Várias vezes aqui suscitei a questão da ilusão/futilidade, no plano do desempenho da economia, das “habilidades” da prática de ocultação de despesa pública.
Ainda não há muito citei o relatório do Tribunal de Contas sobre a gestão financeira do SNS em 2006, no qual se dava nota de um considerável agravamento da situação financeira (aumento astronómico das dívidas a fornecedores) e económica (aumento dos prejuízos) dos hospitais EPE e Públicos, tendo como natural contrapartida um menor montante de transferências do Orçamento para os mesmos hospitais.
Só em 2006 essa “habilidade” terá feito o Orçamento “poupar” mais de € 500 milhões, numa operação de cosmética/lifting pura, em que só mesmo a face do Orçamento ficou a ganhar.
Todos os demais, (i) utilizadores dos serviços públicos de saúde, (ii) responsáveis do SNS em especial os gestores dos hospitais e (iii) em última análise o País, ficaram a perder.
De 2007 não temos ainda informação, mas não será de admirar que tenha sido igual ou pior que em 2006.
A criação da Estradas de Portugal, EPE constituiu outra manobra para retirar despesa do Orçamento, embora ainda falta ainda saber o veredicto de Bruxelas perante tal operação, que também aqui denunciamos na altura própria.
Mas, como acima refiro, todas estas práticas são em última análise e na melhor das hipóteses ilusórias ou fúteis, pois a despesa não deixa de ser feita e não deixa de ser pública, consistindo, em regra, numa péssima gestão de recursos terrivelmente escassos.
E o facto de se tornar oculta ou quase, tende a agravar esses defeitos de base.
A ilusão destes procedimentos é-nos revelada agora, sem sofismas, perante a continuada deterioração das contas com o exterior a que se assistiu em 2007, contrariando as expectativas iniciais - que o BdeP alimentou entusiasticamente, é bom não esquecer – de uma menor expressão do défice que acabaria por não se confirmar.
Temos um défice corrente de quase €16 mil milhões, equivalente a 10% do PIB - praticamente o dobro, em termos relativos, do tenebroso défice externo dos USA.
Só o défice dos Rendimentos - tema que aqui já abordei e a que espero em breve voltar - atingiu 4,6% do PIB em 2007, com a impressionante cifra de € 7.376 milhões, mais € 1.000 milhões que em 2006.
Pior ainda, as primeiras indicações para 2008 mostram uma forte deterioração destes défices, podendo vir a registar-se números “record”de toda a nossa história económica.
Por este caminho, vamos mesmo muito mal...
Neste quadro, não me venham falar, por amor de Deus, em “sucesso” da política orçamental ou económica! Tenham dó de mim!
Aí estão as contas externas, implacável detector de mentiras, a provar que tal “sucesso” é essencialmente cosmético, é só fumaça como se dizia há uns anos...
12 comentários:
Pois é!...
E eu a pensar que a nossa prosperidade se devia à prosperidade da nossa economia!... No final é o exterior que vai aguentando o nosso alegre modo de vida, o nosso alegre endividamento, as nossas férias no Brasil,a compra da nossa casa?
Oh Tavares Moreira, o meu amigo, contrariando assim o que Sócrates diz, está a raciocinar bem?
Oh Pinho Cardão, não me arranje sarilhos, eu não contrariei ninguém, a minha intenção não é contrariar seja quem for!
A única contrariedade é ditada pelas contas externas, essas é que contrariam, sem qualquer intervenção da minha parte pode crer - para ser sincero, posso garantir-lhe até que o meu contributo pessoal para as contas externas até é positivo:
Só consumo/adquiro produtos que sejam genuinamente nacionais, exporto alguns serviços - está a ver como não sou contraditor, bem pelo contrário sou até muito colaborante para os desígnios do sucesso económico português?
Começo citando as palavras do meu conhecido Medina Carreira " As contas não mentem!".
Quanto ao lifting que foi feito nas Estradas de Portugal e SNS digo que é um lifting à moda de Lili Caneças. Estique a cara, mas do pescoço para baixo está toda "amarrotada". Nas contas públicas o caso é idêntico. Põe-se o défice na linha, e atira-se as despesas para debaixo do tapete, de preferência bem longe dos olhos de Almunia.
Bem.. Sócrates anunciou o fim da crise. E eu pergunto com toda a legitimidade. Se a crise chegou ao fim, apesar do aumento do crédito mal parado e outros sintomas, porquê uma reacção tão negativa quanto à ideia de Menezes da diminuição da carga fiscal?????
Abraço
Só que esse fim de crise, meu caro André, se foi conseguido, foi-o justamente à custa do aumento da carga fiscal e não da diminuição sustentada da despesa pública improdutiva.
Para quem está convencido de que vai continuar a gerir o orçamento do Estado por mais alguns anos e não acredita que os recursos libertados aumentariam as reservas de investimento das empresas e as poupanças das famílias, sente que que a diminuição da receita significará agravar o desequilibrio das contas públicas porque o controle de que fala o Engenheiro Sócrates é precário. E também sabe que para que essa precariedade não se torne evidente não restam outras hipóteses para além do disfarce da natureza pública da despesa, como os exemplos que Tavares Moreira recordou aqui bem ilustram, ou então atirar com alguma dela para debaixo do tapete.
Falta saber se, com a maioria absoluta em risco, se a tentação eleitoralista não falárá mais alto. É o único imponderável.
Caro Tavares Moreira,
Vamos ver se nos entendemos. Se o meu caro continua a encontrar números maus, o governo não vai ter tempo para governar o país. Agora vão ter que fazer outro decreto para definir qual é o défice externo para 2008. Que maçada...
Caro André,
O Sócrates falar em fim da crise porque acertou (ou, melhor, ajeitou) uma subtracção nas contas do estado revela bem os méritos que tem para ser primeiro-ministro. Pode ser até que se lembre que quem tem crises é o país, não é o estado. Esse vive muito bem...
Caro André,
Essa de comparar a "ultrapassagem" dos problemas orçamentais aos trabalhos de lifting produzidos na socialite Lili é de génio!
Não me surpreenderia que o meu Amigo, a continuar nesta descoberta de ideias fulgurantes, venha a ser a edição portuguesa do Mark Zuckerberg, amealhando uma considerável fortuna em poucos meses, vendendo ideias geniais através da Net!
Caro Ferreira de Almeida,
A questão parece-me um pouco mais séria ainda - não sei se meu Amigo se aprecebeu da dificuldade que a D.G.O. teve em publicar a informação sobre a execução orçamental referente ao mês de Fevereiro...
Habitualmente publicada, desde há muito tempo, no dia 15 ou dia útil imediatamente a seguir ao mês da execução (seria a 16 de Março), desta vez a informação só foi libertada no dia 20 de Março...e é já muito visível o abrandamento da receita fiscal, a evolução só não foi pior graças às receitas não fiscais.
Não será de estranhar que este ano ocorram grandes dificuldades no cumprimento dos objectivos de receita, dado o abrandamento previsível da actividade, nomeadamente do consumo privado.
Caro Tavares Moreira,boa tarde!
Foi o meu Amigo que pediu uma redução de impostos?
"Notícia Jornal de Negócios
GOVERNO PREPARA ANÚNCIO DE DESCIDA DOS IMPOSTOS
O Governo vai avançar com uma descida dos impostos, apurou o Jornal de Negócios. O anúncio pode mesmo ser feito esta tarde, depois do INE tornar público o reporte do défice orçamental, que ficou abaixo de 3% do PIB. Em causa poderá estar agora uma descida do IVA para 20%."
Boa tarde Rui Fonseca,
Eu não pedi, eu PREVI como meu Amigo bem se recordará.
E ela aí está, motivada essencialmente pelo anúncio, há algumas semanas avançado pelo PSD, da oportuna apresentação de uma proposta de redução de impostos.
referi, em post a esse propósito, que estava curioso de ver a reacção do Governo.
E curioso sobretudo depois de o PM ter considerado "leviana e irresponsável", há apenas 15 dias e com o apoio habitual das vestais do regime, a proposta do PSD...
As mesmas vestais do regime que agora acenam com a cabeça, em sinal de aprovação, para esta redução de impostos...
O comportamento destas vestais é sem dúvida das coisas mais hilariantes deste episódio.
Agora estou convencido de que haverá mais reduções no "pipe-line", para animar as hostes.
Os hospitais, a EP-EPE e os demais mecanismos de abosrção de despesa, trabalharão a todo o vapor, endividando-se até ao céu, até ficarem em brasa, para abrir espaço para reduções de impostos até Outubro de 2009.
Alguém terá que pagar a factura mais tarde, mas ainda bem que os impostos baixam - alguma coisa se fica a ganhar.
A despesa terá de ser apertada à bruta, a partir de 2010, mas até lá muita água correrá por baixo das pontes...
Tenho pena mas não me parece que venha a ter essa sorte. Precisaria de projecção. Manuel Pinho projectou o ALLgarve. Talvez quando ele promova o OUportoH eu tenha alguma sorte.
Mesmo assim, estou desconfiado que seria amplamente ultrapassado pelo Cozinheiro- Chefe, senão vejamos. Primeiro consegue cozinhar contar para 6,1% e no ano seguinte 3,9%, indo assim contra todas as doutrinas macroeconómicas que afirma que é preciso um período longo de tempo para reflectir tamanhos resultados. Tais eram impossíveis de serem publicados se não estivessem repletos de inverdades!!!
Em segundo lugar e humilhando muitos economistas estudiosos, numas breves palavras afirmou que baixar os impostos não tem efeitos na economia. Talvez a existência de Offshores expliquem as "brilhantes" declarações do CC.
Assim sendo, vejo-me obrigado a desistir.
A projecção do All-garve foi contra a parede mais próxima...e ali ficou com os contribuintes atentos a chorar os 6 milhões deitados à rua, meu Caro!
Já agora, que diria o Ilustre economista e fiscalista Mário Soares, que veio aplaudir a descida do IVA`(creio que ninguém se terá lembrado de lhe perguntar "O que é o IVA?", era uma maçada...) -da temática que aqui temos estado a discutir?
Muito provavelmente veria como um passo atrás do neoliberalismo perante o socialismo!
Ele diz que é normal um jovem começar pela a extrema-esquerda para chegar ao socialismo na idade adulta. E eu pergunto-me. É normal um jovem ser de extrema-direita para acabar CDS??
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