1. Achei algo enigmática a reacção do Ministro das Finanças quando, na semana passada, interrogado acerca das eventuais implicações da forte revisão em baixa da variação do PIB sobre o OE/2009 e respectivo défice respondeu qualquer coisa como “por agora não vemos motivo para revisão”.
2. Mas confesso que, se estivesse na pele do Ministro, também dificilmente encontraria outra saída – a pergunta nem era aliás inteligente, a pergunta adequada teria sido “em quanto é que o Governo vai rever o défice” e não se o Governo vai rever ou se pensa rever...
3. Já ontem, defrontado com a acentuadíssima queda das receitas correntes do Estado, em mais de 11% no 1º trimestre do corrente ano, o Ministro usaria outra expressão enigmática “a receita está sob controlo”...
4. Estou em crer que o Ministro, nesta altura dos acontecimentos, prefere esperar para ver o que acontece e nomeadamente se acontece...algum milagre que salve o Orçamento/2009 de uma profunda revisão.
5. Tal como as coisas estão neste momento, não me parecendo fácil que melhorem nos trimestres mais próximos, a eventualidade de uma quebra de receita da ordem de grandeza (em %) da verificada até agora poderá significar qualquer coisa como 6 mil milhões de Euros a menos no Estado Central – serviços integrados e serviços e fundos autónomos.
6. Teríamos pois cerca de 3,6% a adicionar na relação défice orçamental/PIB, o que, considerando o défice previsto oficialmente de 3,9% do PIB (não esquecer ainda a esperada contracção nominal deste), colocaria o défice em pelo menos 7,5% do PIB.
7. Se acrescentarmos as inevitáveis derrapagens cíclicas na despesa, designadamente nas despesas sociais (estas até beneficiando do aplauso geral), facilmente se chegaria a 8% do PIB ou mesmo mais.
8. Devo confessar, apesar de alguma ortodoxia de que fui acusado nestas matérias - ouvi bastos impropérios afáveis desse tipo em intervenções feitas na AR por representantes da actual maioria – que esta situação em nada me impressiona ou aflige.
9. Estamos em pleno funcionamento dos estabilizadores automáticos numa época de profunda contracção económica – as receitas fiscais não podem deixar de diminuir, e muito, as despesas correntes não podem deixar de aumentar...
10. O que já me parecerá mal é que o Governo venha a adoptar uma política de "avestruz", tentando mais uma vez contrariar a evidência, e deixe arrastar este tema até já não aguentar – com toda a gente das Oposições a reclamar mais um RECTIFICATIVO.
11. Em minha modestíssima opinião, o Governo só teria a ganhar se neste caso reconhecesse sem demora e com toda a abertura e frontalidade a excepcionalidade da situação, avançando uma proposta de OE Suplementar que traduza a nova realidade em que nos encontramos.
12 comentários:
Caro Tavares Moreira,
Estamos bem perto das eleições e portanto poucos partidos se arriscaram a pedir uma redução da despesa. Se o fizerem, serão acusados de neo-liberais( conceito que nem Soares consegue explicar) e de culpados pela crise!
A diminuição das receitas tem sido visível nas inúmeras operações STOP que decorrem no país.
Dr. Tavares Moreira,
Na minha actividade (imobiliário e construção), estou em crer que a quebra será, em %, superior no segundo trimestre. E pelo que ouço, noutras actividade é semelhante.
Continuo a constatar muito imobilismo, um bloqueio das nossas elites ou algo parecido. Não entendo a dúvida ou a falta de capacidade de prever que o tombo será muito maior. Gostaria de saber a sua previsão para as variáveis macro económicas.
O que condiciona a meu comportamento com investidor ou consumidor não é tanto a crise mundial, mas a perspectiva de impasse na governação de Portugal. Todos sabemos que o mundo não vai acabar e a economia mundial vai recuperar, mas quanto a cá dentro…
Este governo está a refugiar-se na esquerda e todos sabemos o receio que a actividade privada tem deste tipo de evolução. Quanto à Oposição, tem de ser mais explícita, no que toca a variáveis que mexem com o futuro das empresas e não apenas com o presente. Não basta falar de liquidez, esta disponibiliza dinheiro mas não constitui motivos directos de esperança no futuro. A esperança para as empresas está intimamente ligada à capacidade de empreender e esta está ligada à facilidade de contratar. Tendo em conta a qualidade e custo da nossa mão de obra dávamos a volta à crise num ápice.
Caro Tavares Moreira
Na época dos Descobrimentos, o capitão embarcava sempre um cartógrafo, um prático e um cronista.
Na gesta, económica, do capitão Sócrates, ao zarpar levava apenas o cartógrafo e o cronista. Ainda nem sequer tinham torneado o Cabo Espichel e já se tinha desentendido com o cartógrafo, pelo que, em Sines, embarcou um prático, desembarcando o cartógrafo.
Até ao Cabo das Tormentas, o prático serviu, conhecia as correntes, os ventos e os sabores das diferentes águas, mas não lia as estrelas pelo que calculava mal a latitude e não sabia estimar a longitude, porque não sabia afinar o relógio. Mas tinhamos vento de feição e comida e água com fartura e nas escalas que tinham realizado o capitão tinha conseguido negociar e bem, os mantimentos frescos necessários(Ah claro, os nativos tinham informado que estava na rota certa).
Agora que estamos no meio da tempestade, o prático guia-se pelas estrelas que não conhece, estima uma longitude para a qual não tem referência e anda às voltas com umas águas das quais não tem ideia do grau de salinidade e as correntes não vão na direcção que esperava.
A tripulação desconfia, já por três vezes lhe foi afiançado que nas próximas 48 horas avistaríam terra frme e poderíam capear a tormenta, sem que ainda tenha sido avistada.
A sorte da tripulação desta estória é que o barco ainda não meteu água e os mantimentos ainda estão secos, se bem que os animais vivos já quase foram todos consumidos; claro que nesta estória aquela (tripulação) é completamente analfabeta, pelo que não se dá conta do chorrilho de asneiras que o cronista escreve e anuncia. O capitão espera que a tripulação acredite que a água que entra por causa das vagas é obra do demónio, que a perca dos mantimentos é obra dos ratos e aquilo que os marinheiros mais velhos andam a dizer é porque não sabem ler e, por isso não percebem o que o cronista lhes escreve.
Deixo-lhe à sua imaginação encontrar um seguimento, mas acho que ajudei a entender a rota da nau.
Cumprimentos
João
I Parte
A derrapagem é brutal
embora seja negada,
o descalabro governamental
deixará a economia estragada.
Um terceiro orçamento
torna-se imprescindível,
o estrondoso desmoronamento
é mais do que audível!
Ao escutar estas informações
o mexilhão fica preocupado,
para agravar temos as afirmações
deste (des)Governo sincopado!
II Parte
A inconsciência governativa
aliada à sua natural incompetência,
resulta numa política pouco efectiva
baseada numa ridícula prepotência!
Pelas estrelas orientado
na elaboração de fantasias,
este (des)Governo desorientado
propagandeia hipocrisias!
O mexilhão prevenido
não acredita neste orçamento,
o (des)Governo deve ser banido
para acabar com este tormento!
Caro André,
Nesta altura nem vale a pena pensar em redução da despesa...esta vai aumentar, não reduzir-se!
E propor redução da despesa no contexto corrente teria efeito semelhante ao de exibir uma foto do Dr. Salazar nas semanas a seguir ao 25 de Abril...
Caro Agitador,
As previsões económicas aqui apresentadas em nome do 4R, em 28 de Janeiro pºpº, apontavam para uma contracção do PIB entre -3 e -2% em 2009.
Anunciamos, na mesma altura, que uma revisão destas previsões seria apresentada até final do próximo mês de Junho...
Até lá não se fie muito nestes números, se não se importa...
Caro João,
Meu amigo encontra-se numa fase de grande inspiração...até sou capaz de propor atribuir-lhe, em outsourcing, a elaboração das próximas previsões económicas (revisão) deste 4R...
Este seu discurso recheado de evocações da nossa epopeia marítima dos descobrimentos adaptada à epopeia magalhanesco-pacóvia que estamos a viver revela uma imaginação prodigiosa...
Admirável, tenho de confessar!
Caro Manuel Brás,
O nosso amigo João em prosa e o senhor em poesia, não sei qual dos dois caracteriza melhor os tempos de verdadeira corrida para o desconhecido, sem farois nem travões- só mesmo com o tal cronista do João ainda por cima "desletrado" - em que nos encontramos lançados!
OE Suplementar ???? Também foi mordido pelo "newspeak" da maioria PS? Orçamento rectificativo s.f.f. a não ser que tenham encontrado receitas "suplementares" tipo ter encontrado petróleo na costa portuguesa...
Caro hotbook,
Este contribuinte ser mordido pelo "newspeak" da "maioria" que refere é certamente mais difícil do que Mestres Lucílio, Olegário e Xistra providenciarem arbitragens decentes...
Orçamento Suplementar sem qualquer dúvida - onde vai o Governo buscar os recursos (empréstimos) que lhe vão faltar para cobrir o enorme buraco orçamental sem autorização da Assembleia?
Será que alguém inventou formula de ultrapassar o limite do endividamento fixado por lei sem autorização parlamentar?
Orçamento Rectificativo muito provavelmente na medida em que a despesa vai certamente ultrapassar os valores orçamentados e os "alçapões" devem estar de tal modo a aborratar que não deve caber lá mais nada...
Caro Tavares Moreira,
Cozinheiro-Chefe no seu melhor! Disse que não é preciso orçamento rectificativo! É caso para dizer que os deuses estão loucos!
Caro Dr. Tavares Moreira,
Eu esperaria maior seriedade intelectual no comentário, tendo presente estes números:
http://ovalordasideias.blogspot.com/2009/04/culpa-da-alegada-derrapagem-do-defice-e.html
Melhores cumprimentos,
Prof. Dr. Carlos Santos
Caro André,
Pois, pois, aí já não haverá nada a fazer...costuma dizer-se que aquilo que não tem remédio...remediado está!
Caro Professor Doutor Carlos Santos,
Tem a certeza de ter lido o Post? Se não leu porquê esse comentário totalmente à revelia do texto?
Fui ler o texto que me sugeriu, no seu MAGNÍFICO Blog.
Percebo bem e respeito a sua msg na perspectiva de uma posição político-partidária, mas não é isso que manifestamente está aqui em causa...
Caro Tavares Moreira
Obrigado, mas considero que o meu amigo é mais competente e mais experiente nas previsões económicas, pelo que declino o seu amável convite.
O meu anterior post seguiu um rumo mais jocoso, porque a "situação" psicológica nacional é de tal forma surrealista que só mesmo o humor pode ajudar e a criticar "ridendo castigat mores".
Mais seriamente, a situação não permite assobiar para o lado à espera que a chuva passe. A crise é síncrona e vamos todos ser atingidos pela crise.
Creio que o contrato não escrito que o eleitorado tem com a actual classe política pode estar em vias de ruptura.
Vamos ao contrato para se perceber o que quero exprimir, aquele (contrato) pode ser formulado, de uma forma sintética, do seguinte modo: voçês (políticos) "aproveitam-se" e "ajudam-se" entre si, que nós não vos chatiamos, desde que/sempre e quando nos façam ganhar diheiro, leia-se dividam o bolo com alguma equanimidade (que não quer significar igualdade); e assegurem a nossa reforma e o futuro dos nossos filhos, leia-se emprego, desde que estes obtenham um canudo.
Neste momento, os mais lúcidos já perceberam que nenhuma das condições contratuais vai ser cumprida, o mal é que foi prometida à saciedade e, como sabe, quando muitas vezes repetida funciona como um mantra e torna-se realidade.
Os mais lúcidos já perceberam que o discurso lateralizante da classe política chegou ao fim e, além de ter de ser alterado, o actual tem que cessar o mais rapidamente possível. Com isto quero significar que estamos a chegar ao momento em que a quebra contratual terá consequências.
Os mais lúcidos já começam a deixar de serem considerados loucos, lunáticos, pessimistas, agoirentos, negativistas, catastrofistas, ressaibiados, e mais alguns epítetos que não me recordo.
O eleitorado já desconfia de que, mais do que se enganarem (os políticos), eles (os políticos) andam a enganar o eleitorado, com a agravante que pedirem, sem contrapartidas, mais sacrifícios, para que fosse possível cumprir o que foi prometido.
Daqui até Outubro vamos ter tempo para que aumente a percentagem do eleitorado que perceba que o contrato não será cumprido e que é inútil continuar nesta senda.
Ficou de fora qual será a reacção desse eleitorado, porque em certa medida, entramos numa fase de elevada imprevisibilidade.
Historicamente, a época mais semelhante a esta foram os Secs. XII e XIII. As variáveis e as condicionantes são semelhantes e o tamanho do território quase o mesmo; a situação quase igual: neste momento estamos, quase, "encostados" à parede, como à época.
Nesses dois séculos mudou-se de dinastia, alterou-se o sistema político e iniciámos a "expansão" marítima.
Nesses dois séculos equacionou-se a "união" com Castela, a promoção do povoamento do interior, a promoção da reforma agrária, a promoção do desenvolvimento agrícola, a promoção do desenvolvimento das pescas e a promoção das universidades e estabilizou-se o relacionamento com a entidade supranacional da época, o Vaticano.
Nessa época as erupções sociais violentas eram comuns e frequentes.
O que vamos fazer agora?
Cumprimentos
João
Caro João,
Essa sua construção em que combina elementos do contrato social de JJ Rousseau e da nossa história medieva é de uma graça que impressiona!
Que interessante digressão pelos tempos e pelos valores político-sociais (ora perdidos ou dizimados) sobre os quais esta Nação foi edificada nos oferece - bem haja!
Enviar um comentário