Quando era miúdo gostava muito de ir às feiras. O buliço feirante, as múltiplas e coloridas barracas, os chamamentos dos vendedores, o constante regatear, a compra de umas botas ou de um boné, a oferta de um doce ou de um malga de tremoços, deixam-me saudades.
Havia, também, os vendedores da “banha da cobra”. Ficava seduzido por aquela verborreia. Começavam com as virtudes dos conteúdos de pequenos frascos. Serviam para as dores de todos os tipos, sarampo, impigens, trasorelho, mau-olhado, espinhela caída, cravos, verrugas, e sei lá que mais! Depois começavam com um valor muito alto, porque o produto tinha sido obtido de genuínos e muito raros animais. Logo a seguir, começavam a baixar, a um ritmo alucinante, os valores e, na parte final, acabavam por oferecer não um, não dois, mas mais três frascos pela compra de um! Era um corrupio ver as pessoas a largar as moedas e notas para adquirir o produto miraculoso. Até se atropelavam!
A última vez que vi um vendedor da “verdadeira” banha da cobra foi na feira de Vale de Açores – Mortágua, à qual tinha ido com o meu avô.
Recordei-me destes episódios quando li hoje o suplemento “Saúde Pública” do Expresso. O título “Água e fibras ajudam a controlar o peso” levou-me de imediato a ler o artigo que, diga-se, em abono da verdade estava muito bem feito e sem grandes incorrecções. Mas uma leitura mais cuidadosa denunciava facilmente os interesses de uma marca de água minero-medicinal enriquecida com fibras solúveis que, cientificamente, ajuda a reduzir o apetite após oito semanas! Andei à procura do artigo científico para o analisar, mas não o encontrei.
Na mesma edição é possível ler o “especial cerveja e saúde”. As virtudes miraculosas de várias substâncias existentes na cerveja são de bradar aos céus. Muitas delas conferem protecção contra o cancro, contra as doenças do coração e contra a osteoporose... Nem sabia que havia um Instituto de Bebidas e Saúde que tem financiado vários projectos de investigação, mediante a atribuição de bolsas. É certo que muitas substâncias em estudo, e que se encontram, também, em outras bebidas e produtos, poderão ter, e algumas até têm, efeitos interessantes, mas, o que salta aos olhos de qualquer um é a promoção da mesma, não obstante o conselho de que se deve beber com moderação! O limite é curioso, “ a ingestão diária que não ultrapasse os 200 ml de vinho ou 400 ml de cerveja (presumo que por dia), parece acompanhar-se de beneficio para a saúde cardiovascular”. As afirmações são acompanhadas de uma infografia interessante (valorizando a “loirinha”) do género: cerveja - 103 Kcal/250 ml; sumo de maçã -120 Kcal/250 ml; leite -134 Kcal/250 ml e iogurte fruta - 205 Kcal/250 ml! Logo, viva a cerveja!
Claro que não podia deixar de passar em claro o anúncio do leite “fibresse”, “physical”, “digest” e “plus ómega 3”!
Enfim! Ao anúncio: “Beba água enriquecida em fibras, porque ajuda a perder o apetite” (comprovado cientificamente!), podemos perguntar: mas não reduz o apetite para beber cerveja, pois não? É que se assim for, lá se vai o efeito protector cardiovascular da cerveja, para não falar do efeito anti-osteoporótico e anti-carcinogénico...
Que chatice!
Havia, também, os vendedores da “banha da cobra”. Ficava seduzido por aquela verborreia. Começavam com as virtudes dos conteúdos de pequenos frascos. Serviam para as dores de todos os tipos, sarampo, impigens, trasorelho, mau-olhado, espinhela caída, cravos, verrugas, e sei lá que mais! Depois começavam com um valor muito alto, porque o produto tinha sido obtido de genuínos e muito raros animais. Logo a seguir, começavam a baixar, a um ritmo alucinante, os valores e, na parte final, acabavam por oferecer não um, não dois, mas mais três frascos pela compra de um! Era um corrupio ver as pessoas a largar as moedas e notas para adquirir o produto miraculoso. Até se atropelavam!
A última vez que vi um vendedor da “verdadeira” banha da cobra foi na feira de Vale de Açores – Mortágua, à qual tinha ido com o meu avô.
Recordei-me destes episódios quando li hoje o suplemento “Saúde Pública” do Expresso. O título “Água e fibras ajudam a controlar o peso” levou-me de imediato a ler o artigo que, diga-se, em abono da verdade estava muito bem feito e sem grandes incorrecções. Mas uma leitura mais cuidadosa denunciava facilmente os interesses de uma marca de água minero-medicinal enriquecida com fibras solúveis que, cientificamente, ajuda a reduzir o apetite após oito semanas! Andei à procura do artigo científico para o analisar, mas não o encontrei.
Na mesma edição é possível ler o “especial cerveja e saúde”. As virtudes miraculosas de várias substâncias existentes na cerveja são de bradar aos céus. Muitas delas conferem protecção contra o cancro, contra as doenças do coração e contra a osteoporose... Nem sabia que havia um Instituto de Bebidas e Saúde que tem financiado vários projectos de investigação, mediante a atribuição de bolsas. É certo que muitas substâncias em estudo, e que se encontram, também, em outras bebidas e produtos, poderão ter, e algumas até têm, efeitos interessantes, mas, o que salta aos olhos de qualquer um é a promoção da mesma, não obstante o conselho de que se deve beber com moderação! O limite é curioso, “ a ingestão diária que não ultrapasse os 200 ml de vinho ou 400 ml de cerveja (presumo que por dia), parece acompanhar-se de beneficio para a saúde cardiovascular”. As afirmações são acompanhadas de uma infografia interessante (valorizando a “loirinha”) do género: cerveja - 103 Kcal/250 ml; sumo de maçã -120 Kcal/250 ml; leite -134 Kcal/250 ml e iogurte fruta - 205 Kcal/250 ml! Logo, viva a cerveja!
Claro que não podia deixar de passar em claro o anúncio do leite “fibresse”, “physical”, “digest” e “plus ómega 3”!
Enfim! Ao anúncio: “Beba água enriquecida em fibras, porque ajuda a perder o apetite” (comprovado cientificamente!), podemos perguntar: mas não reduz o apetite para beber cerveja, pois não? É que se assim for, lá se vai o efeito protector cardiovascular da cerveja, para não falar do efeito anti-osteoporótico e anti-carcinogénico...
Que chatice!
10 comentários:
Caro Prof., parece que agora o que é mesmo chic é apreciar-se as diferentes marcas de água, saber pedir exactamente a que se está a desejar naquele preciso momento, com aquele pitéu. São os novos gourmets da água...O pior é se vão começar a lançar águas com fibras, com bolinhas, com aromas, com cálcio, etc. de tal maneira que nos aconteça como com o leite, que é virtualmente impossível comprar uma embalagem de leite-tal-e-qual!Talvez a água da torneira ainda seja considerada bebível por uns tempos, com sorte não lhe descobrem um inconveniente daqueles fulminantes!
...e já agora, aqui em Mafra, 3º domingo de cada mês, anda tem uma bela feira onde encontra quase tudo o que a sua memória guardou! Não sei se vendem unguentos, mas que fazem leilões com as coisas mais extraordinárias, isso fazem. E há tremoços, mel,fruta verdadeira,balanças manhosas, galinhas e pássaros, enfim, uma Feira! Eu não perco uma...
Caríssimo Sr. Prof.
Gostaria de lhe perguntar se foi buscar inspiração a um processo de uma doente de psiquiatria dos HUC?
E se por acaso existe algum novo mandamento da Lei de Deus que diga
OS FINS JUSTIFICAM TODOS OS MEIOS?
Já que não há segredos, não há mesmo segredos!
Não me leve a mal, são as "amizades" difíceis que tanto aprecia!
Caro Professor.
A Banha da cobra das feiras começou com mezinhas para todas as doenças. A extensão à publicidade e ao marketing é apenas uma adptação aos tempos correntes....
O homem permanece igual, o modo de fazer é que se vai alterando. Por isso, a "banha da cobra" existe mais ou menos em todas as actividades. E tem o seu expoente máximo na política.
Para falar verdade, verdadinha, também sou da opinião que anda para aí muita banha da cobra, anda, anda! E no futebol então!
Não me inspirei em processo nenhum de psiquiatria. Mas há situações que merecem alguma reflexão no âmbito do condicionamento dos comportamentos.
Muita reflexão e outro tanto cuidado...
E isso não terá que ser feito mediante autorização dos visados?
Ou é só porque nos apetece? É que se extravasou os limites da própria reflexão, li algures, que determinadas situações eram motivo para novas piadas, confesso que fiquei escandalizada!
Caro Prof. Massano Cardoso
Hoje mais do que nunca para diferenciar as marcas, a indústria alimentar tem evoluído no sentido de incorporar nos seus produtos substâncias que se julga terem efeitos positivos e benéficos na nossa saúde, desde que ingeridos com ponderação.
E os consumidores estão sensíveis ao apelo de compra de certos alimentos porque se afirma que fazem bem à saúde, ajudam a controlar o peso, ou mais drasticamente reduzem o peso, fazem bem ao coração, combatem o colesterol, etc.
Mas há ainda muita falta de informação ao consumidor que lhe permita saber o que verdadeiramente está a comprar. E depois, questiono-me se as vantagens "milagrosas" publicitadas pelas marcas têm efectivamente correspondência científica?! Ou será que estamos perante uma sofisticação da "banha da cobra"?!
De uma coisa parece não haver dúvidas: comer e beber com ponderação e com variedade de alimentos faz bem à saúde!
Outra grande banha da cobra que se vendia nas feiras mas que felizmente, a ASAE acabou com ela, eram as tão famosas pinhoadas, foram detectadas pelas autoridades sanitárias muitas deficiências na embalagem, nunca me enganaram!
Caríssimo Sr. Prof.
Não tem autoridade suficiente para pôr ordem nesta casa? Mas que palhaçada vem a ser esta, há limites para tudo! Diz que não se baseou em nenhum processo de psiquiatria, pois digo-lhe que se trata de uma reedição revista e actualizada do processo, ou tem que se ser voluntário à força no papel de rato de laboratório, sabe muito melhor do que eu o que mais cedo ou mais tarde lhes acontece! E não foi por falta de aviso! Espero sinceramente que TODOS saibam conscientemente o que andam a fazer, vejo tanta irresponsabilidade que me faltam as palavras! Depois admiram-se que haja condicionamentos dos comportamentos, pudera! E a propósito isto vai dar uma tese de mestrado ou de doutoramento? Mais responsabilidade é precisa, quer seja na política, no futebol e também na ciência, concerteza que terá os devidos reflexos na arte, na saúde (física e mental), no sol, na água, enfim... na VIDA
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