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sábado, 19 de outubro de 2013

Acabou


Acabou o estado de graça da Dra Joana Marques Vidal, a até agora discreta Procuradora Geral da República. Isto porque, dando execução a deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, ousou dar orientações para que os senhores procuradores que dela hierarquicamente dependem se abstenham de comentar publicamente processos que tenham entre mãos. A reação dos media foi de imediato a que se colhe do título do Jornal de Notícias, apelidando a ordem de serviço de "lei do silêncio". No comentário à notícia numa das TV, um jornalista-comentador amplia o escândalo, e com supina ignorância e o habitual atrevimento que a falta de conhecimento sempre aguça, opina que em matéria de transparência, com esta "lei", Portugal recua anos e distancia-se dos países que têm como regra a publicidade dos processos em investigação.
De pouco valerá à Dra Joana Marques Vidal vir a terreiro explicar que o esclarecimento sobre o andamento de processos (de objetivo interesse público) não afasta o dever de reserva dos magistrados, dever de cujo cumprimento depende por um lado a eficácia da justiça, por outro a defesa de direitos elementares dos cidadãos e, não menos importante, constitui garantia de que a justiça do Estado não é substituída pela justiça feita no pelourinho impedioso dos pasquins. Os assuntos da justiça interessam aos media na medida exata que lhes permita exibir o escândalo, a desonra, a dor, mesmo daqueles que durante a investigação deveriam ver intacto o respeito pelos mais elementares direitos de personalidade, pela sua imagem, pelo seu bom nome, a sua honra e dignidade, pois são inocentes até ao julgado tornado incontroverso. Deste princípio basilar também é feito o Estado de Direito, embora seja por muitos considerado filho de um Deus menor e incómodo, pois embaraça o que faz vender jornais e revistas e atrai a publicidade de que se faz o negócio das televisões.
Vêm aí tempos difíceis, Senhora Procuradora Geral. Os títulos e os gritos histéricos que hoje leu e ouviu são só o começo. Previna-se.

8 comentários:

Floribundus disse...

a escumalha que se intitula jornalista
não passa de fabricante de escândalos
para fornecer à maledicência enquanto esta não pagar imposto

se a Senhora fosse de esquerda tinha apoio imediato

dizia um Brasileiro que esta é a verdadeira 'idade media'

Anónimo disse...

O que eu nunca percebi é porque é que as fugas de informação não são devidamente investigadas e, caso provenham dum magistrado do mp ou judicial, o responsavel não seja punido, no mínimo, com expulsão da carreira.

Sinceramente sempre me fez muita confusão essa coisa em Portugal de que o segredo de justiça é letra morta e os jornais sabem sempre tudo o que querem saber.

Pinho Cardão disse...

Enquanto o PGR não conseguir aplicar a lei, punindo os promotores de fugas ao segredo de justiça, continuará a "bandalheira" a que muitos chamam transparência. E enquanto não for possível punir os media por publicarem matéria vedada por lei, continuarão os julgamentos populares. Acontece que, pelos vistos, o reino da PGR continua a ser dos condes, viscondes e barões e até de algumas marquezas. Sem qualquer respeito pela raínha de Inglaterra, claro está!

Rui Fonseca disse...

"E enquanto não for possível punir os media por publicarem matéria vedada por lei,..."

Discordo, António.

E discordo porque não pode evitar-se a divulgação de uma informação punindo o divulgador, por serem incontáveis, e portanto, incontroláveis, os meios de divulgação.

Mas já concordo inteiramente (e já o anotei em tempos no meu caderno de apontamentos) que o procurador do Ministério Público reponsável por um processo em segredo de justiça deve garantir a inviolabilidade dessa situação.

Ocorendo uma fuga de informação, o procurador deve ser responsabilizado e demitido das suas funções, e da função pública, se a importância do caso o justificar.

É por demais evidente que o ministro Machete foi desatrado na entrevista que concedeu em Luanda. Mas as relações entre POrtugal e Angola encontravam-se já infectadas por fugas de informação oriundas do Ministério Público.

Que se peça a demissão de Machete, concordo.
Que se deixe passar em branco, mais uma vez, o vício de passador do Ministério Público, é sintoma de que a justiça continua em Portugal a brincar à cabra cega.

"Dar orientações" a quem a desorientação é gratificante não chega.
A lei deveria expressamente cometer aos procuradores a responsabilidade de guardiões do segredo de justiça dos processos a seu cargo, estabelecendo as sanções correspondentes ao seu cumprimento.

Ou estão os agentes da justiça acima da lei?

Rui Fonseca disse...


Emenda.

"A lei deveria ... correspondentes ao seu incumprimento."

Anónimo disse...

Meus caros, a minha nota não tinha que ver com o segredo de justiça, nem - creio - foi esse o motivo da orientação dada pela Sra PGR, mas sim o dever de os senhores magistrados guardarem reserva sobre os processos de que estão encarregados. A mesma regra é imposta aos advogados pelo seu estatuto, e já aqui lamentei que estes não tenham tento na língua, a começar pelo sr. Bastonário.

Anónimo disse...

Caro Ferreira de Almeida, parece-lhe que se aqueles que se dedicam a essas patifarias soubessem que sendo descobertos, como mínimo, eram expulsos da carreira ou, no caso dos advogados, inibidos do exercício da profissão, como mínimo. E depois, claro, multas brutais (valores enormes que forçariam os condenados a ter que vender os seus bens e a declarar-se insolventes), indemnizações aos prejudicados e, em casos mais graves, penas de prisão, parece-lhe que sabendo que arriscavam algo deste calibre continuariam alegremente a papaguear tudo o que lhes apetece sem o mais minino respeito pelo dever de reserva e pelo sigilo a que estão obrigados? Quer-me parecer que pensariam duas vezes...

Suzana Toscano disse...

Devia ser uma questão de formação, o facto de ter que ser dada esta orientação é, só por si, um sinal de como tudo está mal e confundir esta orientação com a lei do silêncio também mostra bem como se interpretam hoje as liberdades. Enfim, é assustador.