As ideias de "autoridade do estado" e de "interesse público" não são propriamente abstracções que o discursos político tenda a banalizar. São pilares fundamentais do Estado e do regime democrático que pretendemos valorizar e que a não serem respeitados pelos governantes e pela administração pública, poderão rapidamente ruir e fazer ruir todo o edifício que sustentam. A leitura do Publico de hoje dá mais um exemplo que vale a pena descrever. A Direcção Regional de Educação de Lisboa acaba de assinar um protocolo com a Câmara de Palmela visando a edificação de uma Escola Básica de 2.º e 3.º ciclos no Poceirão.
A história desta reivindicação local é bem longa: desde finais da década de 80 que as populações exigem esta escola de forma a evitar as muitas horas perdidas diariamente em transportes pelos jovens que frequentam aqueles ciclos do ensino básico, mas também os que prosseguem para o ensino secundário. Tão longa demora em atender tão justa aspiração só se ficou a dever a um facto: não havia, nem haverá tão cedo, alunos em número suficiente para justificar a abertura do 3.º ciclo.
As manifestações sucederam-se - lembram-se do "Burro Justino Leite" levado à porta da Assembleia da República? - e a cobertura mediática encarregou-se de lhe dar a projecção que o inusitado caso merecia, para gaudio das audiências.
Rapidamente o Ministério da Educação, a Direcção Regional e a Câmara de Palmela chegaram a um acordo: avançava-se para a construção de uma escola com 1.º e 2.º ciclos e salvaguardava-se o terreno necessário para, quando se justifique, se construam as instalações para o 3.º ciclo.
Esta solução acautelava os interesses da população e os limitados recursos do Estado. Porém, a satisfação não era plena. Vejo agora que a DREL satisfez por completo as pretensões do Poceirão. Não sei se fez as contas que deve fazer. Não sei se inscreveu a dotação necessária ao arranque da obra. Nem sei quais são as prioridades que vão ser sacrificadas para satisfazer o compromisso assumido. Saber, para quê? Assina-se o protocolo e depois logo se verá!
Com este acto a DREL desautorizou a anterior administração (politicamente afecta à maioria) e deu a entender que o mesmo não foi feito pelos seus antecessores só por capricho, teimosia ou má vontade.
Pergunto agora como é que o Ministério vai convencer os autarcas a encerrar milhares de escolas com poucos alunos? Como vai poder dizer "não" aos muitos concelhos deste país que, pelas mesmas razões, não dispõem de ensino secundário? Como é que vai responder aos pais e professores de escolas que estão há muitos anos a precisar de obras e em condições de segurança lamentáveis? Será que estes alunos não justificam esses investimentos? Também eles não têm de andar dezenas de quilómetros para frequentar a escola mais próxima?
Para estes a iniciativa da DREL é um incentivo a que, um pouco por todo o lado, se façam mais manifestações, se injuriem os ministros, se maltrate a administração.
Eis um caso concreto de falta de autoridade e de desprezo pelo interesse público.
Depois, não se queixem da ingovernabilidade.
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