Fiquei com uma dúvida fundamental
em relação aos esclarecimentos que o vice-primeiro-ministro acaba de prestar
sobre a decisão do governo de cortar nas pensões de
sobrevivência. O governante insiste que se trata de uma "condição de
recursos". Mas em que é que ficamos? São coisas muito diferentes. Nos sistemas contributivos, é do que se trata, os trabalhadores
pagam uma parcela da TSU para cobrir o risco de morte, para que o cônjuge
sobrevivo, filhos e ascendentes, se for o caso, recebam uma pensão. Quando há condição de recursos, a regra é fazer prova de necessidade económica para poder ter acesso às prestações sociais, como acontece por exemplo com o rendimento social de inserção.
Segundo foi esclarecido, a
acumulação de pensões acima de 2.000 euros sofrerá um corte progressivo em
função de uma tabela de escalões definida. Retive que no escalão de 2.000 a
2.250 euros a pensão de sobrevivência será corrigida dos actuais 60%, no caso
da Segurança Social, para 54% e que acima de 4.000 euros será corrigida para
39%.
Os pensionistas afectados pela
medida terão que provar necessidade económica? E o que é que se entende por
necessidade económica? E que prova é essa? Ou o que está em causa é um
recalculo da pensão de sobrevivência de acordo com as percentagens/escalões
anunciados?
Ficámos sem saber o que se vai
passar com as pensões de sobrevivência da Caixa Geral de Aposentações que
representam 50% da pensão de reforma que está na sua origem. Vai haver
convergência com o regime da Segurança Social? Seria correcto fazê-lo, em nome
da convergência dos dois sistemas públicos de pensões.
Na sua intervenção, Paulo Portas apresentou vários argumentos para justificar a medida, entre os quais o défice financeiro existente dos sistemas públicos de pensões na componente da prestação pensão de sobrevivência que ascende a 1.200 milhões de euros, ou seja, representa 44,5% do total da respectiva despesa. Um assunto que vai muito provavelmente cair no esquecimento, mas que dada a sua gravidade deveria ser esclarecido e dele retiradas as devidas consequências.
Na sua intervenção, Paulo Portas apresentou vários argumentos para justificar a medida, entre os quais o défice financeiro existente dos sistemas públicos de pensões na componente da prestação pensão de sobrevivência que ascende a 1.200 milhões de euros, ou seja, representa 44,5% do total da respectiva despesa. Um assunto que vai muito provavelmente cair no esquecimento, mas que dada a sua gravidade deveria ser esclarecido e dele retiradas as devidas consequências.
14 comentários:
Muitas e certeiras perguntas, Margarida, infelizmente os jornalistas presentes estavam muito mais interessados na intrigalhada política e nos estados de alma do vice-primeiro ministro quanto às "fugas" de informação do que em levantar dúvidas pertinentes.
Então vejamos. A Maria tem uma pensão própria de 600€ e do marido ficou com uma pensão de sobrevivência de 2000€, se a esta última se tiram 10% ela fica a receber 600+1800. Mas o Manuel tem uma pensão própria de 2000€ e da mulher ficou com uma pensão de 600€, sendo esta a que vai reduzir-se de 10%, ou seja, fica em 540€. Recebiam os dois a mesma coisa mas agora a Maria vê-se com 2400€ e o Manel com 2540€. Ou seja, para o mesmo rendimento global, quanto maior for a pensão de sobrevivência, maior é o corte. Se isto era para sossegar as viúvas...
Cara MCAguiar
Confesso que tenho dificuldade em conseguir analisar uma medida em que apenas conheço o título e, em certo sentido, o resultado esperado.
É assim como pretender analisar um livro apenas pela capa e pelo ínidice.
Já, no entanto, se pode analisar a solução para um problema que, como muito bem identifica, reside no défice de receita.
Existe um défice de receita que afecta todos os pensionistas o que levaria a supor que, por esse facto, se apresentaria uma solução global. Não é, aparentemente, o que se verifica. Assim sendo, o que se propõem remenda uma ínfima parcela do problema geral.
O que me leva a perguntar como se irá tratar todo o problema.
Em física não escapamos, nem à lei da gravidade, nem à segunda lei da termodinâmica; em economia, também não escapamos à lei, inexoravel, da receita. Cedo ou tarde, esta impor-se-á.
Ainda não percebi se o governo ainda não assimilou o alcançe dessa lei ou se, tendo assimilado, se encontra num exercício, "gradual", de o "ensinar" ao eleitorado português.
Em qualquer dos casos, a aplicação da lei, como a aplicação das duas leis da física que enunciei, tem sempre efeitos dolorosos.
Cumprimentos
joão
"E o que é que se entende por necessidade económica?"
Drª Margarida, a esta pergunta até eu sou capaz de responder: os pressupostos "devem" ser os mesmos que regulam o salário mínimo, que com ele se tem que pagar; renda; energia; água; alimentação e quiçá alguns medicamentos!
Cara Margarida:
1. O valor da pensão de sobrevivência resulta do que se descontou no passado, não do que agora é descontado.
2. Por isso, o argumento de que se verifica actualmente um défice entre os valores recebidos com esse fim, provenientes dos actuais descontos, e os valores pagos aos beneficiários não colhe.
3. Bem sei que o sistema de segurança social não é de capitalização, mas isso não significa que o Estado prescindisse de entregar o que lhe competiria como entidade patronal, o que não fez.
4. Só para dizer que é altamente demagógico invocar argumentos específicos de equilíbrio das contas dos regimes contributivos da Segurança Social para explicar os cortes. Porque a Segurança Social tem encargos extra, por força dos regimes não contributivos, cujas despesas deviam ser afectas ao OE e não à Segurança Social.
5. Eu até admitiria que se dissesse que o OE não comporta tais pagamentos. Seria uma decisão política e o governo definia as prioridades, bem ou mal. Mas o que não pode ser dito é que o Orçamento da Segurança Social não comporta os encargos em causa. Afinal, os "beneficiários" confiaram dinheiro ao Estado, que podiam aplicar noutro tipo de investimento, vendo-se ludibriados nos últimos anos da vida.
5. De facto, o Estado não é pessoa de bem. E, se não se ocupasse de tanta tarefa dispensável, talvez tivesse tempo de se ocupar da sua missão essencial. E a protecção social está contida nessa missão. O que não significa que seja o Estado a gerir directamente os dinheiros que para esse fim lhe são confiados. Outros o fariam bem melhor.
Caro Pinho Cardão
O Estado não é pessoa de bem ou de mal, infelizmente é gerido por políticos que desejam ignorar, a lei da receita como se esta escapasse à férrea lógica da lei da gravidade e da segunda lei da termodinâmica. Como qualquer criança aprende, logo que começa a andar, desafiar a lei da gravidade tem custos muito elevados; mais velho, percebe que, por muito que queira, não escapa à segunda lei da termodinâmica.
Cumprimentos
joão
O sistema público de Segurança Social é solidário e não de capitalização. Essa é que é a variavel relevante.
A verdade é que o que foi descontado não chega para o que agora (anos depois) teria de ser pago. Daí que o compromisso do passado face ao presente é MUITO relativo.
Sendo um sistema solidário passa a ser irrelevante ser contributivo ou não...
Até porque quem decidiu, no passado, que o sistema teria estes contornos (solidario e não capitalizavel) criou uma legislação para...si.
No pressuposto que no futuro (no seu futuro como pensionista) lá estariam os jovens a trabalhar para a sua reforma.
Como acontece com todas as cigarras e com todos os socialistas, enganaram-se no que se refere ao futuro.
Quando o Pinho Cardão escreve que "afinal, os "beneficiários" confiaram dinheiro ao Estado, que podiam aplicar noutro tipo de investimento, vendo-se ludibriados nos últimos anos da vida", está enganado - os descontos eram e são obrigatórios, logo não podiam, nem podem, ser retidos pelos beneficiários. E além disso, serviram para pagar prestações sociais aos beneficiários à época.
A mim parece-me que o que o Gonçalo disse está mais perto da realidade.
Suzana
Não faz sentido. Gostava de perceber qual é o argumento que justifica um tal tratamento. Vai ver que o assunto não fica pelos esclarecimentos de ontem.
Confirma-se a manutenção das diferenças no cálculo da pensão de sobrevivência em ambos os sistemas. Não se avançou na convergência. Umas vezes anuncia-se a convergência para justificar cortes, outras vezes nem se fala nela.
Caro Joao Jardine
A condição de recursos gerou grande preocupação, a par da retroactividade e dimensão dos cortes. Porque não se matou o mal pela raíz? Não é coisa sem importância. E quanto à diferença de tratamento entre pensionistas da Segurança Social e da CGA nem uma palavra quando estão em causa diferenças apreciáveis.
O que é proposto não é se quer um remendo. Se o sistema de Segurança Social não for repensado, de uma forma global e integrada, continuaremos a ter cortes. Mais frustações de expectativas, ainda mais graves, porque para trás fica um rasto de cortes com impactos económicos e sociais gravíssimos . As gerações de pensionistas vão continuar a sofrer e as gerações mais novas estão a ser enganadas.
Faltam as verdadeiras reformas do Estado, entre elas uma reforma da Segurança Social, que já se percebeu que não se vai fazer. Há medida que as pensões foram sendo ceifadas com cortes, a introdução de alterações sistémicas foi ficando de um ponto de vista político cada vez mais longe.
Dr. Pinho Cardão
Os cortes continuam a ser retroactivos. Neste ponto nada se alterou. O caminho que está a ser seguido está, como tive ocasião de escrever em textos anteriores, a fragilizar o sistema de Segurança Social, um pilar fundamental de coesão social e de solidariedade. A sua função de redistribuição de rendimentos não pode ser feita a qualquer preço.
O Estado continua a pagar pensões sociais e complementos sociais dos regimes não contributivos, com os nossos impostos, sem exigir condição de recursos. Uma situação que deveria ser revista. Digo mesmo, é um imperativo fazê-lo.
E o governo deveria mostrar-nos de forma transparente as contas da Segurança Social. Com tantos cortes, como ficam as contas? Como vai ser o futuro?
Cara Fenix
E consegue ver o alcance da sua aplicação à medida anunciada?
Cara Drª Margarida
Como se deve ter apercebido o meu comentário é irónico, apesar da tristeza que sinto em viver num mundo em que, tanto a sobrevivência do trabalhador como a do pensionista (sobrevivente), esteja á mercê dos cálculos dos iluminados que irão determinar qual a quantia suficiente para o efeito!
E, na sua douta opinião, de quem já teve até responsabilidades politicas nesta matéria, que consequências deveriam ser essas, a retirar da existência do défict?
Com certeza que esse défict não apareceu de um dia para o outro, certo?
Será que estes opinadores vivem em Marte?
Qualquer pessoa vê que não há dinheiro para manter um país de reformados, desempregados e R.I.
Isto vai piorar independentemente de governos.
Esta reforma não reforma nada, apenas adia o colapso.
Caro Gonçalo
Põe o dedo na ferida. Já temos falado aqui sobre este assunto. Por isso, peço desculpa, por me repetir. A demografia e a economia alteraram-se. Quando olhamos para os anos 60 e 70, os anos do "bay-boom" e dos crescimentos económicos de dois dígitos, percebemos as diferenças em relação às últimas décadas. Com a agravante de que no caso de Portugal nada fizemos para acarinhar a natalidade, que está em declínio perigosíssimo, e quanto à economia sabemos bem que o que se passou.
Estes fenómenos estão há muito diagnosticados, mas nada fizemos para alterar o modelo de arquitectura e financiamento da segurança social. O Estado nunca adequou o seu papel às novas realidades, com algumas medidas ainda assim positivas que ficaram pelo caminho, por exemplo os PPR. Mas o Estado encarregou-se de tributar as pensões privadas feitas com o esforço financeiros dos trabalhadores como se de despesa pública se tratasse.
Caro Tiro ao Alvo
Os actuais pensionistas confiaram que o Estado lhes iria garantir que as pensões que financiaram quando era trabalhadores através das suas contribuições lhes seriam garantidas. O Estado não cumpriu com o contrato de confiança.
Há milhares de pensionistas que não percebem porque é que o Estado gastou “indevidamente” as suas contribuições que deveria, aliás, estar num cofre a aguardar a sua vez.
O Estado não foi capaz de administrar o sistema, temos agora uma herança de um sistema de pensões que está em grandes dificuldades, pondo em causa a equidade e solidariedade geracionais.
Caro Carlos
As dificuldades acumulam-se há muitos anos. Por razões ideológicas e políticas não fomos capazes de fazer as reformas necessárias, o Estado não adequou o seu papel e o das pessoas e empresas. Há uma ”filosofia de vida para a reforma” que terá que ser alterada.
Pedia-lhe a sua paciência para ler este texto “Mudanças de paradigmas…”, de entre outros, que há uns tempos escrevi aqui no Quarta República: http://quartarepublica.blogspot.pt/2013/03/mudancas-de-paradigma.html. Obrigada.
Caro opjj
Como diz, o que há é uma “reforma” orçamental, vão-se tapando buracos para cumprir metas. Não há uma plano.
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