Os meus dias de pessimismo multiplicam-se de forma exponencial. Razões? São tantas que nem me atrevo a citá-las. Poderei dizer que muitas delas são partilhadas por diferentes pessoas, não as mesmas, porque cada um tem a sua visão própria do mundo com leituras e vivências diferentes. Cada um de nós considera as suas razões como as mais importantes, porque são reflexos do seu posicionamento neste estranho mundo. É perfeitamente natural. No entanto, algumas dessas razões parecem adquirir um estatuto universal, como esta tragédia que nos assalta diariamente e da qual não conseguimos sair nem antever como. Sou inundado diariamente com o pão amargo da tristeza, da falta de esperança e de uma crescente desconfiança em quem nos governa e desgoverna, para não falar daqueles que, tendo sido mais do que responsáveis pela atual situação, foram mesmo criminosos, ameaçam emergir para nos atormentar, não a todos, porque alguns devem esfregar as mãos de satisfação face à possibilidade de regressarem ao palco da vida política e aos cofres da riqueza produzida pelos outros. Ando descontente, desmoralizado, sem esperança, embora lute e me esforce ao máximo para fazer o que devo fazer, com profissionalismo e honestidade, lutando para que os meus não sejam submersos nas ondas furiosas do desnorte e da incompetência provocadas pelos "dirigentes" políticos e económicos do país. Não fujo, mas tenho medo, não me resigno, embora saiba que a minha luta está mais do que perdida, não tenho esperança, e, não obstante este aspeto, tento incutir nos outros que ainda há alguma possibilidade. Mas tenho que contrariar esta tendência, horrível, que é o pessimismo. Como? De diferentes maneiras, claro. Hoje, apercebi-me de uma, simples, banal, que esteve sempre à minha frente, mas nunca tinha pensado como sendo um antídoto contra o pessimismo e muito menos como fonte de otimismo. Uma pequena reportagem na CNN revelou uma senhora de sucesso - o tema dizia respeito a mulheres que conquistaram lugares de destaque na vida -, e que tinha obsessão pela arte, uma atividade secundária a que não era estranha a sua elevada capacidade financeira. Não interessa, o que interessa é que é amante da arte, tem uma coleção notável que faz gosto em partilhar com quem admira e necessita de a ver e de a tocar. A entrevistadora fez-lhe uma pergunta simples, por que razão se dedica a esta atividade. A senhora respondeu com uma simplicidade desconcertante: - A arte é fonte de otimismo! Pus-me a pensar nesta resposta e tive de concluir que tem toda a razão, "a arte é fonte de otimismo". Obviamente que não tenho nada que se pareça com as suas obras, muitas máscaras e estatuetas, mas, de qualquer modo, possuo algumas pequenas peças que me dão um prazer enorme sempre que as vejo e as toco, algumas originais e outras belas réplicas. Já não é a primeira vez que me vejo a contemplá-las e depois acabo por me sentir melhor. É isso, as obras de arte encerram mensagens e possuem uma linguagem simbólica que mexem com as nossas emoções e sentidos, sejam quadros, estatuetas, música, poemas ou romances, seja o que for capaz de voltear e de estimular o centro do sentido estético muitas vezes afogado no tormentoso oceano do nosso cérebro. O prazer explode e o otimismo é despertado. Abri a vitrina e retirei quatro pequenas estatuetas, uma réplica muito bela da Vénus de Tacarigua, com olhos de batráquio, coxas abundantes, ventre volumoso e uma vagina a tremer de fertilidade. Duas pequenas estatuetas, de Figueiredo Sobral, adquiridas há muitos anos, a menina com a pombinha, esperança e bondade, a cabeça do pensador, bela e tranquila, e, por fim, a misteriosa estatueta de ferro, africana, do reino de Benim, cuja leitura simbólica me perturba, porque vejo algo de misterioso, meio diabólico, meio guerreiro e anunciador de uma vitória que nunca mais aparece. O que têm em comum? Arte. O que me despertam? Um pouco de otimismo. Quanto tempo vai durar este otimismo? Não sei, mas quando tiver necessidade de uma "dose" vou procurá-las, assim como a outras, quem sabe se não me vão ajudar. Hoje conseguiram.
2 comentários:
Conseguem muitas vezes, basta ler alguns dos textos que aqui nos vai deixando em que fala com tanto entusiasmo e emoção das peças de arte que encontra nas suas deambulações à procura do belo!
É muito interessante a afirmação desta sra. ("a arte é a fonte de otimismo"). E não é preciso fundamentá-la para sabermos instintivamente que falamos do belo, do raro, daquilo que uns tantos buscam, poucos encontram e compreendem... É por isso que concordo com o comentário da Dra. Suzana, quando diz do "(...)entusiasmo e emoção das peças de arte que encontra(...)".
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