Hoje, para não variar, foi um dia de trabalho intenso. Alguém andou atrás de mim, via-se pelas tentativas telefónicas. Não me foi possível atender o número, que me era desconhecido, porque tinha colocado o telemóvel em modo silêncio. Às 22 horas e picos voltou a tocar. Atendi. Era um jornalista, de uma nova revista, que queria ouvir a minha opinião sobre a proibição de fumar em espaços fechados. Se concordava ou não. Queria uma resposta curta. Qual resposta curta! Tive de dissertar um pouco sobre esta matéria e, ao mesmo tempo que ia dizendo as razões, lembrei-me de um dos tais textos que tenho andado a escrever, mas que não publiquei no Quarta-República. Pensei: não vou esperar por sábado...
Chego a casa ao fim de um dia de trabalho e leio as notícias. Tento fugir às desgraças nacionais, capazes de desencadearem crises depressivas ao mais empedernido dos humanos, mas não consigo. Procuro algo menos deprimente e esbarro numa, muito interessante, relacionada com a entrada em vigor da nova legislação antitabágica espanhola. A lei proíbe que se fume em todos os espaços fechados, em todos os recintos hospitalares, incluindo as zonas ao ar livre, como as áreas de ócio infantil abertas. Medidas ajuizadas que estão a provocar reações estranhas em alguns “españolitos” nicotino dependentes, que, em represália contra a lei, decidiram passar a ir a Elvas comer, porque muitos restaurantes portugueses permitem matar o vício entre duas garfadas ou entre "dos copitas". Os agentes de restauração da raia portuguesa esfregam as mãos de contente, e estão convencidos de que o negócio vai melhorar. Triste ilusão.
Faz todo o sentido proibir que se fume em todos os locais fechados. Apesar da legislação portuguesa permitir que se fume nalguns espaços, desde que estejam criadas certas condições, foi apenas um mero remendo com o objetivo de minimizar as reações negativas dos homens de negócios da restauração, que, mesmo assim, estrebucharam, fazendo-se acompanhar dos indefetíveis viciados, alguns dos quais não tiveram tento na língua. Recordo, perfeitamente, os epítetos de fundamentalistas, de talibãs, de fascistas, de nazistas, palavras carregadas de uma raiva sem limites para quem tem de repor hora a hora, ou ainda menos, os seus níveis de nicotina sérica, desprezando, ostensivamente, os que têm de fumar contra a sua vontade.
Os trabalhos científicos sobre esta matéria, fumo passivo, não são de agora, há muito que se sabe sobre a sua nocividade. De qualquer maneira, e para exemplificar, as crianças são muito vulneráveis aos efeitos do tabaco. Assim, os pais que, em princípio, e por definição amam os seus filhos, não podem, não digo que não devem, repito, não podem fumar ou conspurcar o ambiente, porque provocam graves problemas de saúde nas crianças. Ao fim de alguns minutos de exposição ao tabaco ocorrem alterações genéticas e, em caso de dificuldade em as reparar, poderão ocorrer graves problemas a médio ou a longo prazo. Os filhos de fumadores apresentam, também, valores da pressão arterial mais elevada, a qual constituirá um ponto de partida para aumentar o risco cardiovascular no futuro. Por dia estima-se que morram 3.000 pessoas por cancro do pulmão devido ao fumo passivo. Se adicionarmos as provocadas por outras patologias, sobretudo cardiovasculares, é fácil de concluir o enorme potencial de prevenção que está debaixo da assinatura do legislador. Os que fumam podem continuar a fazê-lo, mas têm de respeitar regras, cada vez mais apertadas, a fim de que seja salvaguardada a saúde dos outros e a dos seus filhos.
Os problemas relacionados com a nocividade do tabagismo passivo, como já afirmei, não são de hoje, o que surpreende é o laxismo, a lentidão e a inércia por parte dos responsáveis políticos ao não porem travão a concretas violações ambientais. Alguma coisa já foi feita, mas há ainda muito mais por fazer. Quando? Só depois de muitas pessoas morrerem, desconhecendo que o seu sofrimento poderia ter sido perfeitamente evitável. Muitos dos riscos que nos cercam são desconhecidos, ou, então, não conseguimos eliminá-los, o que é perfeitamente humano, mas quando temos conhecimentos de elevada qualidade, e em quantidade, o que impede corrigi-los? A par do egoísmo de muitos, há quem veja uma forma de melhorar o negócio, borrifando-se para a sua saúde, a dos seus trabalhadores e a dos seus filhos. Sempre são uns euros a mais que entram no bolso, que, no caso de Elvas, ainda pode ajudar a encher o depósito de gasolina em Badajoz. Entretanto, os “españolitos”, felizes por encherem a mula, e de terem despejado baforadas de tabaco em espaços fechados, regressam a Badajoz à espera dos seus euros pródigos...
13 comentários:
Plenamente de acordo. Não que o caro Prof. necessite da minha opinião. As respostas dos fumadores não esperam pela demora. Os seus argumentos irão focar, provavelmente, nos seus direitos (não nas obrigações com a sua família, com os seus semelhantes); que a saúde a eles pertence, que conheceram fumadores que viveram até aos 80 e aos 90 anos....
Conheço, por experiência, a fase fumadora e agora a não-fumadora.
Bem, eu (ainda) sou fumadora e no entanto concordo com o Prof. massano cardoso, acho que não deve ser permitido fumar em espaços fechados, tal como não se deve fumar perto de quem não fuma ou a quem o fumo incomoda, mesmo que ao ar livre.Mas não vejo razão nenhuma para se proibir fumar nos espaços abertos, como já acontece nos EUA, desde que se deitem as pontas do cigarro no caixote do lixo mais perto...
Então, catarina, já é ex-fumadora? Muitos parabéns, mas espero que não se torne fundamentalista...:)
: ) Obrigada, cara Suzana! Há já alguns anos que não faço parte dos fumadores e sim, sou fundamentalista no que diz respeito ao meu espaço! : ) Não suporto, sinceramente, o cheiro do tabaco. Mesmo num espaço aberto, como uma esplanada, por exemplo, o fumo me incomoda! Quem diria?! Não critico quem continua a fumar, claro que não. E posso, perfeitamente, estar com quem fume desde que o faça bem longe de mim! : )
Sou fumador!
Sou essas coisas todas que o senhor diz e as outras que tem em pensamento mas não tem a coragem de dizer... sou isso tudo,eu me confesso!
É verdade, nós não merecemos a complacência que os pedófilos, os homicida ou os fumadores de erva ou haxixe merecem... nós deviamos é ser abatidos!
Mas antes que lá chegue permita-me colocar uma ou duas questões:
1 - Qual a razão porque não pode haver espaços fechados possuídos por fumadores, com empregados fumadores, para fumadores?
2 - Qual a razão porque este Estado que nos persegue (mas que cobra altos impostos sobre o tabaco) distribui gratuitamente kits para fumadores de erva e axixe?
3 - Sendo o fumo do tabaco o pai e a mãe de todos os males deste mundo, será que o produto que é expelido pelos escapes dos automóveis é um produto inócuo?
Deve ser, certamente, pois que ainda não vi ninguém minimamente preocupado com isso e, a proibição que se avezinha de fumar em espaços abertos, deve ser para evitar a poluição do ar purificado pelos automóveis.
: )))) … como eu estava a dizer…
Catarina,
Não é bem como estava a dizer... eu só peço um cantinho em que nós pecadores nos possamos reunir; é pedir muito?
E, já agora, que comentários tem a fazer no que concerne à distribuição gratuita, pelo Estado,de kits para fumar erva ou haxixe? e no que diz respeito ao ar purificado pelo escape dos automóveis?
Ze Muacho,
Se me permite o coloquialismo, apenas achei piada à forma como se expressou. A maneira como interpretei o seu comentário (aqui do meu canto!) é como se este fosse, digamos, uma crítica ao conteúdo do texto do Prof. Desculpe se a intenção não foi essa. Se interpretei mal. O Prof. Massano Cardoso está a dar a sua opinião bem informada sobre o assunto e não está a impor coisíssima nenhuma a ninguém. Tem todo o direito de ter o seu canto para fumar; para fumar os seus cigarros e, simultâneamente e de forma passiva, os cigarros das outras pessoas. Mas desde que não incomode os não fumadores. E é por isso que concordo que não se deve fumar nem em espaços abertos porque até em alguns destes espaços – como esplanadas de cafés ou restaurantes – o fumo perturba os que com muito sacrifício se viram livres deste vício. Quanto às outras questões, pois essas dariam pano para mangas e já me alonguei... Boa noite!
Catarina,
Desculpe voltar a insistir mas tocou no cerne da questão quando se refere ao estar numa esplanada e se sentir incomodada porque alguém estar a fumar; curioso que o cheiro a fumo do tabaco a incomode e não se sinta perturbada pelos fumos emanados por centenas ou milhares de escapes que vão passando; é isto que eu não consigo perceber!
Quanto ao resto estamos de acordo; eu reconheço os direitos dos não fumadores… mas por favor vamos lá todos ter bom senso.
Importante e, pedagógico este texto do caro Professor Salvador.
O mais difícil no processo de motivação para deixar de fumar, por aquilo que me apercebo, é a tomada de consciência. Consciência do mal que provoca ao fumador, mas sobretudo da interferência na saúde alheia.
Quanto à questão da casa de Elvas... perdão, dos restaurantes de Elvas... bom, quanto a isso eu vejo de uma forma diferente.
Eu vejo a atitude dos empresários da restauração raiana, não como aproveitamento económico, mas sim como vingança.
É! A "coisa" remonta à época medieval, á rivalidade entre portugueses e castelhanos, à defesa e demarcação das fronteiras.
E... como nunca os conseguimos vencer, somente conseguimos defender-nos, agora os elvenses, apanham-nos à traição.
(ai Bartolomeu, não perdes a oportunidade para exibir a tua mediocridade argumentativa... tenham paciência...)
Ó Ze Murcho... sabia que o tabaco pode provocar tambem impotência sexual?
Não sei... por mim está tudo bem, quanto a si... cabe-lhe a decisão(por enquanto)
de optar por aquilo que lhe der mais prazer.
(estão abertas as hostilidades...)
hihihihi!!!
Permitam-me que deixe aqui algumas impressões tomando por referência o longínquo país que me acolhe: o Japão.
Aqui, distintamente do se tem verificado na Europa, a legislação tem privilegiado um critério muito mais simples e lapidar: a destrinça entre espaço público e espaço privado, tão-só.
Muito sucintamente, neste país, é, em geral, proibido fumar em qualquer espaço público — inclusive, aliás, antes de mais, na via pública —, mas no que se refere a espaços privados e em particular, áreas de restauração e cafetaria, a escolha cabe tão-só aos proprietários do espaço em causa, havendo lugares para todos os gostos — para fumadores, para não-fumadores e para ambos, com a salvaguarda de zonas bem delimitadas, separadas, e dotadas dos necessários equipamentos destinados a salvaguardar a escolhas de cada um e a preservar a saúde daqueles que a prezam mais.
Escusado será dizer, que este sistema funciona bastante bem e sem queixas de maior.
Este deveria ser, em meu modesto entender, o único critério plausível.
Em tudo o demais, nesta questão estou com o amigo Zé Muacho: elege-se a luta contra o tabagismo como prioridade, mas no que toca a tudo o mais que, quotidianamente, sejamos fumadores ou não, somos forçados a inalar de nocivo, sobretudo se vivermos em grandes centros urbanos, e sobretudo em espaços bem abertos! quanto a isso, nada a fazer, não é assim?
Fazer do tabaco e do tabagismo as grandes e perversas bruxas do nosso tempo que urge queimar no grande auto-da-fé da saúde pública, ou é falta de bom-senso ou é pura hipocrisia ou é ambas as coisas. Mas no que concerne às directivas da U.E. nesta e noutras matérias, inclino-me cada vez mais para a 3ª hipótese.
Meus melhores e mais amigáveis cumprimentos a toda a equipa do 4R,
de Fukuoka, Japão,
Luís Filipe Afonso
“Sou fumador! Sou essas coisas todas que o senhor diz e as outras que tem em pensamento mas não tem a coragem de dizer... sou isso tudo,eu me confesso!”
Quero-lhe dizer o seguinte: Não pode justificar um mal para a saúde de outrem com outros males! É ridículo a sua posição e tenho coragem de dizer-lhe o que penso a si e a quem quer que seja. Essa de dizer que “não tem coragem de dizer” não bate certo com a minha forma de pensar e de ser. Aquilo que pensei disse-o, se o senhor julga que tenho outros pensamentos acerca dos fumadores está errado. Quanto a outras fontes de males para a saúde humana, basta ver toda a legislação e medidas que estão a ser tomadas, quer no tocante aos veículos automóveis, quer às indústrias poluidoras e muitos outros. Há uma preocupação com estes problemas de cariz ambiental quer a nível exterior quer a nível interior, neste último caso um problema de saúde ocupacional. Não tenha nada a criticar quanto às razões que o levam a si e outros, como a mim próprio, noutra época, a consumir tabaco. Sejam quais forem as razões que levem as pessoas a fumar, eu não tenho direito de ser moralista. Nem pretendi sê-lo. Tenho todo o direito de afirmar que a proibição do tabaco em locais fechados, e em certos espaços abertos, é uma medida mais do que correta e se há pessoas que respeitam o direito dos outros, os não fumadores, há muita gente que não o faz, e quando não respeitam, só há uma alternativa, levar com uma lei em cima.
Caro Professor Massano Cardoso:
Saúdo o regresso de V. Exa!. Foi notório e longo o espaço vazio dos seus excelsos posts.
Regresso ao tema do post que sintetizo como sendo a questão do tabagismo, as múltiplas consequências para saúde, nomeadamente o cancro do pulmão, e, por ironia, a confirmação do dizer popular, “com o mal dos outros vivo eu bem”, isto a propósito da vitalização da restauração em Elvas.
Fumei demasiados anos, tantos que não os quero contar, nem tão pouco saber se, por isso, contraí lesões irreversíveis ao meu organismo. Há quatro anos, finalmente libertei-me, não com a mesma facilidade que muitos apregoam - da noite para o dia, prontos acabou, não fumo mais esta merda!... Não. Só depois de muitos avisos sérios, do organismo dar sinais de repleto, e talvez o mais importante de todos recusar-se a andar cem metros em passada larga…
Compreendo portanto o drama dos fumadores; não é fácil o ato voluntário de deixar de fumar quando isso nos dá prazer, ajuda a pensar, e tempera o humor…
E depois que fazer daquela mão que leva o cigarro à boca!? Bem…desta mão, muita gente, sobretudo os mais jovens, ocupam-na com copos de cerveja, principalmente em espectáculos realizados em recintos fechados como assisti no Pavilhão Atlântico, aquando do concerto dos Supertramp; eram raras as mãos sem um copo, até eu fui contagiado…
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