Salvo por opressão directa, qual é a forma mais certa de se perder a liberdade? Se abusarmos, ou deixarmos que abusem dela. E podemos abusar dela de várias formas, em particular para causarmos danos aos outros ou para alcançar, ou permitir que alguém alcance, aquilo a que não se teria acesso com um comportamento leal. Qual é a melhor forma de se perder a autoridade? Usando o poder para fazer o que aos outros não é permitido ou que é injusto. Qual é a melhor forma de perdermos a mobilidade, de atravessar territórios sem fronteiras, nem barreiras, nem satisfações a dar? Criando problemas de segurança, disseminando ameaças ou desrespeitando a cultura, a economia, as leis ou o ambiente dos povos que abrem as suas portas a quem os quiser visitar ou neles trabalhar.
Ninguém nos protege dessas ameaças se não formos nós, cada um de nós, a exercer em primeira mão o sentido crítico e a exigência do respeito pelos limites de que depende a sobrevivência dessas liberdades ou dessa autonomia. No entanto, a maior parte destas atitudes surge insidiosamente, sob a capa de legitimo uso desses direitos de agir, em regra aplaudidas pelos maiores paladinos dos direitos e deveres que assim são postos em causa, só porque numa primeira fase lhes convém, ou apenas porque são ingénuos. Então é difícil contrapor, porque argumentam copiosamente contra quem protesta, acusam mesmo os outros de não compreenderem o alcance e profundidade de tão magnos direitos e de quererem tolhê-los, dando assim campo livre para que se avance na sua erosão. As vistas curtas dos que conseguem lamber algumas migalhas do que se serve à mesa dos prevaricadores, ou a cobardia intelectual dos que receiam ser criticados por os denunciar antes que se revelem em toda a sua crueza, são essenciais para dar tempo a que estes reforcem o seu poder destruidor.
E então, um dia, tarde demais, acordaremos para a realidade. A liberdade cerceada para evitar abusos e danos insuportáveis, a autoridade corroída a dar lugar à arbitrariedade e à impotência dos submetidos, a mobilidade a tropeçar a cada passo em barreiras, em controles, em scaners, em fortunas gastas para defender da invasão ou dos atentados o que antes eram espaços de livre circulação. A liberdade de imprensa, o bom uso do poder democraticamente eleito ou o direito à mobilidade são bens intoleráveis para os que querem impor os seus pontos de vista, para os que cobiçam o poder como um privilégio pessoal ou para os que reinam em sociedades fechadas que não querem ver contaminadas pela esperança da felicidade.
Nesse dia vamos perguntar-nos, com amargura, se não nos devíamos ter defendido com mais determinação dos que, como o lobo da história da cabrinha, se aproximam com luva branca e ar inocente, invocando a nossa senha protectora para nos enganar, brincando com as nossas frágeis certezas. E acabando por nos meter no papo.
Ninguém nos protege dessas ameaças se não formos nós, cada um de nós, a exercer em primeira mão o sentido crítico e a exigência do respeito pelos limites de que depende a sobrevivência dessas liberdades ou dessa autonomia. No entanto, a maior parte destas atitudes surge insidiosamente, sob a capa de legitimo uso desses direitos de agir, em regra aplaudidas pelos maiores paladinos dos direitos e deveres que assim são postos em causa, só porque numa primeira fase lhes convém, ou apenas porque são ingénuos. Então é difícil contrapor, porque argumentam copiosamente contra quem protesta, acusam mesmo os outros de não compreenderem o alcance e profundidade de tão magnos direitos e de quererem tolhê-los, dando assim campo livre para que se avance na sua erosão. As vistas curtas dos que conseguem lamber algumas migalhas do que se serve à mesa dos prevaricadores, ou a cobardia intelectual dos que receiam ser criticados por os denunciar antes que se revelem em toda a sua crueza, são essenciais para dar tempo a que estes reforcem o seu poder destruidor.
E então, um dia, tarde demais, acordaremos para a realidade. A liberdade cerceada para evitar abusos e danos insuportáveis, a autoridade corroída a dar lugar à arbitrariedade e à impotência dos submetidos, a mobilidade a tropeçar a cada passo em barreiras, em controles, em scaners, em fortunas gastas para defender da invasão ou dos atentados o que antes eram espaços de livre circulação. A liberdade de imprensa, o bom uso do poder democraticamente eleito ou o direito à mobilidade são bens intoleráveis para os que querem impor os seus pontos de vista, para os que cobiçam o poder como um privilégio pessoal ou para os que reinam em sociedades fechadas que não querem ver contaminadas pela esperança da felicidade.
Nesse dia vamos perguntar-nos, com amargura, se não nos devíamos ter defendido com mais determinação dos que, como o lobo da história da cabrinha, se aproximam com luva branca e ar inocente, invocando a nossa senha protectora para nos enganar, brincando com as nossas frágeis certezas. E acabando por nos meter no papo.
4 comentários:
Cara Dra. Suzana Toscano,
Por ter gostado tanto do que li, ouso partilhar consigo aquilo que me fez pensar. Este seu texto é, de facto, oportuno e levou-me a reflectir sobre a determinação a que apela, muito bem ilustrada com a referência à história do lobo. Concordo inteiramente que é importante lutar contra os abusos, ou diria eu, os maus ideais, mas temo que tal não seja possível se não conseguirmos substituir as frágeis certezas, por poderosas convicções. É que, nesta luta, não nos podemos esquecer que estes abusos são sustentados por indivíduos, também eles com ideais, mesmo que maus, e a maior parte das vezes mais vividos do que nós sabemos viver os nossos. Por isso "abrimos a porta", ou seja, somos ludibriados pelas "falsas" certezas dos outros que correm sem hesitar, numa aparência muito apetecível de segurança e verdade. Neste adiantar da hora, chego à conclusão que, num mundo onde não há lugar para improvisos, é necessário, primeiro, que nos esclareçamos quanto aos princípios que nos animam e depois que nos convençamos, cada vez mais, que esses princípios valem mais do que o nosso sossego.
Teresa Anjinho
Cara Teresa, tornaram-se frágeis porque confiamos que estão adquiridas, convencemo-nos de que agora só aumentam e não precisamos de lutar por elas. E tem toda a razão quando diz que os que as odeiam querem absolutamente destruí-las, têm essa determinação, que nós não temos em defendê-las, pelo contrário, até as cedemos brandamente, com argumentos tolos para nos dispensar de agir. Nas coisas grandes e graves ou nas pequenas, que às vezes parecem apenas episódios pícaros, lá vamos desistindo. Acho que não é falta de esclarecimento, é amolecimento e, muitas vezes, cobardia por não querer enfrentar. Muito obrigada pelo seu comentário, bem vinda ao 4r!
É esse mesmo o espírito, caro Paulo.
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