Há mais gente a regressar a atividades tradicionais. Uma delas é o aproveitamento da terra mais fértil como sucedâneo do emprego perdido ou para garantir uma produção compensatória da redução do rendimento disponível. Nas zonas do País onde este movimento se nota mais, a produção é feita em pequena escala, muitas vezes por meios tradicionais, resultando em produtos de excelente qualidade, desde logo porque obtidos com recurso a práticas naturais de enriquecimento da terra ou com baixa utilização de agrotóxicos. Para além de contribuir para a subsistência de algumas famílias, podemos todos nós, consumidores, ficar a ganhar. Mas para isso é necessário criar as condições para o regresso aos mercados e às feiras. Pelo que conheço do País, tal regresso não implica grandes estudos, negociações ou complexas operações. Ao longo das últimas décadas verificou-se a paradoxal situação de as autarquias investirem fortemente na recuperação e reequipamento dos espaços à custa dos fundos comunitários, ao mesmo ritmo que se construíam grandes e médias superfícies comerciais e as pessoas deslocavam para aí as suas preferências de consumo.
Por isso, se a atitude das pessoas mudar preferindo a compra nos mercados dos legumes, da fruta, do pão, das flores, do peixe, da carne, tornar-se-á mais sustentável a produção e consumo locais, para além de beneficiarem com a melhor qualidade da generalidade destes produtos. As infraestruturas existem, modernas e funcionais.
E não se pense que isto significa a recriação da velha distinção entre um país cosmopolita e um país rural. Em Lisboa e nos concelhos limitrofes a revitalização dos mercados tradicionais, em acentuado processo de morte lenta asfixiados pela concorrência das grandes superfícies, pode e deve ser uma realidade desde que, do mesmo modo, as famílias mudem os seus hábitos de consumo e as autarquias favoreçam a fixação dos pequenos comerciantes (baixando taxas, reordenando o trânsito e permitindo o estacionamento gratuito e rotativo na adjacência). Há dias, por altura do Natal, fomos ao mercado de Algés, animado, pleno de cor, de vida, de gente e de bons produtos. Confesso que fiquei surpreendido. Agradavelmente surpreendido por assistir mais cedo do que esperado a este regresso aos mercados.
E não se pense que isto significa a recriação da velha distinção entre um país cosmopolita e um país rural. Em Lisboa e nos concelhos limitrofes a revitalização dos mercados tradicionais, em acentuado processo de morte lenta asfixiados pela concorrência das grandes superfícies, pode e deve ser uma realidade desde que, do mesmo modo, as famílias mudem os seus hábitos de consumo e as autarquias favoreçam a fixação dos pequenos comerciantes (baixando taxas, reordenando o trânsito e permitindo o estacionamento gratuito e rotativo na adjacência). Há dias, por altura do Natal, fomos ao mercado de Algés, animado, pleno de cor, de vida, de gente e de bons produtos. Confesso que fiquei surpreendido. Agradavelmente surpreendido por assistir mais cedo do que esperado a este regresso aos mercados.
Mercado de Lamego. Excelentes produtos da terra.
10 comentários:
Concordo plenamente com este artigo. Só que há um pequeno óbice para que os consumidores, que somos todos nós, passemos a convencer-nos de que realmente os produtos ali expostos são de melhor qualidade!E até são,na sua grande maioria!Fica,no entanto, um outro problema para resolver: é que, fruto da produção em grande escala e também à importação do estrangeiro,julgamos que os preços são substancialmente inferiores nas tais grandes superfícies!O que por vezes é uma ilusão!Acho que devia haver uma grande campanha com vista a fazer regressar os consumidores a acreditar nos nossos produtos e,também,os pequenos produtores a terem em atenção que por vezes vale mais um lucro menor para mais facilmente poderem escoar os seus produtos!Sem descurar a qualidade,como é evidente!
Não é só da qualidade biológica dos produtos que nos devemos ocupar, é também da legislação que regula essa qualidade, no que diz respeito essencialmente ao peixe e à carne.
Estes dois produtos encontram-se impedidos de chegar ao consumidor, vindo directamente do pescador ou do produtor, dado o conjunto de normas a que o transporte, abate e distribuição. Estas normas tornam para os pequenos produtores e pescadores - aqueles que melhor poderiam garantir um nível de qualidade que só é conseguida através de processos artesanais - o produto mais caro.
A par da revitalização dos mercados e das feiras tradicionais, penso que é necessário a criação de grémios e de mútuas, dedicados a cada sector, que permitam aos pequenos produtores a colocação dos seus produtos, garantindo assim que o seu esforço não resulte em prejuízo.
Sr. Dr. Ferreira de Almeida:
Uma legítima dúvida me assola.
Nesses novos mercados os pequenos produtores também terão de se munir de um sofisticado programa informático numa não menos sofisticada máquina de facturas para passarem um recibo de 0,50€ por um molho de coentros?
É preciso estar atento, porque é nestes pormenores que nos podemos perder.
Quanta receita fiscal (dos famosos 4 mil milhões) não se perderá se não houver factura?
Quanto às bicas nos cafés e restaurantes o problema já está resolvido, e ainda bem.
Mas este continua em aberto.
Caro Ferreira de Almeida:
As velhas feiras ainda andam por aí. É uma tradição que não se perde, até urge revitalizar. Pena foi que, na altura da "abundância" de dinheiro, as Câmaras tenham investido em equipamentos surpéfuos, dispensáveis e até inúteis e não tenham procurado melhorar os recintos das feiras. Ainda na 2ª feira estive numa, onde, por causa da chuva, havia lama por todo o lado. Mesmo assim, estava animada, nomeadamente no que respeita aos produtos hortícolas. O que denota efectivamente que nova gente e gente nova, chegou à agricultura.
Caro Manuel Silva:
Quanto às tais máquinas de cobrar, seria uma violência obrigar pequeníssimos agricultores que vendem umas centenas de pés de cebolo, umas dezenas de couves e de alfaces ou coisa semelhante, a utilizá-las. Uma violência inútil e desproporcionada. Que acabava com mais uma magra, mas importante, fonte de rendimentos familiar. E cujos resultados não chegariam para pagar aos fiscais.
Sou grande adepta de feiras e mercados, gosto do ambiente e dos produtos tantas vezes vindos directamente do produtor. No bairro onde moro faz-se agora uma pequena feira aos sábados, mesmo em frente ao centro comercial, há só legumes e fruta mas parece um formigueiro de gente que aí se abastece, como nas aldeias de antigamente, ao mesmo tempo que conversam com os vizinhos. É muito animado.
Também pensei muito na viabilidade e potencial desse "regresso à terra que tem sido muito romantizado. No espaço de um ano e na pequena ilha onde vivo fizeram-se ( ainda fazem , alguns carolas) umas tentativas de juntar pequenos agricultores e produtores artesanais no que chamávamos mercado alternativo. Pessoalmente já desisti , porque o Estado exige que um agricultor , por mais pequeno que seja , pague 124€ por mês à estoirada e inviável segurança social ,mesmo que nem tenha vendas desse valor num mês inteiro;porque o IRAE , nas ilhas como no continente , afoga os produtores e comerciantes em exigências ridículas e caríssimas ; porque podem não exigir o recibo electrónico ligado ao sorvedouro sem fundo das Finanças mas não deixam de exigir que se passem recibos.Além disso os comerciantes estabelecidos , com as suas fortíssimas ligações politicas me meios pequenos , não apreciam a concorrência aos seus produtos importados e estão-se nas tintas para noções de "sustentável" , "orgânico" e outras modernices.
Pessoalmente , desisti , declarei o fim da actividade apesar de manter a minha pequena exploração agrícola , calculo que agora seja clandestina e ainda um dia me vão impor uma multa.
Acho muita piada às pessoas urbanas a romantizarem a pequena agricultura e os mercados tradicionais. Sem dúvida que são uma coisa boa , mas com estas condições e exigências do Estado , nunca passarão de um hobby e uma curiosidade folclórica.
Aplaudo e fico contente com o crescimento do interesse das pessoas urbanas pela origem e modo de produção do que comem , mas se não se libertarem os agricultores para produzir e vender ( inclusive libertá-los desta dependência atroz dos subsídios) , enquanto não se restringir o poder dos intermediários , vocês vão continuar a comprar um cestinho de morangos por brincadeira num passeio de Domingo , e nada muda.
Caro Jorge Ventura:
Tem toda a razão no que diz. Sei que é assim.
Meu caro Jorge Ventura, obrigado pelo seu comentário, certeiro nas observações que faz quanto à asfixia do Estado.
Por aqui os "urbanos" têm a consciência do que nos diz, desde logo porque ligados às suas raízes. Note, porém, que não há muito tempo eu me abastecia de legumes, frutas e outros frescos exclusivamente nos mercados em plena Lisboa. E o estímulo não era nem o romantismo nem o saudosismo das origens. Era mesmo egoismo: o que se comprava no mercadinho de S. Bento ou na Ribeira era muito melhor!
Sempre gostei de mercados e feiras. Há muito tempo que regressei ao mercado, desde que o mercado municipal aqui na minha freguesia sofreu diversas remodelações com vista a fazer dele um espaço funcional e agradável mantendo os traços tradicionais destes espaços tão portugueses. E das feiras nunca me desliguei, gosto das feiras lá de cima da Beira, juntam gentes, tradições, produtos e bens da terra. São o pulsar das gentes e economias locais.
Caros senhores
O meu comentário pareceu derrotista demais ,foi ventilar uma frustração ,o meu caso é muito específico por ser uma terra pequenina e distante dos centros , e não queria estar a arrefecer o entusiasmo das pessoas nem queria de modo nenhum criticar ou apoucar a essência do post.
Especialmente sua constatação , verídica , que há cada vez mais jovens agricultores , o que beneficia do facto de na agricultura se ser jovem até aos 40. Há uma parte boa de uma geração que não só não olha para o trabalho agrícola sem complexo nenhum como tem à disposição a sabedoria acumulada , incluindo os erros do passado , e tem a tecnologia moderna, incluindo a tecnologia necessária para produzir “orgânico,biológico& sustentável” , se estiver para aí virado. Existem programas de apoio à instalação dos jovens e felizmente acabou a época longa de abusos egrégios em que se torraram milhões e construiu uma burocracia medonha. Há apoios e subsídios , mas há muitas e apertadas condições de acesso , o que veio 20 anos tarde demais com o mal já feito , e a culpa está longe de ser só nossa , foi o modelo escolhido pela Europa , como sempre corre muito bem para uns e muito mal para outros, os mais prejudicados foram os pequenos e médios agricultores , o meio ambiente e os contribuintes , os mais beneficiados foram as grande cadeias de distribuição , e os consumidores , o que é uma sólida maioria da população... foi pelo bem comum e para se poder comer mangas e espargos todo o ano , e comprar leite a 60 centimos o litro.
Quanto mais procura houver nos meios urbanos para os mercados tradicionais ( quando digo urbanos falo também de pequenas cidades e vilas que talvez nem tenham um mercado em funcionamento actualmente) , quanto mais regularidade e volume houver nesses pequenos mercados mais os produtores ganham confiança e podem investir e fazer o esforço para se "legalizarem" , e produzir mais e melhor , com explorações que não são como as quintas da avozinha (a não ser no marketing) mas muito longe das agro industrias, e podem-se cultivar assim milhares de hectares que estão abandonados hoje em dia.
Não vejo no horizonte nenhuma reforma da PAC e desta política insane dos subsídios e sua organização ,dou um exemplo interessante em primeira mão : há um subsídio para ter ovelhas e há um subsídio para abater ovelhas.
De qualquer modo , o regresso à terra , aos mercados e à valorização da produção nacional pode não ser muito significativo mas não deixa de ser real e ter significado , e também acho que deve ser saudado , apoiado e encorajado.
Cumprimentos.
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