Este artigo (que me foi sinalizado pelo nosso Caro Ilustre Mandatário do Réu) sobre a onda de repúdios de heranças não é por certo um fenómeno exclusivo de França. Merece reflexão. Não é um fenómeno novo, a morte com dívidas era algo típico de sociedades muito estratificadas social e economicamente, com um pequeno número de ultra-ricos e uma legião de miseráveis e de remediados empobrecidos, como acontecia no período da primeira revolução industrial, sobretudo em Inglaterra e em França, os países mais desenvolvidos do tempo.
As heranças endividadas e o seu repúdio reflectem uma mudança grande no rumo que o desenvolvimento ocidental conheceu nas últimas décadas.
Depois da 2ª Guerra tivemos uma época gloriosa de crescimento e de compressão das desigualdades, de uma economia social de mercado, com disciplina, moderação nos consumos e revalorização do factor trabalho. Com uma adequada participação do Estado na economia e na sociedade e com um Estado Social razoável, mas sem excessos.
A globalização desregulada, a desindustrialização da Europa, a desvalorização dos salários reais e dos rendimentos da maioria da população, o prosperar do crime económico, o desenvolvimento financeiro desmesurado dos off-shores sem regulação e supervisão adequadas, a impossibilidade de tributar o capital, cada vez mais móvel e escondido em paraísos fiscais, trouxeram mais desigualdades e ameaças a uma classe média próspera e ao Estado Social que não parou de crescer na sua fictícia generosidade. Se somarmos o envelhecimento da população, com um cada vez menor número de activos para um cada vez maior número de pessoas idosas, percebemos que é elevado o risco de mais empobrecimento na velhice.
A coesão social está a dar sinais de erosão e começa a emergir uma classe de novos pobres, sobretudo pensionistas de baixos rendimentos e com hábitos e referências de consumo próprios da classe média. Daqui ao sobre endividamento é um passo muito rápido e muitas vezes sem retorno. Que podemos esperar de uma sociedade que prosseguiu por este caminho?
As heranças endividadas e o seu repúdio reflectem uma mudança grande no rumo que o desenvolvimento ocidental conheceu nas últimas décadas.
Depois da 2ª Guerra tivemos uma época gloriosa de crescimento e de compressão das desigualdades, de uma economia social de mercado, com disciplina, moderação nos consumos e revalorização do factor trabalho. Com uma adequada participação do Estado na economia e na sociedade e com um Estado Social razoável, mas sem excessos.
A globalização desregulada, a desindustrialização da Europa, a desvalorização dos salários reais e dos rendimentos da maioria da população, o prosperar do crime económico, o desenvolvimento financeiro desmesurado dos off-shores sem regulação e supervisão adequadas, a impossibilidade de tributar o capital, cada vez mais móvel e escondido em paraísos fiscais, trouxeram mais desigualdades e ameaças a uma classe média próspera e ao Estado Social que não parou de crescer na sua fictícia generosidade. Se somarmos o envelhecimento da população, com um cada vez menor número de activos para um cada vez maior número de pessoas idosas, percebemos que é elevado o risco de mais empobrecimento na velhice.
A coesão social está a dar sinais de erosão e começa a emergir uma classe de novos pobres, sobretudo pensionistas de baixos rendimentos e com hábitos e referências de consumo próprios da classe média. Daqui ao sobre endividamento é um passo muito rápido e muitas vezes sem retorno. Que podemos esperar de uma sociedade que prosseguiu por este caminho?
4 comentários:
Começo a esperar por uma revolução.
Por uma 4ª República,
se andarmos por cá muitos anos.
Revolução pouco desejada, mas como o habitual mal menor, salvo seja.
Caro Bmonteiro
As mudanças já estão a acontecer, impostas pela realidade. É preferível sermos agentes activos da mudança do que nos deixarmos arrastar por ela.
Esta texto levanta várias questões, desde as mais imediatas que são as de uma população idosa e fragilizada sob muitos aspectos e à mercê da predação da nuvem de bancos e empresas de serviços de crédito.
É interessante notar que Solon, há 2600 anos criou uma constituição que daria lugar à democracia, instituiu o fim da escravatura como consequência do endividamento. De facto, naquela altura o cidadão (tipicamente um agricultor de minifúndio) e a sua família (incluindo filhos) eram o garante de qualquer empréstimo concedido. O contexto implicava uma forte probabilidade de não cumprimento perdendo então a sua liberdade e virando escravo. Na práctica, muito provavelmente o "chefe de família" alienaria filhos e mulher antes de mais tarde ser ele próprio engolido. Esta imagem é horrífica.
Não deixa no entanto de haver um certo paralelismo com a actualidade onde a geração mais nova não vira escrava mas carrega o fardo da geração mais velha, não através da herança de dívidas individuais que pode recusar, mas através das dívidas do Estado. Em paralelo o Estado perde parte da sua independência sendo estes filhos mais novos cidadãos de um estado "escravizado".
Eis pois que depois de dois séculos de construção dos direito dos homens nos encontramos num século em que o estado se encontra acossado por dentro e por fora. Por dentro pela oligarquia partidária que amiúde propulsa malfeitores para posições de reponsabilidade e por fora por grandes conglomerados económicos com dimensão e capacidade de fogo muito superior à de um estado e seu banco central.
Será este século o que vai parir uma Carta dos Direitos dos Estados? E não estaremos nós a assistir às dores de tal parto?
Caro Ilustre Mandatário do Réu
O que me parece que tem grande probabilidade de acontecer é a revolta das gerações mais novas. Estão a viver tempos dificílimos. Um dia quando chegarem ao poder é previsível que repudiem a pesada herança das gerações mais velhas. Neste particular, o futuro apresenta-se com alguma certeza.
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