Retomo o meu texto escrito aqui há umas semanas atrás. Está instalada a confusão. Confunde-se sustentabilidade com orçamento, confunde-se orçamento com reforma, confundem-se cortes de pensões e reduções de TSU com reforma e por aí em diante. Voltaram os “papões” da descapitalização e privatização da segurança social. Volta e meia ressuscitam-se umas ideias.
Mas as confusões não surgem por acaso. Por vezes podem interessar quando não há mais nada para dizer ou quando convém apenas dizer alguma coisa. Por enquanto ou definitivamente. A falta de rigor e a falta de contensão nas palavras também alimentam a confusão.
O caso é que nem o governo nem a oposição apresentaram até agora uma proposta concreta de reforma da segurança social, com princípio, meio e fim. Ambos concordam que há problemas de sustentabilidade financeira. Talvez não estejam a falar da mesma coisa.
Havendo uma proposta é essencial que o ponto de partida seja o mesmo, isto é, não pode haver dúvidas sobre qual é, afinal, a situação financeira da segurança social. As propostas devem poder ser comparadas. É essencial que se perceba quais são as diferenças para que as pessoas entendam minimamente as medidas e quais são os seus impactos financeiros a médio e longo prazo no sistema e no bolso dos pensionistas e dos contribuintes. As “proclamações de fé” não são nada.
Infelizmente muito do que se está a passar deve-se há falta de transparência e de escrutínio público. As consequências estão à vista. O facto é que há problemas graves no sistema. Já estão instalados, deixaram de ser longínquos. As pessoas estão confundidas e preocupadas. Perderam a confiança. Têm razões para isso. Não merecem isto...
9 comentários:
«Ambos concordam que há problemas de sustentabilidade financeira. Talvez não estejam a falar da mesma coisa.»
Para além de tudo o resto que a car Drª Margarida sintetiza neste post, creio ser o conteúdo do parágrafo que transcrevi, a "pedra de toque" que por existir e não se assumir que existe, esteja na origem do global "desafinamento" desta matéria. Como refere também e eu penso que apesar da baralhação que corroi o entendimento geral, muita gente já percebeu, é a oportunidade das declarações que vão sendo feitas a miude e com um dose generosa de contradição.
Plagiando o nosso estimado amigo Dr. Tavares Moreira; valha-nos Santa Engrácia... ao Simão não valeu mas fez com que o aviso predurasse na voz popular. Esperemos que a "obra" se conclua, assente em alicerces sólidos e sirva o fim que a criou.
Caro Bartolomeu
Há soluções técnicas para os problemas, o que não há é acerto político para os resolver porque os partidos "andam de candeias às avessas". Não há meio de se entenderem...
Deixo o comentário que o leitor deste Blog,Jorge Oliveira me enviou, por não o ter conseguido colocar no 4R:
Eu vi o programa “Olhos nos Olhos” de 2ª feira dia 25, que teve a participação da Dra. Margarida Correia de Aguiar.
Talvez me tenha escapado, mas não ouvi nada sobre um aspecto que considero essencial na reformulação do sistema de pensões, concretamente, a separação clara entre o sistema solidário e o sistema contributivo.
O sistema solidário abrange os pensionistas que contribuiram pouco, ou mesmo nada, mas que a sociedade considera necessitarem de ajuda na velhice. Essa ajuda terá de vir dos impostos pagos por todos nós e, obviamente, não se justifica colocar exigências de sustentabilidade a este subsistema.
O sistema contributivo tem de ser assimilado, sem margem para dúvidas, a um seguro de velhice obrigatório. E se alguma reformulação tem de ser feita é inevitável que passe pela criação de uma conta corrente do segurado, com a emissão de extractos anuais, em que figurem as contribuições, devidamente actualizadas no tempo, e o valor da pensão prevista para o final de um período de 40 a 45 anos de contribuições.
Cada um amealha para si próprio e, se quiser, até pode amealhar mais do que o exigido pelo Estado. Acaba-se assim a referência, sempre desagradável, e susceptível de remoques geracionais, de que os que trabalham andam a pagar as pensões dos que estão reformados.
Partindo deste princípio e destas regras simples, tudo o mais é folha de cálculo...
Cumpr, JPO
Caro Jorge Oliveira
Obrigada pelo seu feedback.
Muita coisa ficou por dizer, como sempre assim acontece quando o tempo é pouco. O assunto foi por mim tratado numa outra sessão do programa "Olhos nos Olhos".
A separação que fala sobre o "seguro social" (sistema contributivo) e a redistribuição (sistema não contributivo) é fundamental: os objectivos, os riscos, as prestações sociais, o financiamento, os custos técnicos, o modelo de funcionamento e a gestão são distintos. Há falta de transparência e há "subsidiações cruzadas" e muitas outras irregularidades. Mas tão ou mais importante que a transparência é o facto de algumas prestações não contributivas serem atribuídas sem "condição de recurso". Por exemplo, as pensões sociais e os complementos sociais - são atribuídos a cerca de um milhão de pessoas - custam ao OE 2,7 mil milhões de euros, ou seja, 1,6% do PIB e representam cerca de 1/3 do envelope financeiro das prestações contributivas. Este problema existe há anos e não há coragem política para acabar com esta situação. Estudos indicam que apenas cerca de 30% das pensões sociais são atribuídas a pessoas que vivem em agregados familiares em situação de carência. Cumprimentos.
Boa tarde,
Antes demais muito obrigado pela comunicação do seu trabalho e pela disponibilidade de apresente que existem alternativas. Neste sentido, é porque não domino estes assuntos gostava de colocar uma questão: estas alterações que propõe, pelo risco de serem reprovadas pelo Tribunal Constitucional, só serão possíveis se se alterar a Constituição. Ou por alternativa realizar o seguinte:
- na revisão da Lei de Bases da Segurança Social;
- na criação de uma segunda pensão;
- na selectividade das prestações e verificação da condição de recursos
- etc
Obrigado
Pedro Silva
Caro Pedro
Agradeço o seu interesse.
Felizmente há alternativas para oferecer. As escolhas são reduzidas porque os problemas financeiros são muitos, há muitos pensionistas e pensões em formação. O problema foi crescendo.
O novo sistema que proponho não creio que tenha problemas de constitucionalidade. Implicará, naturalmente, legislação e regulamentações próprias e um novo modelo de gestão. Não sei ao certo se a sua questão se prende com a abertura deste novo sistema de pensões.
Boa noite,
Obrigado pela resposta.
Sim, deste sistema ou de qualquer outro já que ouvimos dizer pela comunicação social e não só, que será sempre necessário a alteração na CR para qualquer alteração na segurança social e mais especificamente nas reformas. E como estou a começar a ler o seu livro, que desde a congratulo pelo trabalho desenvolvido, será para perceber melhor todas as situações que possam surgir. (Sendo completamente leigo nesta matéria).
Obrigado
Caro Pedro Silva
Boa leitura, espero que o livro seja útil.
Tem havido muitas alterações ao sistema público de pensões (através das leis de bases da segurança social), assim como tem havido muitas alterações às regras das pensões (fórmula de cálculo, idade de reforma, factor de sustentabilidade, etc.) sem necessidade do crivo do Tribunal Constitucional. A legislação que foi agravando as condições de reforma aplicou-se sempre aos futuros pensionistas, tendo sido sempre excluídas as pensões já em pagamento.
O Tribunal Constitucional foi ouvido no caso de medidas que seriam aplicadas sobre pensões já em pagamento, como aconteceu com a contribuição extraodinária de solidariedade, o corte de 10% nas pensões públicas já em pagamento e a contribuição de sustentabilidade, medidas que coincidiram com o período de ajustamento.
Então deduzo que para a sustentabilidade da SS tera de haver alteração na CR.
Obrigado pela resposta. Certamente que terei boa leitura com o sei livro.
Pedro Silva
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