Viver numa pequena localidade tem ainda os seus encantos e permite-nos descobrir o passado entre as suas paredes, nas suas gentes, nos seus gestos, no seu comércio, no seu dia-a-dia, sempre envoltos nas mais modernas tecnologias, em aspirações mundanas ou nas vivências ditadas pela moda e futilidades da vida. Estranhas combinações que, de braço dado, vão caminhando sem saber para onde e nem porquê. Viver numa pequena localidade é isso mesmo, viver em tempos diferentes no mesmo espaço, ambicionando o que o passado nunca deu e o futuro que ainda não prometeu. Permite ter conversas desfasadas, ricas, desproporcionadas, bem e mal-intencionadas, justificando falsas vontades ou despertando o olhar para a necessidade de renascer a bondade. Viver numa pequena localidade tem o seu encanto que depressa tanto se pode afundar num qualquer desencanto ou deixar-se enlevar por um sedutor e estranho canto. Tudo acontece e o que não acontece passa para o campo da imaginação, em que a língua afiada aponta diretamente ao coração. É uma maravilha viver numa pequena localidade, onde não se consegue esconjurar a maldade, nem manter viva eternamente a bondade. Numa pequena localidade é fácil encontrar fontanários de felicidade onde qualquer alma pode matar a sede da verdade. Numa pequena localidade é fácil usar a prova dos nove para ver se as contas estão certas. Um lápis, um papel, a tradicional desconfiança, a vontade de calcular e passado um bocado a conta certa para ajustar. Tudo acontece numa pequena localidade, até usar a prova dos nove. A tecnologia não move nem desperta o interesse, o passado não morre, a desconfiança continua, indiferente a tudo e a todos, como se o tempo não existisse. Viver numa pequena localidade é viver tempos diferentes no mesmo espaço, em que tudo muda e fica quedo, em que ainda se move a velha prova dos nove.
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