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segunda-feira, 28 de maio de 2018

"EU VOU CONTAR TUDO A DEUS"...

Foi há três anos. Prometi que não a esquecia e não esqueço. Volta e não volta lembro-me desta criança.
As redes sociais são o espelho da sociedade. São tão transparentes que até arrepiam. Servem para tudo. Tem uma enorme vantagem, podemos contabilizar e ver a amplitude do caráter das pessoas. Nada de novo. O mundo foi sempre assim, diversificado até dizer basta. O que não sabíamos era a possibilidade de acesso instantâneo a tudo o que acontece.
Fujo, sempre que possível, a qualificar o que quer que seja, senão teria de me explicar sobre o que escrevo e para quê. Não é para desagradar, mas devo incomodar, não é para aliviar o sofrimento, embora tenha a perceção de que possa conseguir nalguns casos. Sou capaz de divertir, de divulgar, de incomodar, de questionar e, provavelmente, satisfazer parte de um ego escondido, não sei se exagerado ou não, tanto faz, de qualquer maneira faço sempre com alguma satisfação.
Notícias requentadas, sedutoras, manipuladas e tendenciosas, teorias de conspiração, bílis negra e malcheirosa, poemas de amor, conversas de treta, há de tudo neste pântano da vida virtual. Olho e passo em frente em muitas dessas notícias ou aleivosias. Agora, depois de um curto passeio, e de algum asseio mental, li uma frase que acompanhava a foto de uma criança síria que, antes de morrer, do alto dos seus três anos disse: “Eu vou contar tudo a Deus”. Não sei se é verdade ou não, pouco importa, o que interessa é o contexto. Uma criança sofrida que, apesar da sua curta vida, teve a perceção da desgraça e da maldade do mundo onde caiu. Três anos de vida são suficientes para categorizar e catalogar a humanidade. Um mundo que não deveria existir, ou melhor, não deveria haver seres humanos. Há uma incompatibilidade perfeita entre o universo e o ser humano.
A criança viveu o suficiente para interiorizar o conceito de Deus. Um Deus construído de acordo com a sua imaginação. O verdadeiro e perfeito Deus só pode ser visto e construído na mente de uma criança. Eu sei do que falo, porque em pequeno também fiz a minha construção do que deveria ser um verdadeiro e perfeito Deus. Sorri e entristeci ao mesmo tempo com a frase da criança síria que disse que ia contar a Deus tudo o que viu e sofreu.
A criança morreu. Deus esqueceu-o. Não acredito, mesmo que exista, que tivesse capacidade dialética em convencer do contrário a pobre criança. Defraudada neste mundo e desconsolada na eternidade.
Não sei como te chamavas, mas não vou esquecer-te.
Prometo.

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