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sábado, 10 de dezembro de 2011

Má conduta...

Desde há muito que dedico particular atenção à fraude e à má conduta científica. Não me lembro quando, talvez quando comecei a fazer investigação, quando senti a importância da mesma e, sobretudo, as enormes dificuldades para fazer o que quer que fosse, mesmo as coisas mais simples e básicas. Tantos desaires, tantas deceções, tanto tempo despendido à procura de uma solução, de uma interpretação ou de uma conclusão. De vez em quando, lá surgia alguma coisa, e sentia uma alegria tal como uma criança quando recebe a prenda sonhada, mas, na maior parte dos casos, nada, ou até o oposto do esperado, o que constituía uma surpresa avinagrada, como a provar a idiotice da hipótese.
Sempre admirei e admiro os investigadores que dão novos mundos ao mundo, mas confrange-me, sobremaneira, todos os que, não tendo um mínimo de pudor, são capazes de falsificar os dados apresentando à comunidade científica e à sociedade em geral "grandes" descobertas, muitas delas publicadas em revistas científicas de primeiríssima linha. Depois são descobertos, acabando por serem obrigados a retratar-se, quando fazem! Existe muita literatura publicada sobre esta matéria.
A última notícia de má conduta científica foi praticada por um psicólogo holandês, Diederik Stapel, e tem sido alvo de debate nalgumas das mais importantes revistas. Uma das propostas para minimizar esta conduta, passaria pelo acesso, a todos cientistas, às respetivas bases de dados da investigação, ficando salvaguardados os direitos de uso, a confidencialidade e outros aspetos relevantes. No fundo, a base ficaria sob o escrutínio de qualquer investigador que provaria em qualquer momento a qualidade e o tratamento dos dados. Poderá parecer uma espécie de Big Brother da ciência, mas a mim não me repugna minimamente, pelo contrário, sempre se evitaria o mau uso e fraude com todas as consequências decorrentes. Ou seja, o peer review far-se-ia a montante da apresentação do trabalho e pela generalidade dos cientistas.
Afinal, os cientistas, mesmo alguns de elevada craveira intelectual e técnica podem ser pessoas de caráter mais do que duvidoso, e não é por serem mais inteligentes e capazes do que a maioria que estão isentos de má conduta.
Não é só na economia, na política, no desporto e na "arte", que se encontram vigaristas, também existem na ciência.
Em termos genéricos, quase que poderia afirmar o seguinte: seja qual for a área em que nos movemos, a personalidade e o caráter de uma pessoa está sempre presente. Se um indivíduo é caloteiro e chegar a primeiro-ministro, o que é que poderá acontecer? Um governação com calotes. Se um indivíduo for um forreta assumido e chegar a primeiro-ministro, o que poderá acontecer? Começa a aforrar como um somítico. Se um vigarista chegar à administração de um banco, o que é que poderá acontecer? O bom e o bonito, e o desgraçado do Zé Povinho terá de pagar os dislates financeiros. Existe na ciência um paralelismo, falta de caráter gera pseudo conhecimentos com prejuízos incalculáveis para a sociedade. No fundo, o sucesso, o progresso e o bem-estar das pessoas passa pela forma como se comportam as pessoas. Quando atingem certos lugares, de primeira folha, quer a nível científico, académico, político e económico, não são as suas elevadas capacidades técnicas, científicas ou culturais que marcam a diferença, o que marca é sem dúvida o seu caráter e honestidade e quando não existem em doses mínimas, então, é fácil de prever, o que poderá acontecer...

5 comentários:

Bmonteiro disse...

É a natureza humana, portanto.
Notícia antiga, de um comerciante da Covilhã, há dias durante um jantar/tibórnia, por aquelas bandas.
Tempo do sucesso das novas calças Lois em Portugal, um jovem atrevido que por 2 mil escudos, ficou de trazer um par de Espanha, perto da raia.
Até hoje, sem as Lois nem o dinheiro, mas o jovem negociante desenrascado, foi longe.
Emigrou há perto de meio ano.

Tonibler disse...

Felizmente a vida fez-me contactar com vários ambientes, alguns deles ainda contacto hoje em dia. O militar, o industrial, o financeiro, o mundo dos negócios e o científico. Este, infelizmente, apenas em dois mundos, daquela que é considerada a mãe de todas as ciências - a física - e aquela que é considerada a negação da própria ciência - a Economia. E de uma coisa não tenho grandes dúvidas, o mundo científico é de longe aquele com os valores éticos mais baixos (com a ressalva de só conhecer aqueles dois "sectores" da ciência). E posso-vos garantir que quer o militar quer o industrial são muito baixos, mas não tão baixo como o científico.
Claro que a fraude científica é um caso extremo e muito mais vulgar nas chamadas ciências contemplativas que nas dedutivas, mas há um conjunto vasto de episódios de pequena vigarice que nunca vi acontecer nos "mundos" que pude contactar. E a pequena vigarice acaba por impressionar mais pelo facto de serem pessoas no percentil 99 da inteligência humana.

Bartolomeu disse...

Pois é, caro Tonibler, acho que o problema se amenizaria, se a Real Academia Sueca, instituisse o Nobel para o varredor das ruas que mais se distinguisse.
Mas para isso, teria de ser nomeada uma Comissão de Avaliação, Controle e Aferição (CACA), à qual competiria fiscalizar e classificar,o desempenho dos Técnicos de Limpeza Urbana...
;))

Tonibler disse...

Mas, caro Bartolomeu, se fosse o Nobel que estivesse em causa ou um milhão de euros, eu compreendia. Condenava, mas compreendia. Não, são coisas de miséria. 100 euros, umas aulas de um assistente, uma mesa para um aluno. Não comentam uma dificuldade com um colega porque têm medo que ele vá publicar antes alguma coisa relacionada com isso - e não é a fusão nuclear fria. Eu sempre imaginei o mundo científico como uma comunidade de gente a partilhar o seu conhecimento e a colaborar para uma descoberta maior. Não é, é igual àquelas terriolas onde já só ficaram as velhas, todas as refilar umas com as outras porque não têm mais ninguém com quem refilar, todas a lutar pela atenção do padre porque o lenço de luto delas é mais bonito que o da vizinha...

Bartolomeu disse...

Pois... eu também imaginei, caro Tonibler, de qualquer modo, as velhotas bem podiam partilhar o conhecimento acumulado. Quem sabe, ao fazê-lo iriam aperceber-se de algumas falhas e assim, terem oportunidade de o "afinar"...
;)