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domingo, 9 de agosto de 2009
Raul Solnado
A arte de fazer rir exige inteligência, humor e sensibilidade. Fazer rir quem está ao nosso lado, quem nos conhece e tem uma memória comum é relativamente fácil, como também não é difícil fingir que se achou graça só para não ferir a susceptibilidade de quem se julga espirituoso. Mas fazer rir uma plateia inteira, manter divertido esse grupo anónimo, oculto pelas luzes viradas para o palco e disposto a fazer render o que se pagou pelo bilhete de entrada no espectáculo é uma arte arriscada e muito corajosa que só muito raros conseguem. E quando essa arte se afirma com traços muito pessoais, com um estilo inconfundível que cria legiões de admiradores e se prolonga por uma vida inteira, sem alienar os seus valores iniciais nem correr atrás de modas e truques, então merece todo o nosso respeito e admiração.
Raul Solnado foi sem dúvida um homem que teve o dom dessa arte tão especial.
Lembro-me de ouvir os discos com as histórias que ele contava, - agora reeditados – e por mais que se ouvissem tinham sempre graça, as piadas podiam ser contadas em todas as idades e em todos os grupos porque não tinham maldade mas malandrice, porque não agrediam nem humilhavam, mas apenas trocistas ou críticas. Muitas vezes as histórias do Solnado faziam rir mas também faziam um nó na garganta, ele misturava humor e emoção e em tudo, que me lembre, sobressaía uma enorme generosidade, um afecto pelo público, tudo engrandecido por uma timidez sempre a espreitar, talvez denunciada pela gaguez que aprendeu com o tempo a disfarçar na perfeição. E tinha aquele gesto de garoto, que mesmo depois de passada a juventude lhe mantinha o ar travesso, aquele gesto de cerrar os lábios como se quisesse impedir as palavras cómicas de sair, criando suspense a ver se ele teria a coragem de dizer o que parecia que lhe tinha vindo à cabeça naquele instante.Nunca com Solnado se sentia o constrangimento de um dito torpe ou ofensivo.
Raul Solnado morreu hoje. Apagou-se em sinal de tristeza o riso dos outros que ele tão bem soube despertar, deixou no entanto um enorme carinho e, na memória de uma geração que também aprendeu a rir com ele, ficou essa enorme gratidão por nos ter ensinado que o riso é uma forma de criar laços, de ir ao encontro dos outros, não se confunde com o ruído do trocadilho vil, nem com o esgar da chacota, nem com o comentário que humilha ou envergonha quem o diz e quem o ouve.
Que a memória de Raul Solnado possa ser honrada com as gargalhadas puras que o seu espírito humano e a sua sensibilidade souberam fazer ecoar ao longo de tantos anos.
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6 comentários:
D.E.P.
Actor cómico excepcional, dentro del humor "blanco".
Ha quem viva sem dar por nada...
Ha quem morra sem tal saber...
poema de Zeca Afonso, definindo o antípoda de Raul Solnado, homem conscientíssimo da vida do seu país numa época de censura praticada por um regime ditatorial que ele combateu com uma arma que só pode ser utilizada eficazmente por aqueles cujo espírito se apresente infantil, simples e humilde. Como muito bem descreve cara Drª. Suzana.
Permita-me que me junte á sua humilde e muito justa homenagem a um grande Português.
Cara Dra. Suzana Toscano:
Junto-me a esta homenagem a Raul Solnado, indubitavelmente, um homem de entretenimento de duas gerações que soube, como poucos, caricaturar o povo na ventura e na tristeza, fintar com improvisos inteligentes o homem do lápis azul, e passar à ribalta… Permita-me que realce as suas bonitas palavras, a seguir:
-“…por nos ter ensinado que o riso é uma forma de criar laços, de ir ao encontro dos outros, não se confunde com o ruído do trocadilho vil, nem com o esgar da chacota, nem com o comentário que humilha ou envergonha quem o diz e quem o ouve...”
Suzana
Muita justa a sua homenagem a Raul Solnado. Foi um homem que nos ensinou a rir, a perceber a graça que é possível retirar das coisas triviais, a aprender com a comédia e a saber troçar com inteligência, com respeito e sem ofensa.
O que é elogioso e merecedor da nossa memória é que Raul Solnado ensinou muito com a sua comédia, mas sem nunca abastardar esse dom extraordinário que apenas alguns têm o de fazerem rir e divertir os outros com elevação e sem a mediocridade da banalidade e do ordinário.
Vamos sentir a sua falta. A sua memória não se apagará...
Um artista marcante
na arte de representar,
uma obra importante
para sempre recordar.
As risadas desbragadas
e instantes de exultação,
estas foram as pegadas
de um artista de eleição.
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