Na voragem das medidas que têm sido anunciadas para acorrer à crise, algumas saltam para as páginas dos jornais muito embrulhadinhas em chavões e prontas a ser engolidas como uma colher de salvífico óleo de fígado de bacalhau.
Uma das últimas é a magna questão da acumulação de pensões com remunerações dos que se dispõem a voltar à vida activa depois de terem a reforma da sua vida profissional. Vou excluir deste texto o caso dos políticos, porque é precisamente à conta do “chamariz” dos políticos que se apresenta o tema como indiscutível e até “moralizador”, lançando uma nebulosa sobre a questão de fundo. Fiquemo-nos pois pelo restante universo do sector público.
Essa proibição já existe na lei pelo menos desde o início dos anos 70 e só abrangia o trabalho permanente dos aposentados do Estado, o que se compreendia, porque era o mesmo “patrão” quem pagaria as duas prestações. Mas, por motivo de interesse público, admitiam-se excepções, com redução da pensão ou do correspondente vencimento, até 1/3. Todos os casos careciam de autorização do Primeiro Ministro o qual, até 2005, podia fixar percentagem superior. Nesse ano, porém, a lei proibiu em absoluto a prestação de trabalho ao Estado, a qualquer título, dos que que obtiveram aposentação antecipada e nos outros casos a opção seria no máximo pelo tal terço.
De acordo com o que se noticia confusamente na imprensa, irá também passar a ser proibido o desempenho de funções públicas remuneradas, em acumulação com a pensão, por parte de qualquer pessoa reformada, seja qual for a modalidade ou o sistema de reforma, pelo que eventuais interessados terão sempre que prescindir de uma delas na totalidade. Assim se dissuadem os interessados, é difícil encontrar quem queira trabalhar e assumir responsabilidades sem ganhar nada com isso.
Essas situações, que se encontravam com alguma frequência nas áreas mais qualificadas na função pública, ou em lugares dirigentes para os quais havia poucas pessoas experientes e competentes, não se destinavam, como é óbvio, a “ajudar” os reformados do estado ou das empresas a compor os seus rendimentos, mas sim a aproveitar capacidades e conhecimentos de gente ainda muito válida, por exemplo no ensino universitário ou especializado.
A saída, aos milhares, de muitos funcionários públicos, precipitada pelas sucessivas alterações nas regras de aposentação, não tem sido compensada com a admissão regular de novos quadros, uma vez que há anos que essa admissão se encontra, ao menos formalmente, congelada, assistindo-se em muitos organismos a uma ruptura geracional, senão mesmo à ausência de competências necessárias à autonomia técnica dos serviços.
Por outro lado, no Estado e fora dele, as pessoas reformam-se cada vez mais cedo, pelo que estariam aptas a prestar uma colaboração muito válida se preciso fosse.
O caso dos médicos é exemplar, a proibição levou à proliferação de empresas que os contratavam para, desse modo, continuarem a prestar nos hospitais públicos os serviços de que estes necessitavam, ao ponto de se ter tido que fazer uma nova lei a permitir o seu regresso e de já se ter garantido que serão uma excepção a esta regra “moralizadora” (moralizadora de quê?) que agora se anuncia. Mas há muitos outros casos em que se poderia, com vantagem para ambas as partes, recuperar para o activo muitos dos que sairam precocemente, na linha, aliás, da tão acarinhada tese do prolongamento da vida activa.
Não percebo porque motivo se elimina esta possibilidade de carácter excepcional, que era gerida directamente pelo Governo, bastava simplesmente que não autorizassem se e enquanto não fosse possível ou conveniente, tal como a lei sempre estipulou.
Proibindo estes casos poupa-se na despesa? Duvido muito, a menos que se reconheça que o interesse público já não é critério ou que é um critério que não tem nenhum valor económico.
Uma das últimas é a magna questão da acumulação de pensões com remunerações dos que se dispõem a voltar à vida activa depois de terem a reforma da sua vida profissional. Vou excluir deste texto o caso dos políticos, porque é precisamente à conta do “chamariz” dos políticos que se apresenta o tema como indiscutível e até “moralizador”, lançando uma nebulosa sobre a questão de fundo. Fiquemo-nos pois pelo restante universo do sector público.
Essa proibição já existe na lei pelo menos desde o início dos anos 70 e só abrangia o trabalho permanente dos aposentados do Estado, o que se compreendia, porque era o mesmo “patrão” quem pagaria as duas prestações. Mas, por motivo de interesse público, admitiam-se excepções, com redução da pensão ou do correspondente vencimento, até 1/3. Todos os casos careciam de autorização do Primeiro Ministro o qual, até 2005, podia fixar percentagem superior. Nesse ano, porém, a lei proibiu em absoluto a prestação de trabalho ao Estado, a qualquer título, dos que que obtiveram aposentação antecipada e nos outros casos a opção seria no máximo pelo tal terço.
De acordo com o que se noticia confusamente na imprensa, irá também passar a ser proibido o desempenho de funções públicas remuneradas, em acumulação com a pensão, por parte de qualquer pessoa reformada, seja qual for a modalidade ou o sistema de reforma, pelo que eventuais interessados terão sempre que prescindir de uma delas na totalidade. Assim se dissuadem os interessados, é difícil encontrar quem queira trabalhar e assumir responsabilidades sem ganhar nada com isso.
Essas situações, que se encontravam com alguma frequência nas áreas mais qualificadas na função pública, ou em lugares dirigentes para os quais havia poucas pessoas experientes e competentes, não se destinavam, como é óbvio, a “ajudar” os reformados do estado ou das empresas a compor os seus rendimentos, mas sim a aproveitar capacidades e conhecimentos de gente ainda muito válida, por exemplo no ensino universitário ou especializado.
A saída, aos milhares, de muitos funcionários públicos, precipitada pelas sucessivas alterações nas regras de aposentação, não tem sido compensada com a admissão regular de novos quadros, uma vez que há anos que essa admissão se encontra, ao menos formalmente, congelada, assistindo-se em muitos organismos a uma ruptura geracional, senão mesmo à ausência de competências necessárias à autonomia técnica dos serviços.
Por outro lado, no Estado e fora dele, as pessoas reformam-se cada vez mais cedo, pelo que estariam aptas a prestar uma colaboração muito válida se preciso fosse.
O caso dos médicos é exemplar, a proibição levou à proliferação de empresas que os contratavam para, desse modo, continuarem a prestar nos hospitais públicos os serviços de que estes necessitavam, ao ponto de se ter tido que fazer uma nova lei a permitir o seu regresso e de já se ter garantido que serão uma excepção a esta regra “moralizadora” (moralizadora de quê?) que agora se anuncia. Mas há muitos outros casos em que se poderia, com vantagem para ambas as partes, recuperar para o activo muitos dos que sairam precocemente, na linha, aliás, da tão acarinhada tese do prolongamento da vida activa.
Não percebo porque motivo se elimina esta possibilidade de carácter excepcional, que era gerida directamente pelo Governo, bastava simplesmente que não autorizassem se e enquanto não fosse possível ou conveniente, tal como a lei sempre estipulou.
Proibindo estes casos poupa-se na despesa? Duvido muito, a menos que se reconheça que o interesse público já não é critério ou que é um critério que não tem nenhum valor económico.
5 comentários:
Suzana
As medidas avulsas e a falta de estratégia política para fazer face a evoluções económicas e sociais previsíveis ou para atingir objectivos previamente definidos não deram e não podem dar bom resultado.
Tenho a maior dificuldade em compreender como é que a administração pública pode ser dispensada de centenas de funcionários, em muitas áreas que são fundamentais, sem que esteja assegurada a sua substituição. Não se trata de uma troca numérica, antes fosse.
O que seria do futuro de uma empresa que "reformasse" o seu know-how, sem antes ter o cuidado de o reter?
A falta de médicos é gravíssima. A dita excepção, nos termos em que está legalmente formulada, não vai resolver o problema. Qual é a estratégia do MS para atacar este problema do SNS? Esta informação é que eu gostaria de ter. Este verão uns primos meus, que vivem em França e vieram passar férias a Portugal , queriam saber quais as medidas concretas do Governo para resolver o problema. Confesso a minha ignorância, mas não tinha uma resposta satisfatória para lhes dar. E continuo a não ter.
Não sei, Margarida, o que parece é que se deitam remendos mas que não resolvem o problema, que continua a agravar-se porque as pessoas, muito legitimanente, não querem ficar prejudicadas no montante da sua reforma por ficarem ao serviço.
Suzana
A culpa não é das pessoas. É natural que se defendam, estando dispostas a reformarem-se antecipadamente com penalizações significativas.
Seria interessante saber qual o montante que está envolvido nestas acumulações, pois só assim poderiamos ajuizar da "imoralidade" desta situação...
Cá por mim não vejo interesse nenhum em levantarem de novo esta questão, mas até pode ser que haja alguma justificação plausível que me escapa!
Excelente pergunta, caro jotac, receio que a resposta não tenha paralelo com as primeiras páginas de jornal que a notícia já rendeu.
Enviar um comentário