Fui hoje ao cinema ver Inside Job e francamente não percebo como é que um documentário destes não teve a devida repercussão entre nós. Digo isto porque me lembro da gritaria que foi com um filme de M.Moore sobre a guerra do Iraque que me pareceu um atentado à inteligência e agora este, interessantíssimo, praticamente ainda não tinha ouvido falar.
Trata-se de um documentário excelente sobre as origens e consequências (até agora) da crise que começou por ser financeira e ainda não se sabe o que acabará finalmente por ser. Começa com a Islândia, aquele paraíso perdido com um ar tão pacífico e ordenado, onde os cidadãos acreditavam ter um sistema seguro e limpo, ordenado e cumpridor, by the book. Bastaram cinco anos para tudo colapsar, deixando-os no desemprego e na maior perplexidade. Depois vai ao início da gloriosa inovação financeira, com entrevistas aos então (e ainda!) grandes teóricos, consultores e por fim políticos da época áurea dos grandes bancos, da alta finança, das seguradoras, da globalização dos mercados. Gestores e administradores do Lehman Brothers, Fannie Mae, AIG, Goldman Sachs, etc., nomes como Alain Greenspan, Henry Paulson, Timothy Geithner e muitos outros que ouvimos e lemos mil e uma vezes a ditar teses e projectos que levariam o mundo à glória e à prosperidade, assim os deixassem fazer o que queriam e como queriam, ganhando milhões e vendendo gato por lebre. E as empresas de rating, claro, com as suas miraculosas notações.
Impressionante, os excertos de discursos e conferências mundiais que fizeram e documentos que assinaram, o contraste com as críticas e avisos de gente séria e estudiosa que não estava nesse mercado, chocante a influência ou mesmo o domínio que têm nalgumas reputadas escolas do pensamento económico e financeiro.
Tudo começou como uma novidade e um ovo de Colombo, os pobres também têm direito a ter as suas casas confortáveis, porque não? Compre sem risco, emprestamos sem risco, não pode correr mal. Depois ganharam dimensão, tornaram-se gigantes que esmagavam quem se lhes atravessasse no caminho e na imaginação descontrolada. Por fim, já não era possível parar, seria demasiado perigoso, o mundo agora demasiado pequeno estava todo no mesmo barco.
Nada que não se soubesse, dirão muitos e eu também já sabia algumas coisas. Mas ver assim, o realizador só a perguntar e a ouvir respostas, hesitações ou silêncios,só a mostrar o que todos nós vimos ao longo dos tempos actuais sem entender por completo, é caso para abalar as mais fortes dúvidas sobre a dura e inacreditável realidade.
Dir-se-ia que estamos a assistir ao filme do que ainda estamos a viver, a uma guerra transmitida em tempo real mas sem armas de fogo, sem mortos nem sangue, mas com igual perfídia, a mesma indiferença pelos outros, a mesma falta de escrúpulo, a miséria causada. Sem heroísmo ou ideal algum, também, nem sequer fingido, caras baças e olhos pardos, talvez seja essa frieza e racionalidade o que mais aflige. Inside Job, a destruição das instituições e da ordem das coisas por aqueles que era suposto saberem melhor guardá-las e fazê-las prosperar, dantes chamava-se traição, no tempo das guerras, agora chama-se criatividade, engenharia e mundo financeiro. Não foi preciso exércitos fardados mas sim uma legião de fieis servidores cujo cérebro disponível esteve ao serviço, a troco de generosos ordenados e prémios exorbitantes, numa partilha que paga a cumplicidade.
Trata-se de um documentário excelente sobre as origens e consequências (até agora) da crise que começou por ser financeira e ainda não se sabe o que acabará finalmente por ser. Começa com a Islândia, aquele paraíso perdido com um ar tão pacífico e ordenado, onde os cidadãos acreditavam ter um sistema seguro e limpo, ordenado e cumpridor, by the book. Bastaram cinco anos para tudo colapsar, deixando-os no desemprego e na maior perplexidade. Depois vai ao início da gloriosa inovação financeira, com entrevistas aos então (e ainda!) grandes teóricos, consultores e por fim políticos da época áurea dos grandes bancos, da alta finança, das seguradoras, da globalização dos mercados. Gestores e administradores do Lehman Brothers, Fannie Mae, AIG, Goldman Sachs, etc., nomes como Alain Greenspan, Henry Paulson, Timothy Geithner e muitos outros que ouvimos e lemos mil e uma vezes a ditar teses e projectos que levariam o mundo à glória e à prosperidade, assim os deixassem fazer o que queriam e como queriam, ganhando milhões e vendendo gato por lebre. E as empresas de rating, claro, com as suas miraculosas notações.
Impressionante, os excertos de discursos e conferências mundiais que fizeram e documentos que assinaram, o contraste com as críticas e avisos de gente séria e estudiosa que não estava nesse mercado, chocante a influência ou mesmo o domínio que têm nalgumas reputadas escolas do pensamento económico e financeiro.
Tudo começou como uma novidade e um ovo de Colombo, os pobres também têm direito a ter as suas casas confortáveis, porque não? Compre sem risco, emprestamos sem risco, não pode correr mal. Depois ganharam dimensão, tornaram-se gigantes que esmagavam quem se lhes atravessasse no caminho e na imaginação descontrolada. Por fim, já não era possível parar, seria demasiado perigoso, o mundo agora demasiado pequeno estava todo no mesmo barco.
Nada que não se soubesse, dirão muitos e eu também já sabia algumas coisas. Mas ver assim, o realizador só a perguntar e a ouvir respostas, hesitações ou silêncios,só a mostrar o que todos nós vimos ao longo dos tempos actuais sem entender por completo, é caso para abalar as mais fortes dúvidas sobre a dura e inacreditável realidade.
Dir-se-ia que estamos a assistir ao filme do que ainda estamos a viver, a uma guerra transmitida em tempo real mas sem armas de fogo, sem mortos nem sangue, mas com igual perfídia, a mesma indiferença pelos outros, a mesma falta de escrúpulo, a miséria causada. Sem heroísmo ou ideal algum, também, nem sequer fingido, caras baças e olhos pardos, talvez seja essa frieza e racionalidade o que mais aflige. Inside Job, a destruição das instituições e da ordem das coisas por aqueles que era suposto saberem melhor guardá-las e fazê-las prosperar, dantes chamava-se traição, no tempo das guerras, agora chama-se criatividade, engenharia e mundo financeiro. Não foi preciso exércitos fardados mas sim uma legião de fieis servidores cujo cérebro disponível esteve ao serviço, a troco de generosos ordenados e prémios exorbitantes, numa partilha que paga a cumplicidade.
Terrível, sobretudo, e apesar de tudo, a imagem final da administração americana actual, o grupo todo recuperado.E também a notícia constatando que pouco ou nada se fez do que foi prometido para evitar que tudo se repita ou, pior ainda, tudo converge para fazer crer que está feito. No fim do documentário até desconfiamos dos motivos pelos quais deram tanto relevo à prisão de Madoff!
Vale a pena ver, garanto-vos. E o que eu mais gostaria era de ver imensas opiniões a garantir-me que vi mal e que nada daquilo é verdade nem faz sentido. É que, sabem, eu não acreditava em bruxas, mas há bruxedos que têm uma aparência tão real…
Vale a pena ver, garanto-vos. E o que eu mais gostaria era de ver imensas opiniões a garantir-me que vi mal e que nada daquilo é verdade nem faz sentido. É que, sabem, eu não acreditava em bruxas, mas há bruxedos que têm uma aparência tão real…
14 comentários:
Pronto, já estou a fazer o download do filme...
Eu estava a evitar vê-lo porque me irritam as versões que, ou dão uma versão moral da história, ou levam a uma versão moral da história. A crise de 2008 é admirável e se calhar o mais importante dos eventos para a ciência económica já ocorridos (não usei a palavra "Economia" para designar o ramos do saber que estuda a economia propositadamente). Particularmente porque deitou por terra muito do conhecimento que se tinha, não só da economia, mas também da física e da matemática. Mas foi o estudo da crise que levou a isso, antes da crise toda a gente acreditava que esse conhecimento era válido e muito boa gente ainda hoje acredita, ao ponto de Economia ainda ser considerado curso superior de universidade pública.
Como é possível tudo isto acontecer? É tão simples, basta estar toda a gente errada ao mesmo tempo. Mas estavam errados porque o conhecimento que se tinha era errado.
Caro Tonibler também não suporto versões morais ou que tenham o objectivo de nos orientar para uma conclusão pre fixada. Verá que a sua leitura da crise é muito semelhante à que resulta do documentário, depois de tudo acontecer podemos perguntar como foi possível? mas na altura os poucos que já percebiam o erro não foram ouvidos e muitos foram até afastados. E continuam afastados. Mas ao mesmo tempo há uma lógica imbatível que é assustadora, porquê parar se estava tudo a correr tão bem?
Para os mais sensíveis, aviso já que se trata de um comentário politicamente incorrecto.
As grandes consequências do sub-prime e dos derivativos complexos, produtos financeiros construídos a partir de base económica fluida, ou parcial ou mesmo totalmente mente inexistente, deram-se nos EUA e foram exportados sobretudo para os países mais desenvolvidos, em que havia mercado e clientes para tais produtos.
Claro que o lançamento de tais produtos constituiu crime, quanto mais não fosse por se estar a vender produto falso, gato por lebre. Crime esse que nos EUA tem sido punido, ou pela falência dos Bancos(ex. Lheeman Brothers)ou prisão dos seus promotores.
Todavia, a crise que atingiu algumas instituições e particulares foi mediaticamente extavasada para a economia numa proporção perfeitamente injustificada.
De facto, a generalidade das economias mais atingidas apresentam níveis de actividade superiores aos de então. O que significa que se está a criar mais riqueza do que aquela que era criada e que foi também impulsionada pela venda de habitações propiciada pelo sub-prime.
Quero dizer com isto que o crime dos produtos financeiros estruturados teve sobretudo impacto no seio de muitas famílias e de umas tantas instituições, levando os Governos a intervir, mas esse impacto não é assim tão evidentes na actividade económica. Mesmo nada evidente, nalguns casos.
Veja-se a evolução dos PIBS dos EUA, França, Alemanha, Holanda, China, Índia, Brasil, etc, etc.
Por outro lado, toda essa questão tem servido para toldar os espíritos sobre o que acontece em Portugal(ou na Grécia, ou na Irlanda...). Nomeadamente em Portugal, o sub-prime e os produtos estruturadsos não tiveram nenhuma culpa na crise. O produto não passou por cá. A culpa foi só e apenas nossa, isto é, do "Governo" que nos tem desgovernado. Tudo o resto é poeira lançada para os olhos.
...O que não significa que sejam esquecidas as práticas do que vem sendo apelidado de desregulamentação financeira. Apesar de esta existir, culpa dos governos, vender gato por lebre é crime, na área financeira ou noutra qualquer actividade económica.
Aproveitando o seu comentário, caro Pinho Cardão, devo recordar que mais complexos ou menos complexos, tendo sido a regulação americana mais confusa no que se refere a bancos de investimento, o facto é que esses activos fizeram parte de bancos do mundo inteiro, com reguladores estupidamente rígidos. Dizer que foi falta de regulação, como todos os arautos da esquerda se apressaram a dizer, é não só pouco inteligente, como é criminoso. De facto, se houvesse uma regulação mais leve, esses produtos teriam não teriam entrado de forma tão facilitada nos balanços dos bancos europeus porque os bancos tinham avaliado o seu negócio e não tinham confiado num regulador que lhes dizia que o negócio era bom.
Cara Suzana,
Sobre filosofia do "porquê parar se corre tudo tão bem" não consigo dizer muita coisa, mas o prof. Teixeira dos Santos poderia montar uma cátedra...
Caro Tonibler:
Não deixa de ter alguma grande razão no que diz. De facto, muitos confiaram nos guardas e os guardas pura e simplesmente se esqueceram de guardar.
Caro Pinho Cardão, o seu comentário é perfeitamente justificado, de resto hesitei em fazer o post precisamente porque não queria que daqui decorresse que tudo o que está aacontecer decorre do que se mostra no documentário.A desconfiança enm relação a tudo e todos, decorre certamente do modo como a crise fianaceira se reflectiu um pouco por todo om undo, sobretudo particulares e pequenas poupanças, mas também nos jogadores e ns especuladores que se tinham "popularizado" no sentido de terem passado a incluir muita gente que acreditou no tal gato. Quanto ao resto, o documentário centra-se na Islândia, nos EUA e um puco em Singapura e na China. Em Frnaça, é notável a posição da ministra das Fianaças, sempre muito céptica em relação às facilidades que se reproduziam à velocidade da luz. Mas fez muito bem em chamar a atenção, era importante. Quanto à regulação, quando o poder político é fraco e venal, qual é a regulação que se impõe? Mas isso é outro tema, não menos importante.
Caro Tonibler, aguarda-se o best seller, ele há teses para tudo.
Suzana
Não vi o filme, mas quero ver.
Recordo que uns dias antes da falência da Lehman Brothers a agência de notação de rating Standard & Poor's classificava o banco com AAA, a melhor notação supostamente atribuída a entidades com elevadíssima solvabilidade financeira, merecedoras da máxima confiança por parte de clientes, investidores, credores, do mercado em geral.
Um facto mentiroso a que se juntaram muitas outras conivências ao mais alto nível, envolvendo políticos, autoridades, supervisores, auditores e universidades que tornaram possível uma grande "conspiração" mafiosa que acabou num tsunami financeiro, com ondas de choque que ainda não acabaram, mas que trouxeram uma crise económica com consequências sociais devastadoras.
É extraordinário, como depois do desastre, muita gente envolvida se tenha mostrado espantada, disparando severas críticas ao "sistema" e apontando o dedo de falta de ética e moral a tudo e a todos.
Sabemos que o dinheiro corrompe e não poupa ninguém. Com efeito, é difícil evitar o crime quando polícias e ladrões se juntam à mesma mesa para repartirem o saque.
Será que estas conspirações não voltam a acontecer? As pessoas e as instituições são as mesmas. Haverá outras "mentiras" em construção que o comum dos mortais não faz uma pálida ideia. Quais são e quanto tempo podem durar é uma incógnita. O mundo até parece já estar habituado a viver assim.
Sobre a crise do sub-prime, nunca é demais revisitar este filme!
Um dos problemas deste documentário é precisamente o facto de ser tomado pouco a sério, porque apesar de não ter uma abordagem moral, há quem ache à partida desconhecendo-o que é uma abordagem moral, como é o caso do meu ex-camarada Tonibler. Não há nada pior que um complexo de Esquerda, ou de Direita!
Outro facto a ter em conta é uma pequeno parágrafo aí para cima: muitos alertaram e foram ignorados por causa de um complexo de Direita ou pseudo-capitalista. E continuam a ser ignorados por causa do mesmo complexo. Antes achavam-nos uns anti-sistema, agora acham-nos uns moralistas.
Ai se fosse eu a escrever este post, o que não me chamariam...
Parabéns, cara Suzana!
Monteiro,
Eu gosto de pensar que sou um cientista, pelo menos em part-time. Nunca digo nada antes de ver, perceber e olhar para os limites daquilo que estou a ver. Eu disse que, perante o comentário ia fazer o download do filme (sem sucesso, até agora...) que não tinha visto porque estes filmes têm tendência para ter uma abordagem moralista.
O moralista é o sujeito que usando um conjunto de factos seleccionados, e que corroboram a sua opinião, a publicita. Sendo que, normalmente, na presença de todos os factos, a sua opinião não merece qualquer crédito. É muito fácil num documentário provar a existência de Deus, a inexistência de Deus, o heliocentrismo, o geocentrismo, o Darwinismo, o criacionismo, etc... Não se trata de complexos de direita ou de esquerda, chama-se ciência.
Se queres saber verdades parciais, posso apresentar-te um verdadeiro cardápio de pantomineiros, do ISEG à FEUP, de Harvard ao ETH, onde podes tentar perceber alguma coisa sem ciência nenhuma associada... Mas isso, meu caro, não é um documentário, continuas na zona da ficção, odne essas coisas de esquerda e direita ainda fazem sentido.
Caro cmonteiro, concordo consigo, se o documentário tivesse uma abordagem moral, de preferência básica, teria sem dúvida sido um sucesso, as pessoas gostam de pronto-a-consumir. Assim, é mais complicado, obriga-nos a correr alguns riscos nas conclusões que tiramos, uma maçada. Mas valeu o seu elogio, acho que é a tradição do presente de natal :)
A crítica ao sistema remonta a 150 anos atrás, já todos ouvimos falar e assustamo-nos muitas vezes com aquilo a que derrubar um sistema implica, o esforço durante a transição e recomposição do novo paradigma. Um conflicto entre o presente e o futuro, ou com a a materialização do futuro, é na verdade, por querermos o amanhã um pouco melhor que submetemos o futuro aos frutos do amanhã e aos limites do confortável aos quais nos confinamos em situações comuns. Ao invés de romper o ciclo para que não havendo segurança no imediato haja um trabalho continuo para a libertação do futuro das possibilidades existentes.
Vou ver o documentário, já vi alguns do género mas no entanto não creio que seja possível aprender muito mais sobre a essência capitalismo ao vê-los, o que assistimos, é à perversão a que os indivíduos são capazes concretizar na reformulação constante do Establishment. Por esta apropriação das forças transformadoras da sociedade para se fortalecer, sei que ELE é opressor por natureza, e a mente humana suficientemente astuta para infinitamente mascarar essa amoralidade sistemática
Enviar um comentário