percebo que também foste um pouco mimado. Os lápis de cor estragaram-te um pouco.

Nada que não passe com a idade.

Rui Fonseca disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
SC disse...

Caro Pinho Cardão,

E como são estes pais que votam, como podemos queixar-nos dos políticos?
Nunca exigirão rigor, responsabilidade, decência porque não fazem ideia do seu significado. Nunca respeitam ninguém porque não se respeitam. Honra já ouviram falar mas não sabem para que serve.
Indecentemente, adoram culpar sempre a sorte e os outros, e apresentar-se como vítimas, azarados e coitadinhos (ai o significado desta palavra na minha terra...).
E é só isso que têm para ensinar aos filhos... Por isso, não se antevê nem cura nem futuro.
Quase tenho pena dos políticos que têm de governar esta gente (de coitadinhos?)...

Pedro disse...

Caro Pinho Cardão,

Por estas bandas também tivemos os primeiro dia de aulas...

Estou de acordo consigo com essa história das marcas. A nobreza da frugalidade rarefaz-se. Mas com os exemplos dos CR7 e paizinhos tótós -- eu acho que é bem feito para os pais. Quanto aos filhos sofrerão a seu tempo que os tempos são de mudança.

Já não estou de acordo consigo na parte em que transparece um certo "no meu tempo é que era bom". O Rui Fonseca já lhe arreou, e bem! Eu acho que o meu caro Pinho Cardão em relação à pancada que levou dos seus professores da escola pensa como um conhecido meu (também economista que acabou morto atropelado numa passadeira) que só se perderam as falharam. Por isso cá estamos nós a dar-lhe umas palmadinhas com electrões reciclados ;)

Eis o que escreve:

"Não havia angústias nos pais, nem dramas nos filhos."

Respondo-lhe eu -- com a porrada que levam em casa (mãe incluída) e a fome que passavam, ou quando chegavam à escola bêbados ou cansados de trabalhar no campo. De facto a angustia estava na barriga e não no coração.

"Nesse tempo, cada conquista era um estímulo; agora, a cada capricho satisfeito corresponde nova exigência gratuita, num círculo vicioso sem paragem."

Nesses tempos conquistava-se muito de facto. Os quem tinha dinheiro estudava quem não tinha saia na terceira ou quarta classe para trabalhar no campo (e isto para aqueles que tinham terras...). Grandes conquistas!

"Se o país ficou mais instruído, por certo está a ficar muito menos educado e preparado para as vicissitudes que a vida sempre traz."

Estou a perceber para o meu caro Pinho Cardão porrada, alcoolismo e miséria preparam mais para a vida que tótós consumistas... Eu ponho tudo no mesmo saco.

Cumprimentos,
Paulo
PS: Sem "hard feelings" como é óbvio que isto de terçar argumentos dá o seu gozo.

Anónimo disse...

E não é que estamos totalmente de acordo, caro Pinho Cardão?

Vaidades dos pais passando para os filhos. Nada de novo, nada de novo.

Um pequeno àparte: se eu alguma vez em dias da vida tivesse na minha infância sonhado em dizer que "não era um pobretanas para levar um caderno vulgar!...", acho que iria passar muito, muito tempo com o caderno mais miseravel que os meus avós conseguissem encontrar. O meu avô era perito em usar o martelinho de amolgar ideologias - figurado, não físico - em coisas bem menores, nem imagino numa assim. Se tão pequenos já dizem coisas destas como será quando tiverem 20s e tais? Enfim, serão estes que um dia mais irão sofrer quando a realidade os fizer cair do mundo da utopia e do sonho em que vivem. O mundo do carregar no botão e os pais - quais lacaios dos tempos modernos - satisfazem todos os caprichos das criancinhas. Para mostrar aos amigos, claro, e para calar os filhos.

A terminar; "Se o país ficou mais instruído, por certo está a ficar muito menos educado e preparado para as vicissitudes que a vida sempre traz." - URRAY, URRAY, URRAY! Os resultados já se vêem e continuarão a ver-se, sem dúvida.

jotaC disse...

(...sobre um estrado de tábua corrida de madeira de pinho, estava a secretária da professora e do seu lado esquerdo, na parede, o quadro grande de ardósia testemunha das muitas “reguadas” com que a professora me brindava sempre que não fazia os "deveres de casa", ou estava desatento à aula.
Os trabalhos para casa (na altura dizia-se deveres de casa), faziam-se em pequenas ardósias rectangulares com moldura de madeira, já que os cadernos de papel eram demasiado caros...)

Foi um tempo mesmo difícil, oxalá não voltem...

Pinho Cardão disse...

Caro RXC:
Pois associo-me aos seus votos. Oxalá!, oxalá!...

Caro Rui:
De facto, tinha, felizmente, alguns luxos: lápis de cor, embora carteira pequena, bem vestido, calçado e alimentado...
Mas nunca me esqueci do que estava ao redor...

Caro SC:
Por vezes, também tenho pena dos políticos, pelas razões que referiu. Depois, pensando melhor, atribuo-lhes uma grande parte da responsabilidade pelo edonismo gratuito vigente, ao prometerem mundos e fundos, ao criarem expectativas que nunca poderão realizar, pelo exemplo nefasto de esbanjamento de fundos públicos, pela austeridade que apregoam, mas não praticam.

Caro Paulo:
Diz transparecer do meu texto que "no meu tempo é que era bom".
Se diz, e acredito em si, admito que transpareça, mas não queria que transparecesse.
Quando dizia que não havia angústias dos pais, nem dramas dos filhos referia-me simplesmente à tragédia hodierna da escolha do material escolar. Porque, no resto, as angústias eram enormes para a generalidade das pessoas. angústias sobre coisas fundamentais, como alimentar, vestir e calçar os filhos. Miúdos descalços nas escolas,ou de tamancos e meias rotas, camisa e calças remendadas, uma sardinha e um naco de broa ao almoço era o pão nosso de cada dia.
Ter uns sapatos era um luxo que, na minha escola, eu e poucos tínhamos. A maioria tinha tamancos. Por isso, como me confragia, aqui há uns anos, ver gente calçada com tamancos, transformados em ícones da moda!...
Também está enganado quanto às conquistas: a terceira e a quarta classe eram mesmo conquistas. E se muitos ficavam agarrados à terra, outros conquistavam melhores empregos e vida menos penosa. Claro que a enorme maioria não tinha possibilidade de estudar mais. Dos que comigo fizeram a 4ª classe, só eu e outro prosseguimos estudos, tendo eu vindo a dar num razoável economista e o meu colega num ilustríssimo oficial superior da força aérea.
No entanto, o país melhorou e a região melhorou. Os filhos já estudaram e tiveram facilidades que os pais não tiveram. Mas foram esses pais que as conquistaram.
Por isso, meu amigo, o que prepara para a vida são as virtudes, o trabalho, o esforço, a moderação, para só citar as que o RCX elencou.
Fui agora mais explícito?
Sans rancune!...

Caro Zuricher:
Pois também concordo consigo.

Pedro disse...

Caro Pinho Cardão,

Agora estamos de acordo. Simplesmente fiquei com uma impressão errada de que entoava a lenga-lenga do "antigamente é que era bom". Ora antigamente poderia ter boas coisas, mas a minha impressão é que se passou do 8 para o 80 -- falta bom-senso.

Mas acho que para qualquer aluno hoje em dia fazer a 4a classe é uma conquista assim como fazer certas cadeiras na universidade ou tirar um curso.

Caro Comentador Turicense, o seu Avô era dos meus...

Cumprimentos,
Paulo

Fartinho da Silva disse...

Concordo inteiramente consigo caro Pinho Cardão.

Infelizmente a cultura instalada no país é esta! Tudo deve ser alcançado sem esforço, tudo se deve ter sem trabalho, tudo é possível bastando pedir!

A escola representa exactamente esta cultura instalada em Portugal. Basta recordar as palavras do Secretário de Estado da "Educação" do absolutamente gigantesco e tentacular monstro denominado Ministério da "Educação" - Valter Lemos - a propósito da passagem administrativa de um aluno com 7 NEGATIVAS, afirmou o dito que se o aluno não transitasse de ano em vez de estar na escola estaria na rua a fazer sabe Deus o quê!

Portanto, para Valter Lemos, a escola não é um centro de transmissão do conhecimento e da cultura das gerações anteriores, a escola é um centro lúdico de entretenimento e guarda de crianças e jovens. Acho que talvez valesse a pena alterar o nome da escola para algo como CLEGC. E já agora deixar claro ao país que a escola gerida pelos socialistas é apenas e só para aqueles que não conseguem pagar um bom colégio privado...!

Um dia destes teremos os eleitores a exigir certificados de mestrado para os seus filhinhos no seu 23º aniversário como presente! E o ME no alto da sua demagogia afirmará qualquer coisa como: "O tempo das facilidades terminou, apenas ofereceremos o certificado de licenciatura!"