Continua o tsunami das revoluções nos países árabes. Hoje foi Omã a juntar-se à turbulência, enquanto milhares de egípcios que não foram resgatados da Líbia se amontoam na fronteira com a Tunísia. No Líbano manifestantes clamam contra o confessionalismo e a partilha de poder entre cristãos e muçulmanos, cruzam-se as notícias sobre o Irão, o Iémen, o Conselho de Segurança da ONU condenou por unanimidade o ex-regenerado Kadafi, por todo o lado chovem opiniões, leituras e previsões, enquanto os países ocidentais procuram reajustar as suas políticas à defesa dos seus interesses futuros em zonas de tão súbita fragilidade política. A dura realidade do pragmatismo político levou já à demissão da Ministra dos Negócios Estrangeiros francesa, Michèle Alliot-Marie, no cargo há poucos meses, mas na vida política há quase dez anos, que foi forçada a demitir-se perante o coro de críticas à sua actuação quando, numa precoce avaliação da situação, propôs a ajuda francesa para a manutenção da ordem na Tunísia, depois de regressar de férias naquele País na altuira em que" começou a revolta. Acusada de ter viajado no avião de um grande empresário tunisino amigo do presidente deposto, resistiu até que a pressão passou a envolver a sua família e os negócios que tinham com a Tunísia, numa “devassa da sua vida pessoal com o objectivo de me fragilizarem”, escreveu na sua carta de demissão, publicada na íntegra no "Le Monde". Explica ainda que “apesar do sentimento de não ter cometido qualquer falha” e de sempre ter agido de acordo não só “com a legalidade mas também com as exigências da moral, da dignidade e da lealdade”, tem em demasiada conta a política ao serviço de França para "aceitar ser utilizada como um pretexto para fazer crer que há um enfraquecimento da política externa francesa". A demissão foi aceite, os estilhaços da situação no mundo árabe começam a fazer rolar as cabeças, na urgência de se tecerem agora novas teias que sustentem a frágil comunicação com um novo mundo que emerge e que não se sabe o que será.
4 comentários:
É nestas alturas, quando os interesses de ontem já não contam, que se vê o quanto a política também se faz com hipocrisia… Mas é assim, o mundo está em mudança e não sabemos para onde…
Claro que há hipocrisia, caro jotac, e se for isso já é uma sorte porque a alternativa é pensarmos que não há valores nenhuns e que se aceita o bom e o mau com toda a indiferença.
Suzana
A hipocrisia ou cedência, como lhe queiramos chamar, sempre foi utilizada na política externa, a cobro de uma cartilha de interesses, em que os resultados são aparentemente vantajosos para ambas as partes. O mundo ocidental necessita dos recursos naturais das ditaduras e como tal não pode deixar, com a referida hipocrisia, de aceitar práticas, designadamente em matéria de atropelos aos direitos humanos, com as quais não se identifica.
Parece ser ténue, em momentos de paz, a fronteira entre a hipocrisia política e os negócios e amizades que a mesma permite. A ética e a promiscuidade não levantam dúvidas. Mas tudo parece mudar, quando a paz dá lugar à guerra e de repente o que se considerava ser um comportamento normal passa ser intolerável.
A hipocrisia também tem uma forma e um tempo. Sendo aceite como princípio político, não deixa de, volta e meia, trazer à superfície os custos do jogo de interesses e cedências da diplomacia internacional.
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