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sexta-feira, 7 de novembro de 2008

ADN


Em 14 de Setembro de 2005, publiquei a seguinte nota que transcrevo, porque o Expresso, neste fim-de-semana vai apresentar um artigo sobre esta matéria.

A importância da genética para fins de investigação é muito importante, quer sob o ponto de vista criminal, quer sob o ponto de vista civil. No primeiro caso, é possível “controlar, identificar e vigiar” criminosos ou suspeitos através de análises de ADN. No segundo, em caso de catástrofe ou de situações em que se procura a identificação das vítimas é de uma grande utilidade. Um terceiro ponto tem a ver com a investigação científica. Relativamente à investigação criminal, utilizando as técnicas mais adequadas e de uma forma perfeitamente controlável, nada haverá a opor. Mas quanto à existência de bases de dados genéticos, que possam ser utilizados para outros fins, o perigo é real se não forem devidamente utilizados. Nos próximos tempos vai haver muita discussão e debates sobre esta matéria. O que é certo é que com o tempo acabarão por se constituir as tais bases. As razões assentam na necessidade de controlar a criminalidade e na evolução da investigação científica que pode e deve ser utilizada para controlar aquela. O pior é que os criminosos também sabem utilizar os resultados da investigação científica para baralhar o esquema. Senão vejamos: a divulgação dos avanços científicos, nomeadamente da polícia forense, através de séries televisivas, tais como CSI (Crime Scene Investigation), levam os criminosos, por exemplo, assaltantes de carros, a deixarem beatas de cigarros apanhadas em vários locais, no interior dos veículos roubados, para confundir a polícia. Pode acontecer que um assaltante ou um assassino leve algum produto biológico de um vizinho para colocar no local do assalto ou no corpo da vítima. A parada de complexidade vai subir. A ciência não é boa nem é má, mas é usada tanto pelos “bons” como pelos “maus”. Sendo assim, a constituição de bases de dados genéticos não vai ser pacífica nem resolver tudo. Resolverá, sem dúvida, muitos problemas, mas não deixará de originar outros, porventura muito graves. A problemática da utilização dos dados genéticos para fins pouco ortodoxos e a sua fácil aplicação é uma realidade. No Reino Unido, os agentes de tráfico, que são, frequentemente, vítimas de humilhação e abusos, contam agora com uma nova técnica para combater os condutores mais irascíveis: o”kit detector de cuspo”. Assim, no caso de um polícia ser alvo de um condutor-cuspidor, o agente utiliza o material biológico para provar a identidade do autor de tamanha façanha. Imagino o que poderia acontecer se fossem utilizados kits detectores de escarros, de urina, de fezes e outras coisas, por essas cidades e vilas fora. Cruzavam-se os resultados com uma base de dados genéticos e procedia-se à respectiva contra-ordenação dos prevaricadores. Volta e não volta o cidadão receberia um aviso para pagar uma coima por ter sido detectado no dia tal, no local x a presença de …

Na altura, e no decurso do debate com os nossos comentadores, dos quais destaco a preocupação do Tonibler, acescentei:

No caso de bases de dados genéticos para fins criminais é utilizado alguns segmentos do ADN – salvo erro dez pequenas zonas – que permitem “apenas” a identificação do indivíduo como se fosse uma impressão digital, ficando de fora toda e qualquer informação genética sensível. Esta é a posição de peritos em medicina legal. Estes bocadinhos não revelam nada sobre as características físicas da pessoa ou sobre as doenças. O assunto é complicado e muito vasto. De facto, compreendo a preocupação e mesmo a indignação do Tonibler. O problema consiste quem, como (e durante quanto tempo) controlará essa enorme fonte de informação. Vários países já dispõem este tipo de base. Quanto a uma base mais”alargada”, também fico preocupado (e muito), não vá um dia, alguém apropriar-se de algum elemento que contenha o meu ADN utilizando-o para fins nada agradáveis…

Pessoalmente, e apesar de reconhecer alguma utilidade, tenho muitas dúvidas se irão ser respeitadas as normas que salvaguardem os interesses e os direitos dos cidadãos. Basta ver o que acontece por aí com tudo o que é base de dados. “Parece” que toda a gente tem acesso...

3 comentários:

jotaC disse...

Já lá vão três anos, a memória do caro Professor Massano Cardoso em pleno e o tema continua actual! Isto demonstra a complexidade e controvérsia deste assunto...

Suzana Toscano disse...

O Expresso pode bem inspirar-se nos belos posts que, ao longo destes quatro anos, aqui foram sendo publicados no 4r!

jp disse...

Nestes últimos tempos as bases de dados para tudo (e mais um par de botas) estão na moda. Sempre a pretexto da segurança dos cidadãos, ele é o registo de qualquer comunicação digital (directiva europeia que obriga ao armazenamento de voz, email, instant messaging, sms, etc), perfil genético, informação de segurança pública, dos animais domésticos (já chipados por lei), a base de dados das matriculas electrónicas, as imagens das cameras de vigilância, para além daquelas que aparecem por sugestão de alguém, como a base de dados de frequentadores indesejáveis de estabelecimentos de diversão noturna, por exemplo. Tudo aquilo que vemos nos filmes de ficção está de facto a acontecer.

A pergunta que se coloca é: é possível ter um modelo para tratar e manipular tão gigantesca infraestrutura? que fins a dar para tal mirabolante quantidade de dados e informação?

A resposta é, é possível, e já é feito. Quanto ao propósito, depende da ocasião e das partes envolvidas.

Hoje já é exequível, aproveitando os avanços das tecnologias de informação e comunicação (custo zero de armazenagem e possibilidade de cruzamento de grandes bases de dados), construir padrões individuais de comportamento através de um processo de "minagem" a pedido de dados. Não é preciso saber em antecipação o fim para o qual se armazena os dados. Basta armazena-los e quando forem necessários eles podem ser devidamente organizados e utilizados. É a diferença entre ter nomes e moradas numa uma lista telefónica em papel e uma base de dados digital. Os dados são os mesmos, a capacidade de acesso e organização é que é diferente.

Quanto ao propósito, lembro a história daquela rapariga que foi internada num hospital com uma patologia relacionada com sintomas de anorexia. O internamento foi longo (mais de um mês). A partir de certo momento o seguro recusou-se a comparticipar o tratamento, a não ser que os pais da jovem fizessem prova de que a anorexia não era de origem nervosa. O caso foi parar a tribunal. O Juiz, a pedido da parte Seguradora, exigiu então a apresentação de todos os contactos telefonicos, emails, sms, MSN da jovem, afim de se demonstra a origem da patologia.

Pois é, nunca sabemos em que mãos e para que propósitos irão parar os nossos dados.