Vi ontem na televisão uma notícia sobre uma ONG que decidiu deixar de prestar cuidados de saúde em países africanos para passar a exercer a sua actividade de voluntariado nos próprios Estados Unidos, por considerarem que há aí muitas carências na assistência aos menos favorecidos pela sorte.
Esse grupo de médicos, enfermeiros e técnicos de saúde instalaram-se num fim de semana num Estado americano, num pavilhão imenso, e esperaram para ver o que acontecia. Cedo começaram a ver chegar pessoas de todos os lados, ansiosas por uma consulta, ao princípio incrédulos com aquela dádiva dos céus, depois agradecidos, dispostos a esperar o tempo que fosse preciso até serem atendidos.
A iniciativa ultrapassou largamente o que a Organização tinha previsto, e os testemunhos das pessoas, - aquela classe média americana com as carrinhas familiares e os bonés de pala,- eram muito claros quanto ao motivo daquela romaria. É que a saúde é muito cara para quem não tem seguro e os seguros são muito caros para serem bons ou seja, o seguro acessível está muito longe de cobrir por exemplo os cuidados dentários, os óculos ou doenças crónicas e dispendiosas.
Um homem novo, que tinha vindo de 300 km de distância na esperança de que lhe tratassem uma infecção num dente que o atormentava, como evidenciava a cara inchada e a dificuldade com que falava, dizia à saída, emocionado, que “foi Deus que me mandou estas pessoas, Ele sabia como eu estava a sofrer”.
Depois mostraram a fila interminável de gente que se formava à porta, e entrevistaram uma senhora magrinha, óculos muito grossos e os cabelos todos brancos. Parecia conformada por já não poder ser atendida, teria que esperar mais uma semana, o problema é que estava a perder a visão, não conseguia acesso a uma consulta de especialidade, não tinha dinheiro para a pagar. Que sim, tinha a quem recorrer, os amigos da Igreja a que pertencia, sempre tinha sido muito activa na Igreja e podia contar com eles, mas sabe?, dizia ela com a voz embargada de lágrimas, a lutar contra a raiva, “eu trabalhei toda a vida, devia ter direito a ser tratada, custa-me ter que andar a pedir, sempre trabalhei, sempre fui uma boa cidadã, custa-me muito ter que pedir…”
Impressionou-me o sentimento de revolta e desamparo daquela mulher, já de idade, a olhar para a vida toda e a sentir-se de mãos vazias. Mas também aquela gente, amontoada, rendida à necessidade de que a caridade se lembre deles, já que as contas dos seguros não se compadecem com considerações sociais, cortam a direito e deixam muitas “franjas” de fora. A dura e penosa realidade.
Esse grupo de médicos, enfermeiros e técnicos de saúde instalaram-se num fim de semana num Estado americano, num pavilhão imenso, e esperaram para ver o que acontecia. Cedo começaram a ver chegar pessoas de todos os lados, ansiosas por uma consulta, ao princípio incrédulos com aquela dádiva dos céus, depois agradecidos, dispostos a esperar o tempo que fosse preciso até serem atendidos.
A iniciativa ultrapassou largamente o que a Organização tinha previsto, e os testemunhos das pessoas, - aquela classe média americana com as carrinhas familiares e os bonés de pala,- eram muito claros quanto ao motivo daquela romaria. É que a saúde é muito cara para quem não tem seguro e os seguros são muito caros para serem bons ou seja, o seguro acessível está muito longe de cobrir por exemplo os cuidados dentários, os óculos ou doenças crónicas e dispendiosas.
Um homem novo, que tinha vindo de 300 km de distância na esperança de que lhe tratassem uma infecção num dente que o atormentava, como evidenciava a cara inchada e a dificuldade com que falava, dizia à saída, emocionado, que “foi Deus que me mandou estas pessoas, Ele sabia como eu estava a sofrer”.
Depois mostraram a fila interminável de gente que se formava à porta, e entrevistaram uma senhora magrinha, óculos muito grossos e os cabelos todos brancos. Parecia conformada por já não poder ser atendida, teria que esperar mais uma semana, o problema é que estava a perder a visão, não conseguia acesso a uma consulta de especialidade, não tinha dinheiro para a pagar. Que sim, tinha a quem recorrer, os amigos da Igreja a que pertencia, sempre tinha sido muito activa na Igreja e podia contar com eles, mas sabe?, dizia ela com a voz embargada de lágrimas, a lutar contra a raiva, “eu trabalhei toda a vida, devia ter direito a ser tratada, custa-me ter que andar a pedir, sempre trabalhei, sempre fui uma boa cidadã, custa-me muito ter que pedir…”
Impressionou-me o sentimento de revolta e desamparo daquela mulher, já de idade, a olhar para a vida toda e a sentir-se de mãos vazias. Mas também aquela gente, amontoada, rendida à necessidade de que a caridade se lembre deles, já que as contas dos seguros não se compadecem com considerações sociais, cortam a direito e deixam muitas “franjas” de fora. A dura e penosa realidade.
5 comentários:
Há estados e estados dentro dos Estados Unidos. E alguns são autênticos países do terceiro mundo em que o horizonte temporal de miséria é um par de semanas, as escolas estão a cair de podres e não existem cuidados de saúde. Aqui falta aquele nível de acção comum que garante o máximo de liberdade a todos. São excelentes casos de estudo para se entender o estado mínimo necessário para se ter o mínimo de estado.
Cara Dra. Suzana Toscano.
Não vi a notícia a que se refere, mas sei, pelo que li, que todo o sistema de saúde americano assenta em seguros individuais. Cada um, tem a saúde que pode “comprar”. Até aqui, nada de mais, é o que há, bem ou mal…
No entanto, para melhor compreendermos o motivo de desespero das pessoas que nos relata, seria interessante sabermos se elas se auto-excluíram, isto é, se decidiram não constituir o seu seguro de saúde ou, pelo contrário, são vítimas do próprio sistema de saúde, gerado pelas seguradoras, que não dá resposta, tal como o sistema em Portugal.
Esta questão, julgo ser bastante pertinente, na medida em que, também por cá, quando se fala em saúde, fala-se logo em seguros!...
Em todo o caso, o retrato que tão bem aqui nos relata, é mais um paradoxo da sociedade americana.
Também assisti, Suzana. Também me impressionou. Quem não se impressionaria com aqueles testemunhos numa América onde se não imagina tanta gente careça de recursos para tratar de um dente!
Antes tinha assistido à alegria de uma portuguesa a quem um médico em Cuba deu a notícia que iria voltar a ver de uma vista perdida aos 2 anos. Tem hoje, salvo erro, perto dos 50 anos. E em Portugal médico algum lho tinha dito porque não tinha recursos para custear uma consulta da especialidade. Desta feita não foi uma ONG, mas uma autarquia, a de Vila Real de Santo António que proporcionou esse e outros momentos. Em Cuba. Sinais dos tempos. E, se pensarmos bem, grandes paradoxos.
Suzana há muitos americanos que morrem a trabalhar, já velhinhos, porque precisam de ganhar dinheiro. São pobres, não têm segurança social nem seguro de saúde. Estão entregues à sua sorte e à caridade alheia. Ainda assim, vão valendo as instituições sociais não lucrativas que se dedicam a prestar assistência a estas pessoas. Nos EUA o voluntariado social é muito forte.
A sociedade americana tem muitos contrates que à luz dos valores europeus são inadmissíveis. Somos diferentes e neste ponto somos melhores.
Caro Tonibler, aí está uma aritmética bem difícil, esse equilíbrio ideal entre o que são os mínimos de um e de outro. É que a realidade social não é estática e a capacidade de resposta do Estado não é elástica, agora ajusta, agora retira. ´De que lado é que deve ficar o risco, do lado das pessoas ou do lado do Estado?
Caro Jotac tem toda a pertinência a sua questão "seria interessante sabermos se elas se auto-excluíram, isto é, se decidiram não constituir o seu seguro de saúde ou, pelo contrário, são vítimas do próprio sistema de saúde, gerado pelas seguradoras" mas receio que não seja possível responder com rigor, por muitos estudos que se façam. As pessoas auto excluem-se porque são imprudentes? Ou porque não conseguem de facto suportar, por si só, os encargos que a cobertura de saúde implica? E se forem as seguradoras a abusar, como impedi-lo, se não há alternativa a essa oferta? São questões que hoje já podem ser analisadas seriamente, sem dúvida.
Também vi esse caso, Zé Mário, é muito bem lembrado.
Margarida, sem dúvida que na América há uma intervenção da sociedade civil muito mais forte e organizada mas, como dizia aquela mulher que eu ouvi, não deixa de ser caridade, as pessoas sentem-se "a pedir" e é isso que é humilhante. De facto, o nosso sistema, por muitos defeitos que tenha, é mais humano ou mais digno, o que vai dar no mesmo. Por isso é que estas políticas são muito, mas mesmo muito complicadas...
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