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quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Simone de Beauvoir, 100 anos


"É pela mulher, através do que nela há de pior e de melhor, que o homem faz a aprendizagem da felicidade, do sofrimento, do vício, da virtude, do desejo, da renúncia, do devotamento, da tirania, que faz a aprendizagem de si mesmo; ela é o jogo e a aventura, mas também a provação; é o triunfo do mais áspero, do malogro superado; é a vertigem da perda, o fascínio da danação, da morte. Há todo o mundo de significações que só existem pela mulher; ela é a substância das acções e dos sentimentos dos homens, a encarnação de todos os valores que solicitam libertação. Compreende-se que, embora condenado aos mais cruéis desmentidos, o homem não deseje renunciar a um sonho no qual todos os seus sonhos estão envolvidos. Eis, pois, que a mulher tem um duplo e decepcionante aspecto: ela é tudo o que o homem aspira e tudo o que não alcança. Ela é a sábia mediadora entre a Natureza propícia e o Homem: é a tentação da Natureza indomada contra toda a sabedoria. (…)Ele projecta nela tudo o que teme, o que ama e o que detesta (…) ela é todo o Outro. Enquanto Outro, ela é também outra e não ela mesma, outra e não o que dela é esperado.” Simone de Beauvoir, O Segundo Sexo, I, Os Factos e os Mitos


Faz hoje um século que nasceu Simone de Beauvoir. A minha homenagem a essa mulher extraordinária, inteligente, que revolucionou o discurso feminista ao apresentar a mulher como um ser inteiro, responsável e livre e não apenas como o outro que almeja a igualdade…
Sempre tive uma enorme admiração por ela, li apaixonadamente os seus livros, primeiro com surpresa, depois com deslumbramento, por fim com sentido crítico, mas sempre com a curiosidade e o encanto de quem encontra algo de novo e de desafrontado. Na minha geração, muito jovens ainda, Simone de Beauvoir foi sem dúvida uma influência marcante, pela afirmação ou pela recusa, e permaneceu depois uma referência, como filósofa e como escritora.
Podia falar sobre ela durante muito tempo sem sequer referir Sartre, cada um apropria-se dos outros à sua maneira, para mim Simone de Beauvoir não precisa de ser associada a mais ninguém, ela não é “o Outro”…"

5 comentários:

Bartolomeu disse...

Justa homenagem, cara Suzana.
Raras foram as mulheres que olharam de uma forma tão lucida o feminismo e a forma de ser feminista sem necessáriamente fomentar os inevitáveis choques culturais e sociais.
Tudo o que resulta da acção de uma personalidade como a de Simone de Beauvoir representa avanço, não só para as mulheres como também para os homens.
Apesar de alguns a considerarem libertina, a filósofa foi sem dúvida alguem que encarou e denunciou as hipocrisias de uma sociedade corrupta, experimentando o sabor da liberdade que me parece sempre pautou a sua existência.

Pinho Cardão disse...

Cara Suzana:
Não há bela sem senão...no caso o abominável Sartre!...

Anónimo disse...

Oportunissimo apontamento, Suzana.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Bonita e justa homenagem, Suzana.
Simone de Beauvoir foi realmente uma mulher muito bonita na corajosa luta pela dignificação da mulher.
Da leitura que fiz de alguns dos seus pensamentos deixo estes que são bem verdadeiros:

- "Não se nasce mulher: torna-se".

- "É pelo trabalho que a mulher vem diminuindo a distância que a separava do homem, somente o trabalho poderá garantir-lhe uma independência concreta".

Suzana Toscano disse...

Caro Bartolomeu, concordo inteiramente que "Tudo o que resulta da acção de uma personalidade como a de Simone de Beauvoir representa avanço, não só para as mulheres como também para os homens", é exactamente com essa perspectiva que se consegue progredir socialmente, quando todos beneficiam.
Pois, Pinho cardão, também nunca simpatizei com o Sartre, como filósofo e como personalidade, de facto ele ofuscou-a, ou julgou que sim. Mas o último livro dela, "A Cerimónia do Adeus", também é muito cruel, uma espécie de ajuste de contas que me deixou perplexa. Enfim, a relação entre duas pessoas de personalidade muito forte era muito complicada.
Margarida, ontem andei a escolher uma citação que me agradasse e fiquei a reler os livros dela que ainda tenho até às 3 da manhã! Mas essas são ilustrativas.