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quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Os lobos - lembrando La Fontaine

Era uma vez um lobo que estava a beber água num ribeiro quando viu um cordeiro que também saciava a sede uns metros mais abaixo, e logo decidiu comê-lo. Procurou um pretexto para o atacar e acusou-o de estar a turvar a água que ele bebia. –Não é possível, disse o cordeiro – eu estou a beber a água que já passou por ti. O lobo enfureceu-se por ele resistir à culpa. – Pois se não foste tu, foi um teu irmão, ou primo, da última vez que aqui estive. – Não é possível, disse o cordeiro, eu não tenho irmãos nem primos que pudessem vir a este riacho. Mas ao lobo acusador pouco lhe importavam as razões ou as circunstâncias, ou mesmo se alguma vez um cordeiro qualquer lhe teria turvado as águas. - Pois se não foste tu, foi o teu pai, ou o teu avô, há uns anos! E comeu-o.
La Fontaine ensina-nos que os lobos escondem a sua voracidade com pretextos para transformar as vítimas em culpados e que os argumentos de defesa geram novos pretextos até criar um enredo capaz de fazer com que um acto ignóbil surja como um acto de justiça.
Os lobos não ficaram com boa fama na memória colectiva, mas são temíveis.

11 comentários:

Andr3 disse...

Bem..isto era uma optima história a ser adoptada pelas escolinhas e atl´s para se apresentar na festa de Natal!

Fazia-se melhor figura do que os esquemas ensaiados com a musica das just girls e respectivas audições de uma novela bem perto de nós.

Está bem que poderia traumatizar uma ou duas criançitas..mas ficava ela por ela, pq juntando as danças e as musicas que insistem em passar, fica-se quites!

La fontaine..bem pensado para transpôr ao mundo real. Lições de vida!

Bartolomeu disse...

É urgente que algumas fábulas de La Fontaine sejam reescritas.
Provávelmente que se reinvente a democracia.
Naturalmente serão estes os tempos em que surgirá a Quarta República.
Até acredito que alguns cépticos mais resistentes, comecem agora a perceber o concreto significado das palavras que a Drª. MFL proferiu e que até comecem a achar que 6 meses não serão suficientes.
Uma trilha sonora que acompanhe este comentário?
Concerteza, é para já!
http://www.youtube.com/watch?v=dEa8gcisaPU
Consegue imaginar "isto" sem o John Lenon?
Afinal, é possível deixar-nos encantar pela alternativa... não concorda Drª Suzana?
;))

Rui Fonseca disse...

Leio o seu post, li o anterior, e dou comigo a pensar que deve andar algo no ar que não consigo apanhar.

Ingenuidade minha? Estou certo que sim.

E é por isso mesmo que, se me permitem, faço uma pergunta ingénua: Não se pode dar o nome aos lobos?

E, já agora, outra: Está o ambiente assim já tão medonho que corremos o risco de, nomeando os lobos, irmos a assar na fogueira?

Tendo vivido grande parte da minha vida num país oprimido pela ditadura, custa-me a crer que ela esteja de volta sem eu dar por isso.

Sem ironia.

Suzana Toscano disse...

Caro Rui Fonseca, não é por medo da fogueira que não se nomeiam os lobos. É porque o que interessa aqui não é acusar, ou denunciar, mas contribuir para que cada um aprenda a fazer as suas próprias leituras. As fábulas servem para isso mesmo, para tornar abstracto o actor e evidenciar as atitudes, os processos mentais ou as estratégias a que se recorre para obter certos resultados. Se nos concentrarmos na lição, na teoria cujo fundamento é apoiado pela história contada, talvez seja mais fácil não nos deixarmos enganar.
Caro Andr3, estas histórias contavam-se às criancinhas, precisamente para que aprendessem a confiar ou a desconfiar quando fosse caso disso. Para que aprendessem a ser justas e prudentes nos seus julgamentos, mas também para que soubessem defender-se dos lobos.
Caro Bartolomeu, lindo o pequeno filme com a menina a cantar o Imagine. Muito, mas mesmomuito apropriado, bem precisamos de sonhar, neste mundo de lobos. Sonhar é preciso.

Pinho Cardão disse...

Cara Suzana:
Terminou dizendo que os lobos são temíveis. E são.
Mas nesta época do politicamente correcto os lobos bichos passam por animais adoráveis: matam as ovelhas, mas são amáveis e a culpa é das ovelhas e do pastor; se um lobo fere um homem, nada de anormal, mas se o homem fere o lobo, arrisca-se a ir para a prisão. E uma alcateia é uma bênção do céu.
Similarmente, os lobos humanos começam novamente a ser bem aceites e benquistos. Servem-se da nova selva dos media, que lhes dá toda a cobertura. E se alguém ousa defender-se, também, como na fábula, e na inquisição, ou na pide, alguma contaminação se lhe arranja.

Caro Rui:
Folgo muito por teres aderido à ironia e teres utilizado o mais fino humor, ao dizeres que não consegues apanhar o que anda no ar!...
E a ironia é tanto maior quanto as coisas estão bem na terra, a toda a hora, à frente de todos.

PA disse...

eu prefiro os leões, Cara Susana ...

:-))))

um abraço.

Pedro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
jotaC disse...

Uma fábula muito bonita aqui bem recordada pela Dra. Suzana Toscano, que nos impele a pensar na tragédia do cordeiro: por mais argumentos e voltas que deia acaba sempre papado...

Suzana Toscano disse...

Cara Pézinhos, o leão é um animal nobre, é o rei da selva, não é por acaso que não lhe atribuem comportamentos vis, faz muito bem em preferir os leões mas o pior é que em geral temos que lidar com o que aparece à nossa frente! Um abraço para si também :)
Caro Paulo, as fábulas são uma fonte quase inesgotável de histórias para as crianças, todas elas cheias de lições que a imaginação dos pais pode ir "gerindo" como se fosse a brincar.Espero que não lhe aconteça como me acontecia com uma das minhas filhas, é que ouvia com tanta atenção que o sono se espantava e depois era um tormento para adormecer. Acabei por substituir por canções de embalar...
Pois, caro Jotac, ninguém quer saber dos argumentos...

jotaC disse...

PS
Será que onde escrevi "deia" deveria ter escrito dê?...
:)

Suzana Toscano disse...

Por mim, gostei do "deia", creio que é apenas uma forma verbal em desuso, lembro-me da minha avó a usar...O que quer, são coisas que nos ficam no subconsciente e de vez em quando saltam para o papel!:)