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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A abstenção e a arena política

Muito se tem dito e escrito sobre os resultados eleitorais e os malabarismos contabilísticos que intervieram nesse balanço trouxeram à tona insuspeitas habilidades matemáticas. Diz-se que os números, bem torturados, confessam o que se quiser... O maior quebra cabeças parece ser o da abstenção, em relação ao qual um coro de carpideiras arrepela os cabelos e reflecte dolorosamente sobre o muito que será preciso mudar “na política”.
O candidato vencedor manifestou, muito justamente, a sua indignação pelo modo como decorreu a campanha eleitoral, assumidamente dedicada por outros candidatos ao ataque pessoal, ao inquisitório e ao culto medíocre da suspeição. Para os que se arrepiaram com tal franqueza e recomendavam mais hipocrisia política, deixo aqui um excerto da entrevista que Maria de Belém Roseira, mandatária nacional do então candidato Manuel Alegre, deu à TSF no dia 14 de Janeiro:
"O que me preocupa mais é a taxa crescente de abstenção que tem existido nos vários actos eleitorais e designadamente em (re)eleições presidenciais. (…) Acho que estes temas (BPN) serem depois considerados como ataques pessoais ou porem em causa a honorabilidade das pessoas é que fazem com que as pessoas se afastem. Pessoalmente tenho tido sempre uma intervenção no sentido de considerar que fazer do espaço político uma arena é absolutamente considerado inadequado para as pessoas. É a minha visão. Eu própria não gosto de participar num espectáculo em que as pessoas se agridem umas às outras e em que depois nos corredores se encontram e se abraçam esfuziantemente. Acho que as pessoas não gostam deste tipo de coisas porque não as entendem. (…) quando há uma diminuição do nível das intervenções , quando há uma agressividade na linguagem, que eu pessoalmente não aceito e que critico de uma maneira feroz, nós transmitimos para a opinião pública uma imagem que é a de que, se as pessoas não se entendem umas com as outras, como é que vão entender-se para conduzir os nossos destinos. Essa é uma das coisas que mais contribui para cavar esse divórcio das pessoas pelo que se passa no mundo da política."
Foi pena que não tivessem ouvido a mandatária, mas vão sempre a tempo.

3 comentários:

Bartolomeu disse...

A meu ver, é possível fatiarmos a taxa de abstenção, para melhor a podermos entender. A opinião expressa por Maria de Belém, é sem dúvida uma das grossas fatias mas, outras ha, às quais deve ser dada a devida importância.
E... para lhe ser muito sincero, cara Drª. Suzana, não me parece que a argumentação "raivosa" com que alguns candidatos decidiram ferir Cavaco Silva, seja responsável por uma grossa fatia dessa taxa, a avaliar pelos resultados obtidos por Defensor de Moura e por Francisco Lopes. Já a percentagem de votos obtida pelo candidato José Manuel Coelho, poderão representar algum do descontentamento sentido em relação à forma como Cavaco Silva exerceu o seu primeiro mandato como Presidente da República.
De qualquer modo, e pegando ali no provérbio que o caro Dr. Tavares Moreira postou, também um outro, muito vélhinho diz: "Quem vai à guerra, dá e leva".
Pessoalmente detesto que se considere o confronto de ideologias e de programas eleitorais, como uma batalha, da qual sai um vencedor. Quando assim é, mesmo vencendo, ele sairá inevitávelmente ferido.
Lamentávelmente, alguns "concorrentes" ao cargo de presidente, optaram pela estratégia do ataque pessoal, esquecendo-se ou sendo esse o seu único propósito, de apresentar e defender programa. Outros apresentaram-se cientes de que o país precisa de uma intervenção forte e determinada. Ao vencedor, exige-se agora que cumpra sem hesitar a palavra dada e que seja realmente e determinadamente interventivo. Só assim, penso conseguirá galvanizar as vontades portuguesas e transformar a abstenção em participação.

Adriano Volframista disse...

Cara Suzana Toscano
a)Sobre o nível de abstenção, acho que seria de todo o interesse ler os comentários que o director da AXIMAGE realizou ao Correio da Manhã: existem, de acordo com os cálculos dessa empresa, cerca de 1.25 milhões de eleitores a mais nos cadernos. Caso seja assim, a abstenção real seria de +/- 46%
Sobre os resultados, Maria de Belem Roseira, como cita, aponta o dedo ao problema: um divórcio crescente entre o eleitorado e os políticos.
b) Se é verdade que conseguimos conviver, desde há 30 anos, com +/-20% do eleitorado representado na AR mas, sem participação no governo( assim como aquelas famílias que "escondem" o filho defeciente); não menos verdade é o facto de, existirem vários, repito, vários indicadores preocupantes quanto ao "mercado" político; aqueles indicam que, os nossos políticos estão a perder "quota de mercado"; deveria deixar aos políticos, como a qualquer responsável de empresa, preocupado.
c) Nos meios geralmente bem informados é aceite, (em palavras lhanas: "toda a gente sabe") que, a "campanha suja", foi implementada com elevado "profissionalismo". Cruzou-se um rubicão; poderemos considerar, em alternativa que, se ultrapassou as marcas ou que a alienação dos "clientes" em relação ao produto isso permite.
Como eleitor,contribuinte e observador da realidade nacional, o que me interessa é saber que consequências políticas terá o fenómeno "campanha suja". Porque, em face da menção expressa ao facto, terá sempre consequências políticas, seja pela acção, seja pela omissão;ora "isto" que acabo de mencionar é o mais importante.
Cumprimentos
joão

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
A elevada abstenção, os votos brancos e os votos nulos e a votação num candidato que se apresentou "antipolítico" merecem uma reflexão séria. Estes resultados não podem ser uma surpresa. Há muito que sabemos que os portugueses estão cada vez mais desiludidos com o comportamento dos políticos. O descontentamento face à situação económica e social do País também poderá ser um factor que ajuda a explicar os resultados.
O tom difamatório e a mediocridade de comportamentos e ausência de ideias que marcou a campanha vieram dar razão ao sentimento que está instalado na sociedade portuguesa, de falta de credibilidade relativamente ao sistema político.
Estas eleições foram mais um aviso de que o sistema político está doente.
É imperioso que não fique tudo na mesma. O Presidente da República deve ter aqui um papel importante. A confiança que o eleitorado nele depositou ao dar-lhe a vitória é, também, uma esperança para que exerça uma "magistratura activa" que contribua para repor a credibilidade perdida e recuperar a confiança das pessoas no sistema político e no Estado.