O Dr. Tavares Moreira relançou neste post um tema que gerou comentários muito interessantes. Alguns desviaram a questão para o quadro mais geral do financiamento do poder local já por diversas ocasiões aqui abordado. Volte-se ao tema, aliás actual.
Independentemente da percepção e do julgamento que cada um faça sobre o papel de municípios e freguesias, as autarquias são uma realidade e serão no futuro uma realidade cada vez mais presente na vida das pessoas. Por isso não se estranhe que os responsáveis autárquicos procurem obter os meios para satisfazer as necessidades das populações que servem. O contrário é que seria de estranhar.
Quem tem um contacto, mínimo que seja, com a vida autárquica sabe bem que a necessidade de obter receitas é hoje sobretudo a consequência de dois fenómenos. Da maior consciência social de que as autarquias, prestando serviços públicos indispensáveis, não são esferas de poder isoladas e distantes, proximidade que facilita a exigência dos cidadãos quanto a mais e melhores prestações. Ninguém hoje se conforma que na sua rua não haja ou falhe a iluminação pública; ou que permaneça, um dia que seja, esburacada. Que não se recolha o lixo. Reclama-se - e muito bem - que as escolas cuja manutenção está a cargo dos municípios tenha condições de trabalho mas também comodidades como o Estado nunca garantiu. Reclama-se por espaços verdes em condições, redes em permanente funcionamento, fornecimentos (de água, por exemplo) de qualidade, intervenções urbanísticas de alto standard, que se fomente a cultura, que se apoiem as agremiações, que se vivifique o tecido empresarial, que se apoie o comércio tradicional, que se trate da integração de minorias, que se faculte a todos habitação, que se mantenha a rede viária mais extensa do país em condições de permanente circulação, que se criem e mantenham espaços de desporto e lazer, etc, etc, etc.. Nada disto se faz sem dinheiro e aos autarcas ainda não foi outorgado o divino poder de multiplicar pães...
O segundo factor é o acréscimo constante de incumbências aos municípios, normalmente tarefas de que o Estado se quer desfazer porque lhe pesam. Seja na educação, no ambiente, no ordenamento e gestão do território, na protecção civil, na cultura e desporto ou nas obras públicas. Mesmo um governo centralista como este é, não deixa de sacudir para as autarquias funções que não quer exercer. Não ficaremos, de resto, por aqui. Nos próximos tempos, ainda que sob uma habilidosa tutela directiva por parte do Governo, assistiremos a um movimento de translacção de novas competências na área da saúde e da educação. Cá estaremos para comentar.
Sei bem que a hora é de fustigar autarquias e autarcas. Está na moda, os media e por vezes os governantes ajudam ao festim do espancamento permanente. Todavia, os julgamentos populares induzidos pelas autênticas lavagens cerebrais promovidas pela generalidade da comunicação social, raramente são justos porque generalizam aquilo que tantas e tantas vezes não passa de uma amostra pouco significativa de situações condenáveis.
A verdade é que este sentimento explica a reacção geral quanto a qualquer esforço, mais ou menos criativo de as autarquias obterem meios para financiar as suas actividades.
Deixo claro que penso e defendo que o esforço de contenção financeira que se está a ensaiar na administração directa e indirecta do Estado tem de se fazer na administração local. Acho mais. Entendo que os municípios poderiam e deveriam dar uma lição no que respeita à eficácia da parcela da receita pública que utilizam. Aqui na 4R já manifestei o meu apoio de princípio às propostas de alteração da lei das finanças locais do Governo e lamentei o desvio desses princípios, por exemplo, no que respeita às empresas municipais.
É também para mim evidente que o modelo de financiamento das autarquias deve evoluir na direcção de uma maior responsabilidade destas entidades na captação de receitas, designadamente através da atribuição de poder tributário próprio, de modo a que os autarcas sintam o ónus político de tributar e graduem as despesas em função dos meios financeiros derivados da capacidade contributiva dos cidadãos e das empresas da autarquia (sem embargo da necessidade de financiamento estadual à equidade territorial).
Porém, não se pode partir da exigência de maior rigor e responsabilidade na gestão dos dinheiros públicos para uma condenação irracional que está a ser feita de todos os municípios e freguesias, de todos os autarcas deste País.
Perdeu-se o sentido de que pela acção de muitos autarcas se contribui para a melhoria de condições de vida das pessoas com quem todos os dias contactam, decidindo junto delas e próximas dos seus problemas. E não, como acontece com os governantes ou os altos dirigentes da administração pública, no recato dos seus gabinetes, longe do confronto com os problemas concretos.
Nesse movimento de condenação primária eu não embarco.
Independentemente da percepção e do julgamento que cada um faça sobre o papel de municípios e freguesias, as autarquias são uma realidade e serão no futuro uma realidade cada vez mais presente na vida das pessoas. Por isso não se estranhe que os responsáveis autárquicos procurem obter os meios para satisfazer as necessidades das populações que servem. O contrário é que seria de estranhar.
Quem tem um contacto, mínimo que seja, com a vida autárquica sabe bem que a necessidade de obter receitas é hoje sobretudo a consequência de dois fenómenos. Da maior consciência social de que as autarquias, prestando serviços públicos indispensáveis, não são esferas de poder isoladas e distantes, proximidade que facilita a exigência dos cidadãos quanto a mais e melhores prestações. Ninguém hoje se conforma que na sua rua não haja ou falhe a iluminação pública; ou que permaneça, um dia que seja, esburacada. Que não se recolha o lixo. Reclama-se - e muito bem - que as escolas cuja manutenção está a cargo dos municípios tenha condições de trabalho mas também comodidades como o Estado nunca garantiu. Reclama-se por espaços verdes em condições, redes em permanente funcionamento, fornecimentos (de água, por exemplo) de qualidade, intervenções urbanísticas de alto standard, que se fomente a cultura, que se apoiem as agremiações, que se vivifique o tecido empresarial, que se apoie o comércio tradicional, que se trate da integração de minorias, que se faculte a todos habitação, que se mantenha a rede viária mais extensa do país em condições de permanente circulação, que se criem e mantenham espaços de desporto e lazer, etc, etc, etc.. Nada disto se faz sem dinheiro e aos autarcas ainda não foi outorgado o divino poder de multiplicar pães...
O segundo factor é o acréscimo constante de incumbências aos municípios, normalmente tarefas de que o Estado se quer desfazer porque lhe pesam. Seja na educação, no ambiente, no ordenamento e gestão do território, na protecção civil, na cultura e desporto ou nas obras públicas. Mesmo um governo centralista como este é, não deixa de sacudir para as autarquias funções que não quer exercer. Não ficaremos, de resto, por aqui. Nos próximos tempos, ainda que sob uma habilidosa tutela directiva por parte do Governo, assistiremos a um movimento de translacção de novas competências na área da saúde e da educação. Cá estaremos para comentar.
Sei bem que a hora é de fustigar autarquias e autarcas. Está na moda, os media e por vezes os governantes ajudam ao festim do espancamento permanente. Todavia, os julgamentos populares induzidos pelas autênticas lavagens cerebrais promovidas pela generalidade da comunicação social, raramente são justos porque generalizam aquilo que tantas e tantas vezes não passa de uma amostra pouco significativa de situações condenáveis.
A verdade é que este sentimento explica a reacção geral quanto a qualquer esforço, mais ou menos criativo de as autarquias obterem meios para financiar as suas actividades.
Deixo claro que penso e defendo que o esforço de contenção financeira que se está a ensaiar na administração directa e indirecta do Estado tem de se fazer na administração local. Acho mais. Entendo que os municípios poderiam e deveriam dar uma lição no que respeita à eficácia da parcela da receita pública que utilizam. Aqui na 4R já manifestei o meu apoio de princípio às propostas de alteração da lei das finanças locais do Governo e lamentei o desvio desses princípios, por exemplo, no que respeita às empresas municipais.
É também para mim evidente que o modelo de financiamento das autarquias deve evoluir na direcção de uma maior responsabilidade destas entidades na captação de receitas, designadamente através da atribuição de poder tributário próprio, de modo a que os autarcas sintam o ónus político de tributar e graduem as despesas em função dos meios financeiros derivados da capacidade contributiva dos cidadãos e das empresas da autarquia (sem embargo da necessidade de financiamento estadual à equidade territorial).
Porém, não se pode partir da exigência de maior rigor e responsabilidade na gestão dos dinheiros públicos para uma condenação irracional que está a ser feita de todos os municípios e freguesias, de todos os autarcas deste País.
Perdeu-se o sentido de que pela acção de muitos autarcas se contribui para a melhoria de condições de vida das pessoas com quem todos os dias contactam, decidindo junto delas e próximas dos seus problemas. E não, como acontece com os governantes ou os altos dirigentes da administração pública, no recato dos seus gabinetes, longe do confronto com os problemas concretos.
Nesse movimento de condenação primária eu não embarco.
5 comentários:
http://tonibler.blogspot.com/2006/09/o-sistema.html
Caro Ferreira de Almeida
Tem razão.
O problema é que os eleitores são amorfos e pouco críticos. Podemos discutir porque o são e, possivelmente, não saíamos do tema por alguns dias.
A democarcia é, por definição, interactiva, só fazem o que lhes deixam fazer e o que não é denunciado.
Se se denuncia, e nõa existe reacção o que se pode fazer?
De todos os modos, não é um problema privativo de Portugal o mesmo se passa em Itália, por exemplo.
Cumprimentos
Adriano Volframista
Caro Dr. Ferreira de Almeida,
Confesso-lhe que não tenho uma opinião favorável da gestão financeira da generalidade das administrações publicas locais, ao longo dos últimos anos.
Mas há alguns pontos que me parece útil reter neste contexto:
- O primeiro é o facto de essas administrações locais terem embarcado numa política de despesismo descontrolado seguindo o exemplo da administração central, em especial na 2ª metade dos anos 90, com a miragem do Euro;
- Segundo, que estamos hoje perante uma campanha de intoxicação da opinião pública, com o propósito claro de atribuir às administrações locais toda a responsabilidade pelas dificuldades das finanças públicas;
- Terceiro que o "esforço de contenção financeira que se está a ensaiar na administração directa e indirecta do Estado", referiso no seu POST é mais aparente - e fruto de um intenso marketing político - do que real (basta atentar nos últimos dados referentes ao crescimento da despesa corrente primária);
- Tanto quanto me parece, a situação do sector empresarial do Estado será neste momento bem mais grave do que a das administrações locais, mas, curiosamente, sobre esse tema...Silêncio.
O estranho caso da REFER - com uma dívida financeira igual a metade da dívida de todas as autarquias - é paradigmático.
Há certamente muito a corrigir na gestão financeira das administrações locais, que consomem volumosos recursos públicos de forma muito ineficiente.
Mas continua a haver situações de desperdício de recursos tão ou mais graves noutras áreas do Sector Publico Alargado que não são trazidas ao conhecimento da opinião pública. Porquê?
Caro JM Ferreira de Almeida,
Concordo integralmente com a sua análise sobre este estigma que pende sobre as autarquias locais.
Acrescento, que na minha opinião, isto tem algo a ver com o facto da visibilidade e peso político dos Presidentes das Câmaras Municipais portuguesas excederem em muito a importância económica e financeira das autarquias que dirigem. A importância relativa das finanças locais no conjunto das finanças do Estado está clara mente desfasada da dimensão política dos municípios e do conjunto de competências que os mesmos são supostos exercer.
Cumprimentos,
Regionalização
Caro JMFA,
Começa por ser estranho que escreva vários parágrafos dizendo que muito do que fazem os orgãos autárquicos é no sentido de melhorarem a vida dos cidadãos. Realmente, é tudo tão mau que até já pomos a hipótese de que haja coisas feitas por orgãos públicos que não sejam feitas no sentido de melhorar a vida dos cidadãos...:)
Mas a ineficiência que quase todos antes de mim apontam é um dos grandes custos da democracia portuguesa. A centralização do dinheiro, gera a centralização política, condição fundamental para a existência de partidos fortes, como aquele que V. Exas. integram, que franshisam sucursais concelhias para recolherem mais fundos. Sendo autarquias do ponto de vista formal, não o são do ponto de vista financeiro e a consequência óbvia é aquilo que temos hoje que, como disse antes, é estranho o elogio.
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