No livro "A Imortalidade" de Milan Kundera, o autor fala a certa altura da imortalidade no sentido não religioso, a "imortalidade profana, para os que permanecem depois da morte na memória da posteridade. Qualquer de nós pode alcançar essa imortalidade, maior ou menor, mais ou menos prolongada, e desde a adolescência, todos pensamos nela. (...) Perante a imortalidade, as pessoas não são iguais. Temos que distinguir a pequena imortalidade, recordação de um homem no espírito dos que o conheceram (...) e a grande imortalidade, recordação de um homem no espírito dos que o não conheceram. Há carreiras que confrontam, imediatamente, um homem com a grande imortalidade, sem dúvida incerta, ou até improvável, mas incontestavelmente possível: são as carreiras de artista e de homem de Estado".
A propósito do frente-a-frente a que hoje pudemos assistir entre Cavaco Silva e Francisco Louçã lembrei-me desta reflexão de MK e percebi o que realmente soa estranho nestes debates artificialmente organizados numa base de pseudo igualdade entre candidatos. A dimensão destes dois homens, goste-se ou não de cada um deles, é de tal modo diferente que é penoso ouvi-los com a obrigação de confrontarem. O homem de Estado e o regedor da aldeia, para retomar o exemplo do autor que cito, a pequena imortalidade de Louçã a agarrar-se com desespero ao grande momento em que se ilude com voos mais altos...
Aguardemos o debate entre homens de Estado, Cavaco Silva e Mário Soares, para então termos um grande momento da política nacional.
7 comentários:
Concordo que o Soares tem outras qualidades como a beleza, a rapidez....
Concordo com o Toxicus. O Cavaco foi sovado. Não leve o Soares para a zona da aldrabice e da má-criação e vai ser uma tareia memorável. Parece que isto vai dar mais trabalho que o que ele estava a pensar.
Pois, é como diz o Pinho Cardão, cada um acredita no que quer, embora eu tenha a maior dificuldade em perceber Tonibler quando diz com ar tão vitorioso que acha que"Cavaco foi sovado". Para isso era preciso, em 1º lugar, que tivesse sequer havido confronto o que, manifestamente, não existiu, houve antes respostas paralelas e, realmente, era impssível que fosse diferente atendendo ao abismo entre as pessoas em causa. Em 2ºlugar, se Louçã tivesse hipoteticamente "sovado" Cavaco qual era o seu motivo de júbilo???Elogiar Louçã e considerar que ele é um bom candidato a PR? Ou diminuir a figura de Cavaco Silva só porque sim, porque gosta mais de outro? Não vejo o que se ganha com este espírito clubista que compara alhos com bugalhos para nivelar tudo pela estaca zero...
Cara Suzana, uma coisa é o que se passa, outra é aquilo que queríamos que se tivesse passado.
O que queria que se tivesse passado era que aquele que será muito provavelmente o próximo PR não ficasse embrulhado só porque um chico-esperto como o Louçã o apanha numa curva. Mas o que se passou foi exactamente o contário. Ninguém está à procura do argumento X e da resposta Y. As pessoas formam opiniões sobre as opiniões das pessoas e não porque o argumento X está certo ou errado. E neste aspecto, Cavaco foi sovado.
Agora, foi o Louçã que é um aprendiz de feiticeiro que, cheio de desonestidade argumentativa, é um anjinho em desonestidade "processual". Quando chegar o dia do vigarista-mor, se o Cavaco vai para lá a pensar que lhe dá a volta, então vai ser um drama. E se com o Louçã foi 16% de audiência, nesse dia vai estar tudo à espera de ver sangue.
Caro Tonibler, o que eu quero dizer é que considero absurdo um frente-a-frente entre Cavaco e Louçã, como considero entre Soares e Louça embora neste caso possa parecer mais divertido porque Soares se disporá a fingir que o leva a sério. O que eu quero dizer é que tirar uma conclusão qualquer- seja que ganhou ou perdeu - deste pseudo debate é fazer parte de um embuste que é colocar todos os candidatos ao mesmo nível e esperar isso mesmo:que eles se comportem como se fossem do mesmo nível (e não estou a falar de questões pessoais, como é evidente, mas políticas). Trata-se de um arranjo comercial, mais nada, as pessoas mais simples também identificam esta estranheza e isso só cria confusão e não prestigia a política. Entrevistas, mesas redondas, o que quiser até à exaustão, mas N frente-a-frente como se fossem todos primeira linha não posso deixar de discordar. O facto de alguém não ser capaz de fazer estes "números" com todo o à vontade não significa absolutamente nada para o que se pretende...
Cara Suzana, que foi Cavaco fazer a Paris? Campanha? Mas acho que os emigrantes nem votam para PR e se votassem são uns 1000...
Cavaco foi mostrar, aos que cá estão, a sua posição face aos que lá estão. Foi marcar mais uns pontos ao caracter. Porque é caracter que está em causa, não é porcaria de politica nenhuma que o Presidente não pode executar.
Cada um destes debates serve apenas para isso, acrescentar ou diminuir pontos ao caracter percepcionado pelo eleitor. Por isso o Soares anda doido com os debates, porque substância ele nunca teve nenhuma.
Não são do mesmo nível, diz-me a Suzana. Irrelevante, digo eu. Porque pontos perdem-se com o Louçã como se perdem com o Soares. E Cavaco perdeu muitos pontos com o Louçã, porque deu uma imagem de atabalhoamento em assuntos, que não interessando para nada, tiram pontos. E tiram pontos porque é percepção do caracter que está em jogo!
E, concluindo, deixe-me dizer-lhe como está errada. Alegre arrisca-se a ser Presidente porque é bom político, bom economista, intelectual brilhante? Não, por causa da percepção que o eleitor tem do seu caracter. Por isso, Suzana, estão todos ao mesmo nível sim e, pode ser que me engane, mas Alegre é o próximo PR, se houver 2ª.
Deixe-me dizer-lhe que não precisávamos dos debates a dois para avaliar o carácter de qualquer uma das pessoas que está a candidatar-se e que, se é por uma picardia que se ganha ou se perde, então temos bem os Governos e os Presidentes que merecemos. por alguma razão estamos como estamos. E é claro que acho que Cavaco Silva vai ganhar, com todo o merecimento, mas se por absurdo assim não fosse preferia de longe Manuel Alegre a Soares. Pelo menos iria de certeza esforçar-se por demonstrar que era capaz, não acharia que já não tem nada a provar a ninguém. Nisso estamos de acordo.
É assim que funciona. Não precisamos de debates para avaliar carácteres? Precisamos sim, senão não votamos em nenhum!
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