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quinta-feira, 3 de agosto de 2006

Cuba: episódio pitoresco

No dia 21 de Março deste ano realizou-se em Cuba uma das “espontâneas” manifestações de apoio ao regime castrista, neste caso tendo como pretexto a celebração do 2º lugar obtido pela selecção cubana de baseball, num torneio internacional disputado em S.Juan - Porto Rico, perdendo apenas na final (disputada na véspera) com o Japão, por 10-6.
O baseball é um desporto imensamente popular em Cuba, apesar de ser praticado em grande escala no país considerado inimigo letal do regime cubano, os EUA.
Foi assim preparada uma grande recepção à selecção cubana, com parada triunfal ao longo das ruas de Havana, bem preenchidas por Jovens Pioneiros, uma organização da Juventude Comunista de Cuba, agitando as habituais bandeirinhas nacionais.
A procissão terminou no estádio do desporto nacional, previamente ocupado por milhares de estudantes e pelos chamados “trabalhadores sociais”, uma espécie de milícia civil que trata, entre outras tarefas, de espiar a vida pessoal das famílias cubanas para prevenir riscos de “perversão política e social”.
Esse ponto culminante das festividades contou com a presença dos principais dignitários do regime, incluindo o próprio Fidel Castro.
A chegada de Castro ao estádio foi cuidadosamente preparada, sendo precedido, um a um, por importantes dignitários do regime – General Guillermo Frias, Ricardo Alarcon, Carlos Lage – e por Adan Chavez embaixador da Venezuela em Havana e irmão de Hugo Chavez, seguido do conhecido segurança presidencial José Delgado e, finalmente, Fidel Castro em pessoa.
Á chegada de Castro a multidão levantou-se e ouviu-se um grande “bruaah” nas bancadas.
A cerimónia iniciou-se logo a seguir, consistindo numa primeira parte em dois espectáculos de dança, um de tipo folclorico e o segundo de dança moderna.
Seguiu-se a chamada um a um dos jogadores da selecção de baseball, que subiram as bancadas para cumprimentar Fidel. Este ofereceu um par de tacos de baseball a cada jogador, por sua vez fornecidos ao Caudillo por uma simpática assistente.
Á medida que os jogadores subiam a bancada, na instalação sonora do estádio uma locutora/cantora entoava louvores aos heróis, referindo em especial o facto de terem sido capazes de recusar ofertas de milhões de dólares para “trair a sua terra natal”.
Referia-se, obviamente, a convites que alguns jogadores teriam recebido para jogarem em clubes profissionais de baseball nos EUA.
O ponto “alto” e final da cerimónia foi o habitual discurso de Castro.
Só que desta vez, após umas palavras introdutórias de louvor aos atletas, dizendo que a selecção “... de uma modesta ilha das Caraíbas ter conseguido bater-se com um país como o Japão na final de uma competição internacional – foi uma ocorrência de grande magnitude!”, Castro enveredou pela leitura de uma série de folhas “clipadas” que trazia consigo, com notícias de agências internacionais relativas ao feito da selecção.
E essa parte não correu bem.
Começou com Castro afirmando, perante a multidão, que as folhas estavam trocadas. Seguiu-se um silêncio de alguns minutos para acertar as folhas, tendo então iniciado a longa leitura das notícias.
Citou, uma a uma, as fontes das notícias. Algumas delas, para admiração dos presentes, eram agências noticiosas que os cubanos não estão autorizados a ouvir ou ler (BBC, Miami El Nuevo Herald, por exemplo), por serem de inspiração “contrarevolucionária”.
Demorou horas, numa voz arrastada e frequentemente trémula. A última hora foi passada a glorificar os feitos de Cuba nos campos da medicina e da educação.
Os jovens estudantes exibiam crescentes sinais de impaciência e muitos adormeceram.
Os membros do Politburo apresentaram sempre uma face imperturbável, ouvindo pela mil-enésima vez o seu líder e condutor do Povo.
Episódio sintomático do estado de levitação a que chegou o regime cubano.

7 comentários:

João Melo disse...

e novidades?já se tá a ver que com fidel a afastar-se ou a ser afastado, as espadas vão ser desembainhadas.ou o regime cai de podre ( por um povo que não o suporta...) ou aquilo implode devido às guerras fraticidas.para cair de podre, tinha de haver uma opososição bem estruturada.mas não há.só uns fogachos. e todos acantonados em miami.por isso só quando estiverem todos à tareia pelo poder , é que a ditadura de cuba arrebenta por dentro!

Adriano Volframista disse...

Há pelo menos dez/quinze anos que é assim, pelo que não compreendo o post.
Cumprimentos
Adriano Volframista

crack disse...

Considero este post notável, pela força e subtileza da mensagem. Efectivamente, cerca de uma semana depois de nos ter sido dada a conhecer pelo Expresso a forma como o actual governo lida com a informação/comunicação de massas, isto é, que o governo só está interessado em fornecer dados, ou comentar, sobre os factos que enaltecem a acção do governo, podemos imaginar que não serão necessários 50 anos para termos um assessor de Sócrates a ler, tal como o de Fidel,com voz monocórdica, elogios ao executivo. Como não nos é difícil prever que, num qualquer estádio, se farão subir a um palanque os membros do governo, e notáveis colaboracionistas, sob uma trovoada de aplausos de caquéticas e vetustas personalidades, arregimentadas dos batalhões de "reservistas" da tralha socialista.
"Este" futuro, está já a ensaiar os primeiros passos, nós é que não queremos acreditar no que nos entra pelos olhos dentro, porque ainda temos muito recentes os fumos da alvorada democrática, e fomos demasiado ingénuos para acreditar que o "modelo" de Santa Comba Dão jazia morto e enterrado. Como verificamos, mudou apenas de sítio.
Parabéns pelo post, Dr. Tavares Moreira.

just-in-time disse...

É um espectáculo típico, não exclusivo do "heróico" bastião anticapitalista. Em 1992, assisti a um fabuloso discurso do Presidente Balaguer,já muito idoso, na R. Dominicana, onde repetiu à exaustão os discursos mais recentes
do DG do FMI e do Presidente do BM ,fazendo questão em demonstrar estar, ele próprio, totalmente actualizado em matéria de política de desenvolvimento económico.

O importante é que os maus períodos não se eternizem e que haja gente preparada para assumir a liderança após a mudança, o que em Cuba me parece problemático, quer pela longevidade do regime actual, quer pelo espírito que muito provavelmente prevalecerá no ambiente dos refugiados em Miami.

Repararam no episódio das folhas trocadas...!

Tres e meio disse...

Considero urgente a renovação e transição democrática em Cuba, no entanto receio bem a intervenção dos Estados Unidos prontos para transformar Cuba num Iraque versão II ou entao fazer outra Cuba como uma divisão do seu quintal e simultaneamente bordel para os grandes magnatas que financiam campanhas eleitorais e fabricam milhares de armas responsáveis por 11300 mortes anuais só nos Estado Unidos.

Arrebenta disse...

Felizmente que estas coisas não são do meu tempo, pois não ia haver Alka-Seltzer suficiente para as digerir inteiras: reza a Wikipedia, bla, bla, bla, que depois de fazer um golpe de estado contra um outro -- América sempre ao lado -- um tal de Fulgêncio Batista foi atirado borda fora por Fidel Castro e sus muchachos.

Os pretextos até eram lícitos: Batista tinha tornado Havana num enorme bordel, com gajas permanentemente a fazer broches pelos cantos, e a rapaziada a vender o cu a cavalheiros discretos e decentes, com carteiras francamente cheias de dólares. No meio disto tudo, vaporadas de charuto, muito sol, e margheritta à beira-bordas. República das Bananas.

Veio Fidel e acabou com a pouca vergonha: em dois dias, a ilha tornou-se num paraíso de oftalmologistas, curandeiros de paralíticos e museu a céu aberto de velhas marcas automóveis.
Com o tempo, as fachadas desfizeram-se em pó, o povo tornou-se cultíssimo, e não ignora que habita nas Caraíbas do per-capita de meio centavo, os charutos passaram todos para o Fidel, e a maior telenovela de Estado são os discursos de 7 horas, do seu Grande Timoneiro.

Se Manoel de Oliveira o tivesse conhecido, casavam-se.

Doida, há dias que a C.N.N. anda a preconizar a morte do dinossauro, através do tal cancro do intestino. Acontece que a C.N.N. é outro cancro, muito pior do que o do intestino e esquece-se de que Fidel, um dos homens mais ricos do Mundo, também tem acesso aos melhores curandeiros da Ecúmena, eventualmente os mesmos que prolongaram vinte anos de agonia do Anti-Cristo do Vaticano, mau-grado os atentados, o megacitalovírus e o HIV, nunca bem esclarecidos.

Fica aqui o elogio dos irmãos Castro: o mais novo tem tudo escrito na cara, a venalidade, a boçalidade e o inato criminoso; mais se diria um Pinochet fora de época, com trinta anos de obsolescência às costas. O mais velho, durante as décadas em que governou a ilha, conseguiu alcançar, na plenitude, todos os objectivos de Fulgêncio Batista: a Fortuna, Havana a voltar a ser um enorme bordel, com gajas a fazer permanentes broches pelos cantos, e a rapaziada a vender o cu e a picha a cavalheiros discretos e decentes, com carteiras razoavelmente cheias de euros. No meio disto tudo, vaporadas de charuto, muito sol, e margheritta à beira-bordas. Aparthotel de Luxo de Guantanamo. Baía dos Porcos, Repúblicas das Bananas.

Punta Cana, Punta Cona, mais a Puta que os Pariu.

Tavares Moreira disse...

Caros Comentadores,

Brejeirice à parte, o último comentário, de Arrebenta, sintetiza com ironia e neo-realismo, a história de Cuba dos últimos 50 anos.
Interessante o documentário de 1 hora ontem passado pela Sic Notícias relatando a história da revolução cubana e o enredo de traições pessoais que Castro e seu mano-jovem Raul protagonizaram.
Quase todos os seus fieis companheiros de revolução acabaram perseguidos, presos, fuzilados ou mortos em "acidente".
É uma história fascinante.