Desculpem-me o tema em época de férias, algo pesado e repisado. Mas pelos vistos é tão importante que não escolhe épocas nem estações. Está sempre presente, faça chuva ou faça sol. É que não há meio de nos livrarmos dele…
O DE publicou na edição de ontem duas entrevistas sobre Portugal. Uma realizada a José Gil, o filósofo português, na qual o pensador analisa o espírito português e uma outra realizada a Jeremy Lawson na qual o economista da OCDE que acompanha Portugal roda o filme do futuro da economia portuguesa.
E o que têm em comum as duas entrevistas? Ambas se debruçam sobre Portugal, fazem diagnósticos negativos sobre o País, explicam as forças de bloqueio do desenvolvimento, descrevem as dificuldades e traçam um quadro pouco animador sobre o futuro. Ambas falam de lugares comuns - culturais, sociais, económicos e políticos - há muito conhecidos, repetidos e esfalfadamente apontados em ilustres entrevistas, objecto de estudos aprofundados e temas de livros best-sellers, tratados convenientemente em programas políticos e por aí fora.
O diagnóstico do “estado de saúde” está feito e mais do que feito. O que tem faltado é uma “prescrição médica” acertada, capaz de debelar a doença e de fortalecer um organismo fraco e exangue de tantos remédios e tratamentos ministrados vezes sucessivas sem resultados satisfatórios.
Diz José Gil, que “há qualquer coisa na sociedade portuguesa que se volta contra os próprios portugueses. (…) O comum do espírito português é pequenamente pragmático – o dia-a-dia. A coisa é como é. (…) Apenas sei que traz consequências muito nefastas para o trabalho, para o enraizamento de uma certa cultura de elite em Portugal. (…) Gostamos do lazer, o que é bom porque não sofremos o stress do trabalho. Mas porque é que os portugueses gostam tanto de continuar na inércia? É o pequeno gozo das coisas, aquilo que chamo chico-espertismo. Trata-se de uma forma de fuga ao trabalho e, paradoxalmente, de afirmação. Por essência o português não é preguiçoso – quando emigra é dos melhores trabalhadores. Mas cá ainda vivemos numa espécie de ninho, onde o prazer do lazer está na ordem das preferências.”
Por sua vez, Jeremy Lawson prevê que Portugal vai ter no período de 2011 a 2017 o crescimento mais baixo da zona euro, de apenas 1,5%. Segundo o economista “A OCDE analisou a produtividade total dos factores – capital e trabalho – e tentámos projectar isso para os próximos anos. Desde a recessão de 2003 que a produtividade total tem crescido muito pouco e não há sinais de qualquer inversão da tendência no médio e longo prazo. Como o emprego também deve crescer pouco, o crescimento económico não deverá ultrapassar 1,5%. (…) É preciso fazer com que as pessoas tenham melhor educação. O nível formativo ainda é muito baixo e é um dos pontos que limita mais a economia.”
Em ambas as entrevistas o capital humano surge à cabeça dos problemas, como não poderia deixar de ser, mas também como solução para os resolver.
O DE publicou na edição de ontem duas entrevistas sobre Portugal. Uma realizada a José Gil, o filósofo português, na qual o pensador analisa o espírito português e uma outra realizada a Jeremy Lawson na qual o economista da OCDE que acompanha Portugal roda o filme do futuro da economia portuguesa.
E o que têm em comum as duas entrevistas? Ambas se debruçam sobre Portugal, fazem diagnósticos negativos sobre o País, explicam as forças de bloqueio do desenvolvimento, descrevem as dificuldades e traçam um quadro pouco animador sobre o futuro. Ambas falam de lugares comuns - culturais, sociais, económicos e políticos - há muito conhecidos, repetidos e esfalfadamente apontados em ilustres entrevistas, objecto de estudos aprofundados e temas de livros best-sellers, tratados convenientemente em programas políticos e por aí fora.
O diagnóstico do “estado de saúde” está feito e mais do que feito. O que tem faltado é uma “prescrição médica” acertada, capaz de debelar a doença e de fortalecer um organismo fraco e exangue de tantos remédios e tratamentos ministrados vezes sucessivas sem resultados satisfatórios.
Diz José Gil, que “há qualquer coisa na sociedade portuguesa que se volta contra os próprios portugueses. (…) O comum do espírito português é pequenamente pragmático – o dia-a-dia. A coisa é como é. (…) Apenas sei que traz consequências muito nefastas para o trabalho, para o enraizamento de uma certa cultura de elite em Portugal. (…) Gostamos do lazer, o que é bom porque não sofremos o stress do trabalho. Mas porque é que os portugueses gostam tanto de continuar na inércia? É o pequeno gozo das coisas, aquilo que chamo chico-espertismo. Trata-se de uma forma de fuga ao trabalho e, paradoxalmente, de afirmação. Por essência o português não é preguiçoso – quando emigra é dos melhores trabalhadores. Mas cá ainda vivemos numa espécie de ninho, onde o prazer do lazer está na ordem das preferências.”
Por sua vez, Jeremy Lawson prevê que Portugal vai ter no período de 2011 a 2017 o crescimento mais baixo da zona euro, de apenas 1,5%. Segundo o economista “A OCDE analisou a produtividade total dos factores – capital e trabalho – e tentámos projectar isso para os próximos anos. Desde a recessão de 2003 que a produtividade total tem crescido muito pouco e não há sinais de qualquer inversão da tendência no médio e longo prazo. Como o emprego também deve crescer pouco, o crescimento económico não deverá ultrapassar 1,5%. (…) É preciso fazer com que as pessoas tenham melhor educação. O nível formativo ainda é muito baixo e é um dos pontos que limita mais a economia.”
Em ambas as entrevistas o capital humano surge à cabeça dos problemas, como não poderia deixar de ser, mas também como solução para os resolver.
O nível formativo irá continuar a ser o calcanhar de Aquiles do nosso progresso. Investir na educação, não apenas no acesso mas na qualidade da formação e do conhecimento é, como há décadas está dito e redito, um caminho inexorável para ajudar a corrigir o “chico-espertismo” e aumentar a produtividade…
4 comentários:
Cara Margarida, mas o motivo pelo qual Portugal não avança - nem avançará, aliás - é cultural. O diagnóstico cultural, muito do que José Gil referiu na entrevista que nos trouxe, já Teixeira de Pascoaes escreveu e publicou em 1915 n'"A Arte de Ser Português". Ao longo do século XX vários filósofos aludiram ao tema, como por exemplo o Prof. Agostinho da Silva.
Sinceramente, duvido que alguma vez tenha volta possivel. Pior do que mudar mentalidades é mudar culturas. As mentalidades ainda podem ir mudando com o rolar das gerações. Já a cultura, a essência do povo, a sua alma, essa não muda.
Como diz o caro Zuricher, a análise apresentada por José Gil é recorrente, contudo identifica muito bem em minha opinião alguns dos males de que enferma a nossa sociedade.
Porém, o maior mal que aqui não se refere e que na minha observação é provávelmente a mãe e o pai desta inconformável e inintendível apatia, tem a ver com a tendência social e profissional para a não motivação e para a desvalorização das aptidões alheias. Em minha opinião, baseado em indícios que retiro de conversas com pessoas emigradas, é neste ponto que Portugal e os empregadores portugueses, diferem do estranjeiro. Nos países da Europa e da América, os trabalhadores pportugueses vêm o seu esforço compensado em matéria de dinheiro e ainda de reconhecimento das suas qualidades de trabalho. Esta diferença resulta com certeza numa maior vontade de trabalhar e caracteriza as nossas qualidades, que somos um povo diferente, é verdade. Descuidamos a formação técnica mas possuímos a intuição para a descoberta, conseguimos por vezes ser tão acertivos no nosso improviso como os melhores técnicos estranjeiros, tocamos sem pauta, e conseguimos afinar, mas para que continuemos nessa "onda" de inspiração, precisamos que nos aplaudam e reconheçam.
Conheci em tempo um empresário textil de Seia, que em dada altura, para não perder a competitividade, decidiu renovar os teares. Para isso deslocou-se à Alemanha e adquiriu a "última palavra" em termos desta tecnologia.
Com os equipamentos vieram técnicos alemães fazer a montagem e dar a formação aos empregados.
Depois de entrarem em laboração e pouco tempo volvido, os teares começaram a avariar. Foram chamados os técnicos que passaram alguns dias a estudar o problema, mandaram vir peças da Alemanha e repararam a avaria. Novamente, algum tempo depois, os teares "empanaram" de novo. Voltaramm os técnicos, substituíram peças e foram embora.
À terceira avaria, quando o dono das fábricas já desesperava, um dos empregados já com alguma idade, pediu para lhe falar e humildemente referiu-lhe que tinha estado a observar o que os Alemães faziam quando vinham reparar as máquinas e achava que havia ali umas peças que não podiam trabalhar daquela forma, que era por isso que os teares avariávam.
O outro, tavez porque já estava com a paciência esgotada, descompôs o empregado, mandando-o quidar daquilo que lhe dizia respeito e deixar a parte técnica para os Alemães.
O filho do patrão, que assistira à conversa, depois do pai acalmar, usando de muito tacto, convenceu-o a referir aos Alemães a sugestão do trabalhador. Assim foi, quando os técnicos alemães vieram pela 3ª vez, chamaram o trabalhador, que foi explicando ao filho do patrão a sua ideia. Surpresa das surpresas, o homem tinha visto algo de que a alta técnica alemã não se tinha apercebido, conseguindo assim resolver definitivamente aquele problema.
Zuricher falou da "Arte de ser Português" que merecia uma divulgação mais profunda, porque constitui uma das análises mais importantes sobre os portugueses.
Há um ponto na crónica da Margarida, e que todos nós facilmente comprovamos, que é o facto de lá fora os portugueses serem altamente produtivos sejam quais forem as suas atividades. Cá, é o diabo. O problema, além do nível cultural, não será mais uma reação à incompetência e "outras coisas" de quem anda lá por cima?
Sempre ouvi dizer que o exemplo parte de cima, e pelo que já vi, vejo, e vou, infelizmente, continuar a ver, também, não virá grande coisa.
Caro Zuricher
Lembra muitíssimo bem as análises de Teixeira de Pascoais e de Agostinho da Silva.
É difícil aceitarmos a fatalidade de que não há volta a dar! Sinceramente que não vejo como podemos ficar de braços cruzados. É uma questão de sobrevivência. Por isso, continuo a achar que investir na educação e formação será uma grande ajuda.
A ignorância que pode interessar a alguns é o pior inimigo do desenvolvimento.
Caro Bartolomeu
É recorrente a constatação que os portugueses no estrangeiro trabalham com bons níveis de desempenho, seja em actividades menos qualificadas seja em actividades que exigem conhecimento especializado e de maior complexidade. Ultimamente têm vindo a público os trabalhos e descobertas dos cientistas portugueses que desenvolvem a sua carreira lá fora.
A maior vontade para trabalhar de que o Caro Bartolomeu fala prende-se certamente com a maior motivação para trabalhar bem, com a preocupação incutida de atingir bons resultados.
A motivação tem que ver, entre outras variáveis, com a organização e a gestão, o aproveitamento das aptidões e competências, a criação e a diversificação de oportunidades, a busca do talento, o reconhecimento do mérito, o investimento na formação, os meios que são colocados à disposição, o esforço exigido, o sentido da utilidade do trabalho e a perspectiva do bem comum.
Todos estes aspectos fazem a diferença e são eles próprios factores de transformação cultural e de mentalidades.
Portugal está muito atrasado. É por isso que deve investir na educação e formação, não apenas nas competências técnicas mas na preparação para a vida.
A história dos teares de Seia que aqui nos trouxe mostra-nos, Caro Bartolomeu, que os portugueses podem ter no "improviso" uma vantagem competitiva!
Caro Professor Massano Cardoso
Pois a incompetência tem grandes responsabilidades. Gerir e administrar organizações e motivar pessoas também requerem competência. Muita, mesmo!
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