No dia em que o nosso Governo tanto fala - e bem - sobre a necessidade de desburocratizar a administração pública, apresento um caso verídico que devia entrar para os anais da burocracia portuguesa.
Uma pessoa que conheço, herdou um terreno algures na península de Setúbal, que nunca tinha sido inscrito na matriz, nem registado na Conservatória. Ou seja, o terreno estava omisso.
Dispondo da escritura de compra e venda do terreno, celebrada nos anos 60, da relação de bens e de mais alguns papéis - tão (in)úteis nestas situações - essa pessoa contratou um solicitador a quem encarregou de resolver o problema.
Após mais de 11 meses de peripécias que o solicitador lhe foi relatando, essa pessoa recebeu uma carta do solicitador que o informa que, finalmente, o terreno está registado, mas há um pequeno problema - o registo é provisório por causa do seguinte:
"- para registar um imóvel na Conservatória é necessário apresentar um documento matricial emitido pelo Serviço de Finanças, o qual não existe porque a parcela não foi inscrita após a sua compra;
- para inscrever um imóvel no respectivo Serviço de Finanaçs, além da planta de localização é necessário juntar uma certidão de viabilidade construtiva do terreno em causa, emitida pela Câmara Municipal;
- todavia, a referida Câmara Municipal para emitir essa certidão de viabilidade construtiva, necessita que o requerente comprove a sua legitimidade através da apresentação da certidão predial, e onde esteja reflectido o nome do requerente que obrigatoriamente deverá ser o proprietário;
- ora, se todos os passos antecedentes tinham como finalidade efectuar os registos do imóvel na Conservatória do Registo Predial, como é óbvio, não poderão ser apresentadas quaisquer certidões porque os mesmos não foram objecto de registo ".
Ou seja, para se ter um papel é necessário arranjar outro, que por sua vez depende de um terceiro papel, que só pode ser emitido se tivermos o primeiro.
Agora só falta saber se a Câmara Municipal também vai pedir mais um papel...
Perceberam?
7 comentários:
Outro exemplo:
Fui à “Loja do Cidadão” para actualizar a morada em alguns documentos, designadamente no Bilhete de Identidade e na Carta de Condução. Naturalmente que dispunha dos anteriores documentos.
Para o Bilhete de Identidade, para além da Certidão de Nascimento, no que concerne à residência, bastou o preenchimento do respectivo impresso com nova morada (ou seja, uma mera declaração). Para a Carta de Condução foi necessário o Bilhete de Identidade actualizado.
Moral da história:
- Não foi possível tratar dos dois documentos no mesmo dia;
- Para actualizar a morada no “BI” basta uma mera declaração, para a Carta de Condução não, apesar da divergência de moradas ser passível de uma contra-ordenação.
Reclamei. Responderam-me que se tratava de um imperativo legal.
É uma burocracia menor, mas igualmente ilógica e desnecessária.
Portugal está pejado de burocratas que criam as normas do seu contentamento.
E, quando estas não existem, há sempre um funcionário zeloso que as inventa partir da sua própria “massa criativa”.
Ainda há muita por fazer em prol da desburocratização administrativa. Assim haja vontade e determinação.
Mas para que é que serve a conservatória do registo predial. Não bastaria as Finanças?
Esménio!
Faça como eu. O melhor é não actualizar nada, nem BI, nem carta, nem nada. Para além de tudo, sai muito mais barato.
Querem batatinhas, venham atrás de mim. Depois, logo se vê.
Quanto ao tema, há que nunca esquecer que a cultura do papel dá trabalho a muita gente. Pessoalmente, detesto esse tipo de culto.
Nome: Tonibler
Morada: blá blá
BI Nr: 123456677
Filho de : (não vá haver outro gajo com o mesmo nome e numero de BI, mas com outro pai)
e de: (com este nome, com este pai, com este BI, mas com outra mãe)
Nascido em: (com este nome, com este pai, com esta mãe, com este BI, mas nascido noutro sítio)
Concelho de: (com este nome, com este pai, com esta mãe, com este BI, nesta freguesia, mas noutro concelho)
Nacionalidade: (com este nome, com este pai, com esta mãe, com este BI, nesta freguesia, neste concelho, mas nacional de outro país)
Mas o melhor mesmo é irmos ao notário. Nunca fiando....
É incrível mas é verdade, a quantidade de coisas patetas que se vão inventando como se fossem muito lógicas e depois o resultado é o que se vê neste exemplos. Sei que não devia dizer, mas tenho muito a tendência de Anthrax, ir adiando e logo se vê. De qualquer modo, é uma enorme dificuldade acabar com esses procedimentos, até porque resultam geralmente de "comandos", da lei ou de quem decide e não quer correr riscos.E também de uma desconfiança doentia que nutrimos em relação aos compatriotas,uma pilha de papéis para provar que é mesmo quem diz que é, não vá o diabo tecê-las.Os funcionários são treinados nisso, na verificação, na eliminação das hipóteses de erro ou fraude e em boa verdade não lhes é deixada muita margem para liberalidades. É um facto, não é uma desculpa, com uns anos disso e todos ficaríamos assim.A origem do problema está muito antes de quem põe o carimbo ou pede os papéis...
Já agora mais uma história.Um proprietário de um prédio degradado mandou finalmente fazer obras quando caiu no paseio um bocado de varanda. O prédio, numa zona antiga, ficou lindo. Passados dois anos! um fical da Câmara apresentou-se para notificar o velho senhor de uma multa exorbitante por um andaime ter ocupado a via pública sem ter licença para tal!O empreiteiro, nicles, vá lá saber-se dele, o velho senhor nem sabia de andaime nenhum nem das regras para andaimes. Mas é assim, é o dono da obra!A Câmara multa, o dono devia ter deixado cair o prédio e o empreiteiro...vai continuar a pôr andaimes onde bem entender.Tudo em devida ordem.
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