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quinta-feira, 19 de maio de 2011

Palavra que vi

Palavra que vi. Vi no telejornal da RTP 2, em repetição do que já tinha dado na 1. Vi que a repórter enviada a NY para cobertura do caso DSK foi a Bronx, onde fez um “directo”. E que directo foi esse? Pois fiquem sabendo que começou por interrogar diligentemente uns transeuntes sobre que tipo de bairro era aquele. Este é um bairro calmo ou é um bairro problemático, onde há insegurança? , perguntava a um jovem afro-americano. O jovem olhou-a intrigado, hesitou e por fim respondeu com ar de troça, fique cá uns dias e logo vê.
Ela foi então direitinha a um prédio de tijolo, igual aos outros todos e aí parou e perguntou a outro cidadão se era ali a morada da mulher que tinha apresentado queixa contra o director do FMI. O homem disse que sim. E conhece-a? Que sim, que era mulher discreta e pessoa de trabalho. Segue-se a repórter em directo a explicar que ninguém queria levá-la até ao apartamento em concreto, mas depois lá apareceu um voluntário que, com cara de poucos amigos, se dispôs a orientar a equipa de reportagem.
Por esta altura podíamos perguntar-nos qual era a ideia, talvez esperar que alguém abrisse uma frincha ao engano, ela metia o pé para impedir o recuo, avançava o microfone e perguntaria assim à queima roupa se era verdade ou mentira o que circula nos jornais, diga lá aqui à RTP Portugal, dê-me lá essa caixa, foi ele ou foi a senhora quem começou tudo? Faz parte de uma conspiração ou não? E depois, heroicamente, a repórter sairia agarrada à gravação com a imagem da mulher cuja identidade está protegida pela polícia - ou de quem quer que aparecesse a espreitar pela frincha, tanto faz.
Se tudo isto já era surreal, as cenas seguintes são inconcebíveis. A câmara filma a entrada no elevador, o dedo do guia a pressionar o botão para o andar num grande plano emocionante, depois os longos e deprimentes corredores típicos de um prédio miserável, por fim a porta escura, com um postigo com rede.
A repórter esclarece, virada para a câmara e numa voz de grande suspense, estamos agora à porta do apartamento onde a presumível vítima vive há mais de seis meses, mas dizem que desde aquele dia que não voltou cá, está algures, fortemente guardada por medidas de segurança. Vamos ver. Toca à campainha. Espera. Nada, ninguém abre. Pois, não está cá ninguém, diz ela. E então, não fosse estar alguém a tentar enganar o seu faro policial, encosta o ouvido à porta e aguarda uns longos instantes, a detectar eventuais ruídos que pudessem denunciar a presença de alguém! No nosso écran ela aparece assim, colada à porta, o ouvido encostado, os olhos expectantes de emoção. Desistiu, desiludida. Não, nada, devia estar mesmo vazio o apartamento, era mesmo verdade que a senhora não estava lá. E a câmara filmou o mesmo caminho de volta.
Entre o anúncio da "reportagem" e a "reportagem" propriamente dita, foram uns largos minutos de telejornal.

Palavra que vi.

11 comentários:

Tavares Moreira disse...

Cara Suzana,

Belíssima descrição desse arrojado, muito arriscado mesmo trabalho de reportagem da "nossa" delta RTP!
Chega a ser comovente a situação de risco extremo a que se expôs a reporter, para nos trazer informação da melhor e bebida na fonte!
Que pobreza...

Bartolomeu disse...

Vai ver, cara Drª. Suzana, que a reporter fez escola com os famosos detectives Duarte & Companhia.
http://www.youtube.com/watch?v=fcp2oKnMy8M
Mas ao que parece, ainda vai ter de roer muitos ossos, até que consiga chegar-lhes aos calcanhares, se a sorte a ajudar...

Gonçalo disse...

Serviço público que custa 1 milhão por dia...

Massano Cardoso disse...

Meu Deus! Que drama! A senhora deve andar a treinar para ser atriz e realizadora ao mesmo tempo. Vão ver que daqui a uns tempos irá surgir uma nova estrela no firmamento...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
Tudo a bem do serviço público de televisão para que mostre serviço e sirva o país com um serviço de qualidade!

A.L.R disse...

Serviço público que custa um milhão por dia e 4,50 euros na minha e na vossa factura da luz.
Privatizar esse ninho de boys e girls é uma necessidade urgente!!!!
E é uma necessidade também para a nossa saúde mental, porque os programas da RTP são um atentado à nossa inteligência.

Pinho Cardão disse...

Uma vergonha de reportagem. Mas a grande culpa não é do repórter. É de quem o enviou.Um desperdício intolerável de recursos num tema por demais coberto por todas as agências internacionais.
Num país a saque, uma informação pública a saque.

Anthrax disse...

:O!!!!!!
Eu estou a pagar 4,50 € na factura da luz para isto???? :O!!

4,50 €!!!!!! :O!
Vou já ver que mais é que ando a pagar... filhos de uma grandessíssima... "mamacita".

Anónimo disse...

Não saíria mais barato ao erário público internar essa gente que permite coisas destas?

Pedro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Suzana Toscano disse...

Esperemos não chegar a esse ponto, caro Paulo, mas já não digo nada, também vejo pouca televisão, o que me leva a ficar ainda mais preocupada porque quando a ligo dou com isto...
Caros comentadores, não sei se será um problema de privatização, os outros canais não me inspiram mais confiança nem, em geral, nos poupam a semelhantes espectáculos de nos tomar por idiotas. Um pouco de respeito por aqueles a quem apresentam o trabalho, isso sim, seria de facto fantástico, será pedir muito?